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Democracia com Pão, Queijo e Presunto: Uma Aula de Turismo Político à Portuguesa

Ah, a democracia! Essa instituição tão nobre, que em certos cantos do mundo é discutida nos parlamentos e nas praças públicas, mas que em terras lusas, na Sertã, se saboreia ao ar livre, entre fatias de queijo e copos de vinho tinto. Porque aqui, meu amigo, a política não é só arte de bem governar: é um encontro entre o passado, o petisco e uma pitada de sátira.

O dia começara formal, com conferências sérias sobre participação cívica e o papel do cidadão no século XXI. Mas na Sertã, estas conversas são mais um aperitivo para o prato principal: uma visita guiada a monumentos e uma aula prática de “democracia autárquica com degustação”. Foi ao estilo descontraído que o presidente da Câmara, Carlos Miranda, lançou o convite aos palestrantes visitantes: “Vamos ali espairecer e fazer horas para o jantar!” E assim, com o autarca à frente e um autocarro atrás, deu-se início à mais peculiar das lições de educação cívica.

Paragem 1: Casa-Ateliê de Túlio Victorino – Arte, com bolos, sumo e café.

Primeiro ponto do roteiro: a casa-ateliê do pintor Túlio Victorino, um edifício revivalista neo-árabe, com torres e janelas que mais pareciam saídas de um conto das Mil e Uma Noites. Com o entusiasmo de quem quer impressionar, Carlos Miranda trocou a gravata pela pose de professor a profissão antes do autarca, que não esquece e fez questão de dar uma lição completa sobre a vida e obra do pintor. Os visitantes, de livro debaixo do braço e copo de sumo e chávena de café na mão, iam ouvindo – ou fingindo ouvir – entre um gole de e uma mordidela num bolinho ou numa fatia de presunto. O resultado? Uma “tertúlia” de história da arte regada a queijos e enchidos e doçaria, que para muitos foi mais instrutiva do que qualquer debate político.

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Foto: D.R.

Paragem 2: Seminário das Missões – Quando a Fé se Mistura com o Vinho

Com o espírito (e o estômago) já reconfortados, o grupo seguiu para o segundo ponto da visita: o Real Colégio das Missões Ultramarinas. Antiga instituição destinada a formar missionários, o Seminário de Cernache do Bonjardim é um símbolo histórico, carregado de episódios, reformas e uma biblioteca recheada de livros raros. Mas, mais importante ainda, é uma verdadeira máquina do tempo, com fornos a lenha, adegas cheias e, claro, uma produção de vinho local que atrai mais fiéis do que a própria missa.

Na cozinha centenária, o grupo descobriu que a democracia, afinal, também tem aroma a pão fresco e a vinho maduro. Entre azulejos coloniais e quadros barrocos, cada canto do seminário era um convite a imaginar a época dos missionários e dos tempos coloniais, enquanto se provava o “Terras de D. Nuno”, vinho da casa. Um dos ilustres visitantes, o médico Álvaro Beleza a chá, aproveitou a deixa para uma reflexão sobre os Filipes e o “nosso” embate histórico com os “nuestros hermanos”. Entre piadas sobre os espanhóis e ironias sobre a diplomacia, o tema oficial – a democracia – tornou-se um eco longínquo, perdido no prazer do paladar e na descontracção da tertúlia.

Foto: D.R.

 

O Apoteótico Regresso – Foto de Família e Presunto para a Posteridade

Após este périplo por entre mesas fartas e discursos improvisados, o grupo regressou ao ponto de partida, onde os esperava Luís Marques Mendes para uma palestra final sobre política atual. Mas sejamos sinceros: depois de horas a discutir a democracia com pão e queijo e bolos, quem queria mais sermões? A verdadeira aula já tinha sido dada, com sorrisos e copos levantados, e o presidente da Câmara teve ainda a presença de espírito de organizar uma foto de grupo na saida do edíficio do seminário, imortalizando a sessão num retrato que certamente será pendurado na Câmara. Afinal, nada diz “participação cívica” como um copo de vinho e uma fatia de presunto em boa companhia.

Em conclusão, o dia ficou marcado pela certeza de que, em terras no interior, não há tema sério que não ganhe leveza e sabor com um bom petisco. Na Sertã, a política autárquica vai para além dos discursos e dos votos: é um convite para celebrar a história e a cultura com um brinde, onde a democracia não se limita ao direito de opinar, mas se estende ao direito de provar – de preferência, mais uma fatia de presunto.

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Fernando Jesus Pires
Fernando Jesus Pireshttps://oregioes.pt/fotojornalista-fernando-pires-jesus/
Jornalista há 35 anos, trabalhou como enviado especial em Macau, República Popular da China, Tailândia, Taiwan, Hong Kong, Coréia do Sul e Paralelo 38, Espanha, Andorra, França, Marrocos, Argélia, Sahara e Mauritânia.

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