Há exatamente dez anos, a detenção do antigo primeiro-ministro José Sócrates, no aeroporto de Lisboa, abalava o país e colocava a luta contra a corrupção no centro do debate político e social em Portugal. Dez anos após esse dia histórico, o processo da Operação Marquês continua por julgar, marcado por uma série interminável de recursos, adiamentos e contestações judiciais que têm protelado indefinidamente a realização de um julgamento.
A Operação Marquês, que se iniciou em novembro de 2014 com a prisão preventiva de José Sócrates, resultou numa extensa investigação por suspeitas de corrupção, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal qualificada. A acusação formal, que só foi apresentada em outubro de 2017, envolveu 28 arguidos e um total de 189 crimes, incluindo figuras proeminentes do mundo político e financeiro como o amigo pessoal de Sócrates, Carlos Santos Silva, o ex-banqueiro Ricardo Salgado e o antigo presidente da PT, Zeinal Bava.
Desde a apresentação da acusação, o processo foi alvo de intensas disputas legais. José Sócrates, desde cedo, tentou afastar o juiz de instrução Carlos Alexandre do caso, e a defesa recorreu sucessivamente a diferentes mecanismos processuais para contestar a validade das acusações e das decisões instrutórias. Em abril de 2021, o juiz Ivo Rosa anunciou uma decisão instrutória que reduziu significativamente o número de crimes que iriam a julgamento, deixando cair todos os crimes de corrupção e pronunciando José Sócrates apenas por três crimes de branqueamento de capitais e três crimes de falsificação.
Esta decisão instrutória foi posteriormente desafiada em dois recursos pelo Ministério Público, que pretendia recuperar a acusação original. Em janeiro de 2024, a Relação de Lisboa deu razão ao recurso do Ministério Público, restabelecendo quase toda a acusação inicial da Operação Marquês. Contudo, em abril do mesmo ano, o tribunal de segunda instância considerou nula a decisão instrutória de Ivo Rosa, obrigando o processo a regressar ao tribunal de instrução criminal para reanálise.
Enquanto isso, em processos autónomos retirados do caso principal da Operação Marquês, algumas condenações já foram proferidas. Armando Vara, por exemplo, foi condenado a dois anos de prisão por branqueamento de capitais, embora já estivesse a cumprir uma pena de cinco anos por corrupção em outro processo. Por outro lado, Ricardo Salgado foi condenado a seis anos de prisão em primeira instância por abuso de confiança, com a pena agravada posteriormente para oito anos pelo Tribunal da Relação de Lisboa. No entanto, a execução da pena de Salgado permanece pendente devido à necessidade de uma perícia para avaliar a gravidade de uma condição de Alzheimer.
A incerteza sobre a data de julgamento e a morosidade no processo da Operação Marquês levantam questões sobre a eficácia do sistema judicial português na luta contra a corrupção e a necessidade de garantir a celeridade nos processos judiciais envolvendo figuras políticas de destaque. A ausência de um desfecho definitivo ao longo de uma década revela fragilidades e desafios contínuos no combate à corrupção e na responsabilização dos alegados culpados.