Os hospitais Beatriz Ângelo, em Loures, e o Garcia da Horta, em Almada, são os dois mais mal-afamados da Área Metropolitana de Lisboa, com tempos de espera para doentes urgentes a ultrapassar, em horas, os recomendados pelo SNS, mas, em contrapartida, são os únicos que dispõem de heliportos autorizados a operar.
Apenas os heliportos dos hospitais Beatriz Ângelo, concelho de Loures, e Garcia de Orta concelho de Almada, dos quase 40 existentes no país, estão autorizados a operar, revelou a presidente da Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), Tânia Cardoso Simões, ouvida na Comissão de Saúde da Assembleia da República, após um requerimento do grupo parlamentar do PSD sobre o heliporto do Hospital de Lamego.
A generalidade dos heliportos dos hospitais precisa de intervenções urgentes, mas em alguns bastará fazer coisas simples como cortar a copa das árvores, arranjar pisos que se foram degradando, transformações em parques de estacionamento, postes de eletricidade nos sítios errados ou a construções feitas onde não se devia ter construído.
Já em 2020, o Governo de António Costa anunciava que ia avançar com um plano para acabar com os vários casos de heliportos de hospitais, para situações de emergência médica, sem certificação do regulador da aviação ou mesmo sem condições para serem usados.
O anúncio foi pelo então Secretário de Estado Adjunto e das Comunicações depois de ter sido conhecido que os helicópteros de emergência estavam proibidos de aterrar em hospitais por incumprimento de vários requisitos técnicos, entre outros a falta de sinalização luminosa que ajude na aterragem.
Mas, como “as palavras leva-as o vento”, a promessa ainda está por cumprir.
Doentes chegam mais rápido à bicha para consultas
Todavia, segundo fontes hospitalares, a rapidez e a eficácia do transporte dos doentes urgentes por helicóptero «despenha-se» quando o evacuado por via aérea chega ao hospital e fica a aguardar, horas a fio, para ser atendido.
Nos casos dos doentes com pulseira amarela (urgentes), o tempo de espera recomendado para o primeiro atendimento não deve demorar mais de 60 minutos, e no caso da pulseira verde a recomendação é que não vá além dos 120 minutos (duas horas).
De acordo com os dados do portal do SNS, doentes com pulseira amarela (urgente) estão no serviço de urgência geral dos Hospitais Beatriz Ângelo e Garcia da Horta tendo um tempo médio de espera superior às 10 horas.
Por isso, para algumas fontes contactadas pelo ORegiões, este problema dos heliportos é secundário, o importante é reduzir os tempos de espera. Na perspetiva das nossas fontes, esta situação faz lembrar a história do automobilista, que «ultrapassa os limites de velocidade para chegar mais rápido à bicha de trânsito, parada há duas horas».
Contudo, apesar deste ser um dos problemas principais dos nossos hospitais, a presidente da ANAC teve que ir à comissão parlamentar explicar que, segundo um diploma de 2010, os heliportos utilizados para operações de emergência médica, de combate a incêndios ou outros fins de proteção civil necessitam de uma autorização do regulador, lembrando que a ANAC fez um ofício circular a alertar os conselhos de administração dos hospitais para a falta de autorização para o uso daquelas infraestruturas.
A agência Lusa contabilizou 41 heliportos: três certificados ao serviço do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) e da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) e 37 são exclusivamente hospitalares, sendo que, destes, dois têm autorização. Há ainda um terceiro autorizado, no Aeródromo Municipal de Pombal, em Casalinho, utilizado não apenas para fins hospitalares.
Dos restantes 35, oito já tiveram autorização e caducaram, 18 nunca tiveram autorização, mas estão publicados no manual VFR dos comandantes de aviação, quatro são novos e têm processos em andamento e cinco estão sem condições para operar.
Destes cinco, três foram encerrados pela ANAC e os restantes dois nunca efetuaram pedido de autorização.
Relativamente aos três heliportos que não se situam em hospitais, mas são usados pelo INEM, e que por isso carecem de “certificação”, situam-se em Macedo de Cavaleiros (distrito de Bragança), Baltar, concelho de Paredes (distrito do Porto) e em Loulé (distrito de Faro).
Tânia Cardoso Simões diz “compreender” que as administrações hospitalares tenham “outras prioridades” para além dos heliportos e, por isso, “a própria ANAC está a entrar em contacto com os hospitais no sentido de os alertar” para estas situações.
