Quinta-feira,Maio 15, 2025
9 C
Castelo Branco

- Publicidade -

28 de Abril: Uma Data em Curto-Circuito

Aconteceu no dia em que a Ibéria mergulhou na penumbra. Não, não falo do eclipse solar de 1912, que desconcertou até Saramago — que ainda não o tinha escrito —, mas do *apagão estratégico* de 2025, fenómeno tão previsível quanto a próxima crise ministerial. É grave, caro leitor. Grave como um tratado de teologia escrito por um ateu. Mas antes de desvendarmos esta sinfonia de incompetências, permita-me recordar-lhe: 28 de Abril já estava ocupado. Não por acaso, mas por *sobrecarga histórica*.

Em 1986, nessa mesma data, a Suécia detectou níveis de radiação capazes de fazer um *smörgåsbord* brilhar no escuro. A URSS, ébria de secretismo, admitiu Chernobyl só quando os satélites ocidentais já exibiam o reactor 4 como atração turística cósmica. Dois séculos antes, em 1789, o HMS Bounty viajava de motim em motim: os amotinados, fartos do capitão Bligh — cuja tirania só perdia para o *customer service* das operadoras de hoje —, decidiram que o paraíso tahitiano valia mais que a disciplina naval. Resultado? Uma colónia de descendentes em Pitcairn e uma lição não aprendida: fugir para uma ilha deserta é a única solução para a burocracia moderna.

Eis o cerne: 28 de Abril é um caderno de reclamações cósmico. Por que insistimos em sobrecarregá-lo com *novos desastres*? Será a nostalgia? A falta de criatividade? Ou o vício ibérico de repetir tragédias como se fossem receitas de bacalhau? (Perdão, prometi evitar clichés. Risque-se o bacalhau. Ficamos com *receitas de desgoverno*.)

Ora, se há data saturada, por que não redistribuir os cataclismos? Proponho um *calendário de catástrofes* racional, como sugeriu Erasmo de Rotterdam no *Elogio da Insensatez* — obra, aliás, que inspirou o último plano energético europeu. Para 2026, reservemos o próximo apagão a 12 de Outubro, dia em que Colombo tropeçou nas Américas. Poético, não? Um continente descobre-se às escuras. Para 2027, escolhamos 30 de Fevereiro — data inexistente, tal como a estratégia da UE para evitar colapsos na rede.

Ah, mas aqui reside o paradoxo: os governos ibéricos, mestres na arte de *não aprender*, preferem a tradição. Cortam luzes como Luís XIV cortava fitas em Versalhes — com pompa, ignorância e a convicção de que os súbditos aplaudirão. Espanha culpa Portugal pelo excesso de *saudade* na rede; Portugal acusa Espanha de exportar *tapas* energéticas; Bruxelas, entretida a debater o sexo dos anjos regulatórios, sugere que acendamos velas. Ecos de 1789? Não. É pior: pelo menos Bligh tinha um mapa. Talvez o grande desastre do 28 de Abril tenha sido o dia em que nasceu António de Oliveira Salazar. Mas este provocou um apagão de 48 anos. Qualidade, senhores, qualidade.

E o cidadão? Esse Ulisses moderno, amarrado ao mastro do consumo, ouvindo o canto das sereias do *Black Friday* enquanto a factura da luz o devora como Cronos a seus filhos. Resta-lhe a ironia fina: chorar para não incendiar a EDP.

Termino com uma interrogação alquímica: será esta crónica um exercício de sátira ou um relatório disfarçado? Lembre-se, leitor, de Giordano Bruno, queimado por sugerir que o universo era infinito. Hoje, bastaria propor um *universo sem taxas de potência*. A resposta, como o planeamento energético, fica na penumbra.

- Publicidade -

Não perca esta e outras novidades! Subscreva a nossa newsletter e receba as notícias mais importantes da semana, nacionais e internacionais, diretamente no seu email. Fique sempre informado!

Partilhe nas redes sociais:
Joao Vasco Almeida
Joao Vasco Almeida
Jornalista 2554, autor de obras de ficção e humor, radialista, compositor, ‘blogger’,' vlogger' e produtor. Agricultor devido às sobreirinhas.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Destaques

- Publicidade -

Artigos do autor

Não está autorizado a replicar o conteúdo deste site.