Sou eu. Pedro Nuno Santos. Aquele. O da TAP, dos comboios, dos anúncios à pressa e das saídas dramáticas. Já agora, estes sapatos? São confortáveis, mas caminhar com eles em direção ao cargo de primeiro-ministro está a revelar-se mais escorregadio do que pensava
Sim, fui ministro das Infraestruturas. E sim, tive tempo, meios e dossiers inteiros com soluções para o país. Mas a verdade é que ser ministro em Portugal é como jogar Tetris com peças quadradas num ecrã inclinado. Quando se acerta numa, a outra já caiu. Fala-se muito da TAP, das indemnizações, dos milhões… mas quem nunca quis salvar uma companhia aérea gastando o equivalente ao PIB da Covilhã que atire o primeiro recibo verde.
Eu bem tentei resolver os problemas da habitação. Mas entre planos, powerpoints e grupos de trabalho, a única coisa que consegui levantar foi… suspeitas. E quando finalmente ia fazer alguma coisa, caiu o governo. Coincidência? Talvez. Culpa minha? Claro que não. Foi o sistema, os astros, o Mercúrio retrógrado e talvez também um certo cansaço de António Costa — que, diga-se, se ausentava tantas vezes que eu achei natural substituí-lo. Achei, sinceramente, que estava só a adiantar serviço.
Agora, dizem que não tenho estaleca para primeiro-ministro. Que sou demasiado impulsivo. Que falo demais, cedo demais, com ar de quem já decidiu tudo antes de ouvir alguém. Bom, é verdade. Mas digam lá se isso não é refrescante! Um político que decide antes de pensar: pelo menos poupa tempo!
Tenho feito oposição? Tenho. Discreta, claro. Não vá eu destabilizar a esquerda inteira com a minha presença magnética. O país precisa de serenidade — e se há coisa que aprendi depois da TAP, é que às vezes o melhor é estar calado (ou pelo menos parecer que estou).
Olho para os meus adversários e penso: “Talvez ainda tenha uma hipótese.” Luís Montenegro é sensato, calmo, quase invisível. É como um quadro branco: dá para escrever qualquer coisa por cima, mas ninguém pára para o admirar. Ventura? Ah, o Ventura… É o político que entra de megafone num funeral: há quem o aplauda pela coragem, mas quase todos saem com dor de cabeça. Ele até levanta temas importantes — imigração, segurança — mas fá-lo com o mesmo subtileza de um touro numa loja de porcelanas.
E depois temos a esquerda clássica, essa máquina de fotocópias ideológicas, a repetir-se desde 1974. A cassete está tão gasta que já só se ouve um zumbido. A Iniciativa Liberal tenta ser o adulto da sala, mas parece mais o assistente do adulto. Rui Rocha fala bonito, mas tem menos carisma que um tutorial de Excel.
Portanto, aqui estou eu, nos meus sapatos, a andar com passo firme (e às vezes em falso) em direção às legislativas de 2025. Dizem que não sou o ideal para liderar o país. Mas digam-me: já alguém liderou isto idealmente? Portugal não precisa de santos. Precisa de alguém que saiba jogar o jogo — e eu, ao menos, já fui expulso uma vez. Sei o que custa. E estou pronto para voltar ao campo.
Agora, se me dão licença, tenho que ensaiar o meu próximo discurso. Um que diga tudo, sem dizer nada — como manda o manual do político moderno. Com um toque de drama, claro. Porque os meus sapatos, caros leitores, têm memória… e ainda cheiram a bastidores.