Foi com a solenidade de quem vai assistir à coroação de um polvo que me sentei diante do ecrã para ver o debate entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro. Prometia ser um momento elevado de confronto ideológico, ou pelo menos uma troca decente de frases subordinadas. Enganei-me. Assistimos, sim, ao mais sofisticado teatrinho de jardim de infância desde que o Canal Panda transmitiu “A Abelha Maia” com legendas em esperanto.
O palco estava montado. Duas cadeiras, um moderador — Hugo Gilberto, que parecia tão crescido que a meio do debate temi que se levantasse, desse dois berros à beira de um colapso cartesiano e assumisse o governo do país com base na sua colecção de Mandrake, o Mágico e livros de Asimov. Seria compreensível. Afinal, entre um a dizer que tem soluções e outro a dizer que também tem (mas num PowerPoint que ficou em casa), a única certeza foi a do suor de Montenegro a tentar escapar-lhe do rosto como as ideias fugiam da boca de Pedro Nuno.
Mas não nos adiantemos.
O momento mais esclarecedor do debate foi a sua total falta de esclarecimento. Segundo fontes que inventei há instantes, o número de indecisos aumentou 40% após o confronto — fenómeno político raro, só comparável à lenda de Abderramão III e os seus 14 dias de felicidade em 50 anos de reinado. Houve promessas, houve insinuações, houve aquele ar sério de quem sabe que está a dizer nada, mas com muita firmeza.
Os moderadores? Palmas para eles. Sobretudo para Hugo, que quase resgatava a dignidade do espectáculo com um gesto: levantar-se, suspender o recreio, e anunciar que, por motivos de decência e asseio retórico, iria ocupar o centro do palco e explicar como se governa um país sem precisar de insultar a inteligência alheia. Justificaria com a frase: “Eu leio banda desenhada e ficção científica. Não leio a Nova Gente nem compro o JL para parecer interessado.”
Claro que houve quem dissesse que Pedro Nuno venceu. Outros juram que Montenegro arrasou. No fundo, ambos perderam. Perderam para o vácuo, para o ruído, para o enredo de um episódio perdido de “Espelho Meu” escrito por um estagiário disléxico.
Nos próximos debates, sugiro que Montenegro leve um lenço. Não para o suor — mas para acenar quando se perder na sua própria névoa argumentativa. E que Pedro Nuno leve o pai.
Não como trunfo — mas como bússola moral. Pode ser que, ouvindo um adulto, finalmente diga algo que não pareça saído de um manual de gestão motivacional da década de noventa.
Ou então não. Talvez tudo isto tenha sido apenas uma sátira. Ou uma crónica de política séria. Mas se não perceberam bem — parabéns. Estão perfeitamente preparados para votar.