O sociólogo Boaventura Sousa Santos foi acusado em 2023 de assédio sexual a, pelo menos, três investigadoras do Centro de Estudos Sociais, na Universidade de Coimbra. O inquérito interno concluiu-se ontem, mas o sociólogo, segundo fontes do processo, não tem qualquer acusação directa conta ele, apenas há acusações nomeadas contra pessoas da equipa que o professor universitário coordenava. O caso está entre o espanto, a surpresa e a suspeita.
Boaventura Sousa Santos não é um cidadão qualquer. É um dos mais reconhecidos sociólogos portugueses com uma obra notável e uma honestidade intelectual reconhecida pelos seus pares. Foi fundador do Centro de Estudos Sociais, na Universidade de Coimbra, um inovador e muito necessário instituto em Portugal, que costuma mastigar as ciências sociais (sociologia, antropologia, psicossociologia, etc.) e deitar fora, tipo pastilha.
Mais ainda: Boaventura Sousa Santos foi o proeminente cofundador, com Dutra, do Fórum Social Mundial, uma resposta dos humanistas ao Fórum Económico Mundial, onde os senhores do dinheiro se juntavam – e juntam -, para decidir sobre os dinheiros, sem pensar nas pessoas. Em toda a sua obra e intervenção pública defendeu valores de igualdade, solidariedade, defesa dos mais desfavorecidos e outras linhas de pensamento que levam sempre ao bem-estar humano. Dutra, que comandava os destinos da capitalista Curitiba (BR), conseguiu avanços sociais enormes.
Mas…
“Enfrentou sérias acusações em 2023 relacionadas a abusos de poder, assédio moral e sexual. Essas denúncias vieram à tona num artigo publicado pela revista brasileira Revista Crítica de Ciências Sociais. O artigo, intitulado “O Sistema de Exceção: Práticas Acadêmicas e Violências de Gênero”, foi assinado por três investigadoras que alegaram terem sido vítimas ou testemunhas de condutas inadequadas em contextos acadêmicos”, relatam os jornais.
Se Boaventura fez ou não aquilo de que é acusado, será com a disciplina interna da Universidade e com os tribunais – onde aliás já apresentou queixa cível contra as denunciantes, para poder provar que nada do que é acusado é verdadeiro.
Se fez, deve ser condenado por isso. Não restem dúvidas. O trabalho intelectual de excelência, produzido pelo CES sob a sua batuta é relevantíssimo, mas nada disso se pode misturar com alegados comportamentos trogloditas.
Só que…
Há muito que em Portugal há uma guerra na área da Sociologia/Antropologia entre duas facções. De um lado Boaventura, do outro Maria Filomena Mónica e António Barreto, estes últimos casados. São a face mais à esquerda (o CES) e de centro-esquerda (Filomena Mónica e Barreto). Nos jornais, nas revistas científicas, nas colunas sociais, há muito que o trio se digladiava com argumentos espúrios. Se Boaventura tinha o CES, Barreto conseguiu montar o Pordata, site essencial para a compreensão de Portugal – além de ter escrito e produzido uma série documental para televisão de aplaudir de pé: “Portugal, um retrato social”.
A guerra do trio levava a coisas tão comezinhas como Boaventura acusar Barreto se “vender” a todos e mais alguns – inclusive dichotes malvados em 2012, quando Barreito protagonizou uma campanha publicitária do supermercado Pingo Doce.
Os mentideiros das ciências sociais em Portugal são de aldeia malsã. Há poucas pessoas, poucos investigadores, pouca produção de trabalho. E, por isso, quando estas coisas se dão, são sempre alarmantes. Não queremos “poucos” e, ainda por cima “maus”. Se um atira piropos às cachopas, outro lidera o 10 de Junho a convite de Cavaco – que quem disse sempre o pior.
Será tempo de a sociologia e antropologia, entre outras ciências sociais, saírem do lupanar e das questiúnculas domésticas para assumirem um papel essencial e muito importante num país como o nosso.
Não posso concluir, porque o andor está torto e a procissão nem gente suficiente tem para o carregar…