Aeroportos prioritários
“No ano passado, pela primeira vez, antes do início da época, estavam certificadas todas as bases para o dispositivo de combate aos incêndios, num trabalho conjunto com a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil”, assumiu.
Entretanto, a ANAC reuniu-se com o presidente do INEM para “serem sinalizados os heliportos que são prioritários”. Apesar de reconhecer que são todos prioritários, a responsável diz não ser possível dinamizar todos ao mesmo tempo, “por uma questão de recursos humanos”.
Neste sentido, a presidente da ANAC adiantou que “autorizados estão o Beatriz Ângelo, em Loures, o Garcia da Orta, em Almada, e o Casalinho, em Pombal (Leiria)”. Este último não é exclusivo para operações médicas, situando-se num aeródromo municipal.
Autorizações caducadas
Com autorização caducada, prosseguiu Tânia Cardoso Simões, estão as infraestruturas do Hospital de Vila Real, do Hospital de Cascais, do Hospital de Bragança, do Hospital Espírito Santo, em Évora, do Hospital do Espírito Santo, em Ponta Delgada [Açores], do Hospital da Guarda, do Hospital de Braga e do Hospital de Vila Franca de Xira.
Destes, a presidente da ANAC esclareceu que “Vila Real não pediu nova autorização e já foi alertado que tem de o fazer” e na mesma situação estão “Bragança, Évora e Ponta Delgada”.
“Cascais tem não conformidades abertas para retificação. São questões de segurança, embora possam ser procedimentais”, especificou.
No que diz respeito à Guarda, o heliporto “não reúne condições, embora já tenha sido apresentado um pedido de autorização”. No entanto, acrescentou, existe “um novo projeto em desenvolvimento este ano”.
“Em tratamento” estão os casos de Braga e Vila Franca de Xira, assegurou.
Dos heliportos sem autorização e publicados em manual, ou seja, já estiveram a operar, fazem parte do manual VFR dos comandantes, mas nunca tiveram autorização ao abrigo da legislação de 2010, estão 18 hospitais.
“Alguns apresentaram já pedidos, na sequência do ofício, mas os processos estão mais atrasados [que o de Lamego, que está na fase final], mas em termos semelhantes nesta instrução processual de autorização”, justificou.
São eles: “Abrantes, Tomar, Torres Novas, Pero de Covilhã, (Santo André) Leiria, (Santa Luzia) Viana do Castelo, Mirandela, Portimão, (Padre Américo) Penafiel, (Pedro Hispano) Matosinhos, (São Teotónio) Viseu, Faro e Santa Maria da Feira”.
“Não apresentaram se quer pedidos Coimbra (Hospitais Universitários), Santa Cruz (Carnaxide), Covões em Coimbra e Covões no Funchal (Madeira)”, acrescentou a responsável, que também incluiu nesta lista o Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
Um caso especial
“Santa Maria é uma situação um bocadinho especial, porque tem algumas limitações na infraestrutura para efeitos de certificação, mas está um projeto em curso que se espera que rapidamente se culmine”, disse.
Em Portugal há 33 unidades hospitalares com infraestruturas para poderem receber helicópteros de emergência médica, mas dez delas estão impedidas de receber voos de emergência noturnos, do INEM ou da Força Aérea, por não responderem aos requisitos necessários. Um desses hospitais é o de Santa Maria, em Lisboa — que usa os hospitais militares locais para poder receber os pacientes que chegam por helicóptero.
Tânia Cardoso Simões enumerou também os “heliportos novos, alguns dos quais em obra quase terminada”, como os de Lamego, Santiago do Cacém e São João.
Sobre o Hospital Santos Silva, em Trás-os-Montes e Alto Douro, o heliporto está “em regularização, relativamente a alguns problemas de construção”.
“Heliportos sem autorização: o Hospital Pediátrico de Coimbra e o Hospital de Amarante, que não apresentaram qualquer pedido de autorização sequer, e Guimarães, Santarém e São Francisco Xavier”, concluiu.
Relativamente a estes cinco, fonte da ANAC esclareceu à agência Lusa que nunca abriram os heliportos do Hospital Pediátrico de Coimbra e de Amarante, tendo sido “encerrados pela ANAC os de Guimarães, Santarém e São Francisco Xavier”.