A actualidade política idanhense tem sido dominada nos últimos dias pela sentença que confirmou o pagamento da indemnização milionária devida pelo Município de Idanha-a-Nova à artista plástica Cristina Rodrigues, num montante aproximado à indemnização atribuída à gestora da TAP Alexandra Reis, que fez rolar cabeças e tremer o último governo de António Costa.
Porém, é igualmente recente um episódio que, apesar de não ter feito correr tanta tinta nos jornais, é igualmente milionário, é igualmente chocante, é igualmente triste e, claro está, mais uma vez traz Idanha para a ribalta, pelos piores motivos.
Refiro-me à aquisição por parte do Município de Idanha-a-Nova de um antigo barracão, com décadas de uso, localizado na pequena aldeia de Penha Garcia, pelo preço de 375 mil euros.
Mas se a compra, por parte da autarquia, de um imóvel com estas características causa em qualquer espírito lúcido a maior estranheza, o que é digno de verdadeira perplexidade é não tanto o rocambolesco processo decisório subjacente à aquisição, mas, sobretudo, o comunicado efectuado pela Concelhia do Partido Socialista de Idanha-a-Nova, a propósito do assunto.
É que o referido comunicado configura um verdadeiro caso de estudo sobre a indesejável promiscuidade que pode existir entre os partidos políticos e os órgãos das autarquias locais.
Em bom rigor, tal comunicado é o exemplo acabado da promiscuidade que existe entre o Partido Socialista de Idanha-a-Nova e os órgãos do Município, como é o caso do Presidente da Câmara e do seu executivo.
Isto porque ao invés de ser o Sr. Presidente do Município a vir a público justificar esta aquisição polémica, desde logo porque a mesma roça as fronteiras de um flagrante conflito de interesses, visto o antigo proprietário do imóvel ser familiar da esposa do Sr. Presidente, é a Comissão Política que vem defender e justificar a necessidade desta aquisição. E de tal forma tudo isto é estranho, que a Comissão Política se dá ao trabalho de descrever o barracão minuciosamente, chegando ao pormenor de informar que o mesmo tem duas casas de banho, pasme-se, revestidas com azulejo cerâmico até um metro! Além de todas estas bizarrias, que se não fosse este um assunto tão sério dariam vontade de rir, a Comissão Política revela ainda pormenores sobre a futura utilização do barracão e sobre o próprio negócio que, à partida, por uma questão de confidencialidade institucional deveriam estar apenas na posse das partes envolvidas.
Ora, considerando que a Comissão Política do Partido Socialista de Idanha-a-Nova detém toda a informação, todos os detalhes, e todos os pormenores sobre o negócio, a mesma informação só lhe pode ter chegado por uma de duas vias. Ou pelo antigo proprietário, isto é, pelo familiar, por afinidade, do Sr. Presidente da Câmara, que coloca ao serviço do negócio o próprio Partido Socialista. Ou, por outro lado, pelo próprio Presidente da Câmara Municipal, que é também presidente da Comissão Política do Partido Socialista de Idanha-a-Nova, o que põe em evidência a indesejável promiscuidade que tal gesto patenteia.
Recordo que não há muito tempo, num julgamento mediático, um juiz de direito advertiu o Sr. Presidente da Câmara de Idanha-a-Nova, num juízo de censura ética, (estando em causa uma acusação por peculato, do qual este foi absolvido in dubio pro reo), que, de futuro, deveria evitar colocar-se em situações em que se suscitasse algum tipo de dúvida, quanto à natureza da sua intervenção.
Armindo Jacinto parece ter feito pouco caso das recomendações do magistrado, ao comprometer a autarquia na aquisição de um bem relativamente ao qual está envolvido o nome de um familiar da sua esposa.
Talvez Armindo Jacinto saiba pouco de ética republicana, mas não deveria ignorar que à mulher de César não basta ser séria: ela tem de parecer séria. E no meio de tanta promiscuidade, resta pouco espaço para a desejada seriedade da res publica.
Seja como for, uma coisa parece evidente: algo não está bem na Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, e talvez tenha chegado a hora de alguém por a casa em ordem.
Hugo Rêgo
Deputado Municipal à Assembleia Municipal de Idanha-a-Nova