Durou pouco mais de uma hora, o início do debate instrutório do processo BES/GES que deveria ter arrancado hoje no Tribunal de Monsanto, tendo sido adiado para 2 de maio. Na origem deste adiamento esteve a falta de notificação de três arguidos para comparecerem no tribunal de Monsanto.
Juiz, procuradores e dezenas de advogados, apresentaram-se esta manhã, no Tribunal de Monsanto, em Lisboa, para o início do debate instrutório do processo sobre o colapso do Banco Espírito Santo, mas, por falta de notificação de três dos arguidos, o debate foi adiado para os dias 2, 3, 4 e 5 de maio. Esperando-se que, desta vez, sejam cumpridas todas as formalidades processuais.
A decisão do juiz de instrução Pedro Santos Correia foi tomada na sequência de uma interrupção da diligência, depois de um debate entre os advogados e o Ministério Público (MP) por causa de uma posição do MP que apenas juntou hoje ao processo e pela falta de notificação de alguns arguidos, tendo esta questão sido a única a ser apontada pelo magistrado para o anúncio do adiamento.
Esta decisão do juiz Pedro Santos Correia surgiu depois de os advogados de defesa terem referido o facto de existirem três arguidos que não foram notificados para a sessão. O advogado Tiago Rodrigues Bastos colocou ainda outra questão em cima da mesa: os dois arguidos que residem na Suíça, Etienne Cadosch e Michel Creton, e a sociedade Eurofin, e que este advogado representa, não foram notificados para o debate instrutório. “Uns arguidos são tratados de uma forma e outros de outra. Independentemente disso, a notificação tem de ser feita ao arguido”, referiu.
Além das notificações dos dois arguidos, que se encontram na Suíça, os advogados defenderam que precisam de conhecer o conteúdo da resposta do MP sobre as nulidades apresentadas ao juiz Pedro Santos Correia, que as remeteu posteriormente ao Ministério Público, e defenderam que, legalmente, têm dez dias para o fazer.
Durante pouco mais de meia hora, os advogados apresentaram esta questão ao tribunal logo no início da sessão e, depois de uma pausa de também cerca de meia hora, chegou a decisão: adiamento do debate instrutório para o início de maio pela falta de notificação dos dois arguidos que residem na Suíça.
Considerado um dos maiores processos da história da justiça portuguesa, envolvendo políticos banqueiros e nomes sonantes da vida económica portuguesa e africanas, o processo BES/GES, cujo principal arguido é Ricardo Salgado, antigo presidente do Grupo Espírito Santo (GES), conta com 26 arguidos — 22 pessoas e quatro empresas.
Este caso agrega no processo principal 242 inquéritos, que foram sendo apensados, e queixas de mais de 300 pessoas, singulares e coletivas, residentes em Portugal e no estrangeiro.
Segundo o Ministério Público (MP), cuja acusação contabilizou cerca de quatro mil páginas, a derrocada do Grupo Espírito Santo (GES), em 2014, terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.
O debate instrutório do processo BES/GES era suposto arrancar hoje, no tribunal de Monsanto, cerca de um ano após o início da fase de instrução e quase três anos depois de ser conhecida a acusação do Ministério Público (MP).
No dia 14 de julho de 2020, a investigação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) traduziu-se na acusação a 25 arguidos (18 pessoas e sete empresas), entre os quais o antigo presidente do Grupo Espírito Santo (GES), Ricardo Salgado. Foram imputados 65 crimes ao ex-banqueiro, nomeadamente associação criminosa, corrupção ativa, falsificação de documento, burla qualificada, branqueamento, infidelidade e manipulação de mercado.
Primeira sessão em abril de 2022
A primeira sessão para ouvir testemunhas no âmbito da instrução ocorreu dois anos depois, a 26 de abril de 2022, no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), na sequência de dois adiamentos devido a problemas de saúde do juiz Ivo Rosa, e contava já com 29 arguidos (23 pessoas e seis empresas).
Agora, estão em causa 26 arguidos (22 pessoas e quatro empresas), sobre os quais MP e defesas vão fazer as suas alegações para uma eventual ida a julgamento.
O início do debate instrutório está agendado, agora, para 2, 3, 4 e 5 de Maio no Tribunal de Monsanto, devido ao “número de sujeitos processuais e a logística associada”.
Um ano de diligências
Durante quase um ano de diligências, o processo passou também pela substituição do juiz de instrução, com Pedro Correia a assumir em setembro passado a presidência desta fase processual, então nas mãos de Ivo Rosa, que, no dia da primeira sessão, já tinha rejeitado conceder caráter urgente à instrução, apesar do risco de prescrição de crimes a partir de agosto de 2024. No entanto, em janeiro, o Tribunal da Relação de Lisboa revogou esta decisão e deu caráter urgente à instrução.
O anterior juiz, que já tinha conduzido a fase de instrução do mediático processo “Operação Marquês”, que tem como principal arguido o antigo Primeiro-ministro José Sócrates, tinha concorrido aos Tribunais da Relação e foi promovido no quadro do anterior movimento de magistrados. Ivo Rosa acabou, assim, por deixar de deter a vaga de juiz 2 do TCIC, mas viu a promoção suspensa em virtude de um processo disciplinar (ao qual se somou, entretanto, outro) no Conselho Superior da Magistratura (CSM).
A troca de juiz, efetuada já depois de o CSM ter definido em junho de 2022 um prazo de oito meses para a conclusão da instrução do caso BES/GES, suscitou polémica entre alguns dos arguidos, que contestaram a legalidade da substituição através de uma providência cautelar. O Supremo Tribunal de Justiça acabou por rejeitar liminarmente a ação.
Ao longo do último ano passaram pela instrução do processo diversas testemunhas, como o ex-primeiro-ministro Passos Coelho, o antigo governador do Banco de Portugal Carlos Costa ou o ex-presidente do Banco Espírito Santo Investimento (BESI), José Maria Ricciardi.