Afinal todos sabiam dos assédios sexuais no CES pelo professor ‘Estrela”, Boaventura Sousa Santos. Ou quase todos. Com as denúncias a aumentar desde terça-feira passada, dia 11 de abril, quando o caso veio a público, a direcção do Centro de Estudos Sociais e a presidência do Conselho Científico da Universidade de Coimbra tomaram a decisão inevitável.
Esta sexta-feira, o CES anunciou que o director emérito, Boaventura de Sousa Santos, e o investigador Bruno Sena Martins, denunciados de assédio e abuso sexual por antigas alunas, “estão suspensos de todos os cargos” enquanto durar a investigação de uma comissão independente.
O escândalo rebentou com um artigo assinado por Lieselotte Viaene, Catarina Laranjeiro e Miye Nadya, três investigadoras que passaram pelo CES. As antigas alunas e autoras do texto publicado numa revista científica estrangeira não identificam a instituição nem os nomes dos visados, mas foi o suficiente para a comunidade universitária do CES se libertar do silêncio imposto. Fotografias de 2018 das paredes do CES com frases pintadas a dizer “Fora Boaventura. Todas sabemos” reapareceram a público.
O professor também se sentiu visado no artigo, mas negou tudo o que as ex-alunas denunciam. Ameaçou mesmo com processo judicial. O investigador Bruno Sena Martins, também denunciado, nega igualmente qualquer comportamento de assédio sexual ou moral.
No artigo das antigas alunas, há referências a uma terceira pessoa, a Watchwoman, que ainda não foi descodificada. O “Professor Estrela” seria a peça-chave das “dinâmicas de poder” da instituição, juntamente com outras duas figuras: o “Aprendiz” e a “Watchwoman”, escrevem Viaene, Catarina Laranjeiro e Miye Nadya.
Outras vítimas aparecem e falam
Na quarta-feira, aparece nas redes sociais um vídeo já com algum tempo, onde a argentina Moira Millán denuncia o sociólogo de agressão sexual após uma palestra que deu numa aula de pós-graduação na Universidade de Coimbra em 2010 a convite de Boaventura.
Segundo Moira, o sociólogo levou-a a jantar e depois a casa dele para preparar a palestra. “Atirou-se para cima de mim no sofá”, “tentou beijar-me”, “pôs-me as mãos em cima”, afirma Moira, afirmando que não teve qualquer contacto físico consensual com Boaventura para que ele tivesse agido assim, como agressor sexual.
A pouco e pouco, os alunos e docentes do CES, atuais e antigos, começaram a soltar a voz, mas ainda de cara tapada por temerem retaliações. Os testemunhos, partilhados uns com os outros ao longo dos anos, começam a ganhar crédito e consistência. Os sussurros ou queixas que foram feitas ao longo dos últimos anos tornaram-se finalmente reais.
O escândalo faz cancelar eventos da agenda e aparições públicas de Boaventura de Sousa Santos. Algumas ex-alunas começam a falar de cara destapada e, além do assédio sexual, as denúncias vão também ao assédio moral, cumplicidades e coação para que não façam queixas, sob ameaça de terem as carreiras universitárias comprometidas.
Perante o avolumar de denúncias, a direção do CES não teve alternativa senão suspender Boaventura e Bruno Sena, até a comissão independente ter conclusões da investigação que irá realizar. Mas, ainda sem sequer ter constituído a equipa, no mesmo comunicado que suspende os docentes, a direção do CES assume “repúdio por qualquer forma de assédio “ e manifesta “solidariedade com todas as vítimas”.