A vida deste executivo de Montenegro, já apelidado de “Power Point”, não se adivinha nada fácil, mesmo dentro do próprio PSD. Para o núcleo duro do PSD, o primeiro-ministro tudo fará para não dar uma imagem de fragilidade com uma remodelação. Para outros, esta é a altura ideal para Montenegro “arregaçar as mangas” e deixar a teoria da cabala de conspiração e mudar, no mínimo, os ministros mais polémicos, nomeadamente a ministra da saúde.
São muitas as vozes sociais-democratas que pedem a Montenegro, que se vê a braços com crises nos ministérios, para remodelar o Governo. Na Saúde, uma greve no INEM, mais de uma dezenas de mortes por falta de assistência e uma ministra que demorou semana e meia a reagir e no MAI uma ministra que promete e é obrigada a voltar atrás, são os argumentos mais que suficientes para que Montenegro proceda a alterações no Governo.
Alguns dirigentes e destacadas figuras sociais-democratas mostram reservas e até incômodo com a situação criada, ainda que ninguém esteja disponível para assumir publicamente. O clima não está para críticas, nem sequer para visões e estratégias alternativas, defendem. Contudo, acreditam que o primeiro-ministro tudo fará para manter a sua equipa intacta, pelo menos, até às autárquicas. Mesmo com alguns governantes, como as ministras da Saúde e a da Administração Interna debaixo de fogo.
Aliás, nos últimos tempos sucederam os pedidos de demissão de Margarida Blasco, que chegou a fazer algumas declarações que geraram polémica, e de Ana Paula Martins, por causa das falhas no atendimento de doentes no INEM, o que poderá estar relacionado com várias mortes, e de outras questões.
“Deixar cair agora um ministro ou uma ministra seria criar uma bola de neve. Por isso, Luís Montenegro vai querer manter a equipa unida. Caso contrário pode começar a haver uma erosão da Opinião Pública”, refere o politólogo José Filipe Pinto”.
Para o especialista, o primeiro-ministro vai evitar a todo o custo mexer, pelo menos, no imediato, nos seus governantes. “Luís Montenegro pode vir a fazer um ou outro ajuste, mas não vai remodelar os principais”, acrescenta.
Todavia, para o líder do governo é importante manter Ana Paula Martins. “A Saúde foi uma área fundamental durante toda a campanha. Retirar a sua principal responsável seria admitir que tudo tinha falhado neste setor prioritário”, salientam algumas fontes.
Pedro Duarte pode levar a remodelação
No entanto, mesmo no interior do executivo existem “várias vozes” que defendem que Luís Montenegro deve mexer no Governo, aproveitando a saída do ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte do Executivo, para se candidatar à Câmara do Porto, que terá de ocorrer entre o fim de março e o fim do mês de abril, para remodelar.
Nessa altura, o primeiro-ministro vai ter que fazer uma avaliação do Governo. Ou aproveita a saída do seu ministro dos Assuntos Parlamentares para refrescar o Governo e resolver problemas latentes, ou será muito mais complicado fazê-lo em momento posterior.
Ana Paula Martins, Margarida Blasco e Dalila Rodrigues são os três nomes apontados como os mais frágeis do Executivo. Montenegro tem querido segurar as ministras nos diversos casos em que se têm envolvido, mas o desgaste natural do Governo e o facto de duas delas ocuparem pastas pesadas e cruciais para o Governo, pode levar o chefe do Executivo a precipitar as mudanças.
Além dos pedidos de demissão, vindos de todos os partidos da oposição, a verdade é que também no interior do Governo se começam a levantar dúvidas sobre as condições que alguns ministros têm para se manterem no cargo.
No interior do Executivo há quem considere que a posição de Ana Paula Martins depende agora da apresentação de resultados visíveis, que tardam em chegar. Todos reconhecem que a tarefa não é fácil, e muito menos depende de uma mudança de titular da pasta. Mas o que é facto é que à dificuldade da tarefa, a atual ministra junta uma gestão confrontacional com as várias estruturas da Saúde, ao mesmo tempo que as nomeações que tem vindo a fazer não lhe têm corrido bem. Tudo somado, são cada vez mais os que acham muito difícil a manutenção por muito mais tempo no Governo da titular da pasta da Saúde.
Balanço de um ano de governo
No momento em que fizer a remodelação, maior ou mais pequena, o Governo estará a cumprir um ano em funções, a tomada de posse ocorreu a 2 de abril de 2024. É uma data redonda que leva sempre a fazer balanços e análises sobre as metas cumpridas do Governo.
As contas que se vão fazer à obra feita preocupam o líder do Governo da AD, que, há um ano, quando iniciou funções, pôs um grande enfoque na solução dos problemas da Saúde e da Segurança. Apesar das gafes da ministra da Administração Interna, a verdade é que em matéria de segurança as coisas não têm estado a correr mal para a agenda do Governo. Os protestos das forças de segurança acalmaram e a maior atenção dada ao tema por parte do Governo tem tido alguns resultados.
Apesar de ser uma decisão difícil, Ana Paula Martins é vista como o elo mais fraco do Governo neste momento. Os próximos dias prometem não aliviar a tensão sobre a ministra da Saúde, já que o caso das mortes provocadas pelas falhas do INEM vai continuar a dar que falar, não só com a sequência do relatório, como porque se espera um outro, especificamente sobre o nexo de causalidade entre as mortes registadas nos dias das greves de outubro e novembro de 2024 e as falhas do INEM.
Nos últimos tempos, Montenegro tem-se esforçado por valorizar o trabalho da ministra da Saúde, inclusivamente em reuniões internas do partido, onde Ana Paula Martins é apresentada como uma das ministras fortes do Executivo. O problema é que na hora do balanço, a ministra soma mais problemas do que soluções.
Com menos peso no Governo, a ministra da Cultura é indicada como remodelável. Em causa estará a relação difícil com muitos agentes do meio mas não só. Ao longo deste ano em funções, Dalila Rodrigues colocou também alguma areia na engrenagem no interior do próprio Executivo.
Com pouco espírito colaborativo e muitas decisões consideradas intempestivas, o ambiente azedou quando, sem dar conhecimento a ninguém, a ministra decidiu inverter a mudança de gabinete que tinha sido determinada pelo núcleo duro do Governo. O ministério da Cultura, que funcionava no Palácio da Ajuda, recebeu instruções para mudar de instalações no início do ano.
Na data prevista, o gabinete de Dalila Rodrigues mudou-se para o Campus XXI, edifício sede do Governo, onde já estavam instalados muitos outros Ministérios. O problema é que a ministra não chegou a aquecer o lugar no Campo Pequeno. Desagradada com as condições do novo gabinete, Dalila Rodrigues deu ordens à equipa para regressar ao Palácio da Ajuda, onde já não havia computadores nem outros equipamentos indispensáveis ao trabalho.
O episódio insólito agravou o mal estar interno no Executivo e Leitão Amaro, o ministro da Presidência responsável pela logística impôs à equipa da cultura que regressasse à base. Foi uma história que deixou marcas e que terá ditado a decisão de substituir a ministra assim que houver oportunidade.
Mais candidatos a sair do governo
Sendo as eleições autárquicas o principal motivo para a remodelação, as saídas para candidaturas autárquicas podem não se ficar por Pedro Duarte, garante o jornal Nascer do SOL. A acontecer, os escolhidos não serão outros ministros, mas sim, secretários de Estado.
Tudo somado, pode transformar-se mesmo numa remodelação de fundo, não só para corrigir erros, mas também para preparar o Governo para uma nova fase, em que tem de enfrentar eleições autárquicas e presidenciais, momentos cruciais para se começar a perceber quanto mais tempo de vida tem o Governo.
A nova fase começa com a aprovação, ou não, do Orçamento para 2026 que acontecerá imediatamente após as eleições autárquicas. Socialistas e Chega olham para os resultados das eleições locais como um marco fundamental para avaliar a capacidade do Governo da AD seguir em frente e do resultado destas eleições dependerá uma decisão final sobre o que fazer: deixar passar mais um Orçamento ou chumbá-lo.