A crescente influência de Elon Musk na presidência norte-americana está a levantar sérias preocupações sobre a fragilidade da democracia nos Estados Unidos. Analistas alertam para os perigos de uma oligarquia moderna à semelhança da Rússia, onde a concentração de poder nas mãos de multimilionários pode ameaçar as bases institucionais
O presidente eleito Donald Trump nomeou o magnata da tecnologia para coliderar o programa D.O.G.E. (Departamento de Eficiência Governativa), que visa propor cortes nos gastos públicos. No entanto, a proximidade de Musk à administração federal e os volumosos contratos e subsídios das suas empresas, como Tesla e SpaceX, estão a suscitar alertas sobre conflitos de interesse e falta de transparência.
“Um Conluio Total” Entre Governo e Interesses Corporativos
Para Daniela Melo, professora da Universidade de Boston, a entrada de Musk na administração de Trump representa um caso “inédito” de concentração de poder corporativo no coração do governo. “Temos realmente aqui um oligarca, que conseguiu instalar-se numa posição de poder sem ocupar um cargo direto, sem desinvestir das suas empresas e sem mecanismos de transparência”, afirmou a analista em entrevista à Lusa.
As investigações em curso do Departamento de Justiça sobre a Tesla e o Starlink, uma rede de satélites essencial para a defesa ucraniana, são outro ponto sensível. Segundo Melo, há um “conluio total” entre os interesses privados de Musk e o governo, o que pode enfraquecer ainda mais a democracia americana.
“Se Musk conseguir fazer o que promete e o que Trump aparentemente está a oferecer, será difícil perceber onde começam os interesses empresariais e onde termina o Estado”, alertou.
Relação com a Ucrânia Levanta Suspeitas
A presença de Musk na primeira reunião de Trump com o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, também foi criticada. “É inédito. Musk, enquanto cidadão privado, controla um sistema vital para a capacidade bélica da Ucrânia. Só podemos imaginar o tipo de pressão que Trump quis exercer sobre os ucranianos ao trazer Musk para a mesa”, disse Melo.
Choque de Personalidades Entre Musk e Trump?
Thomas Holyoke, professor da Universidade Estadual da Califórnia em Fresno, sugeriu que a personalidade dominante de Musk poderá gerar tensões com Trump. “Quase parece que Elon Musk quer ser ele a conduzir o carro, em vez de Donald Trump”, afirmou. “Só há uma pessoa no comando, e Musk pode não aceitar uma posição diminuída. Ele pode querer muito mais do que isso”.
Holyoke frisou ainda que Musk já tem estado a fazer lóbi publicamente para influenciar as escolhas da administração, indicando um esforço proativo para moldar o governo antes mesmo da tomada de posse oficial.
Um Modelo de Poder Sem Precedentes
O programa D.O.G.E., criado por Trump, pode ter sido concebido precisamente para contornar as regras federais que obrigariam Musk a desinvestir das suas empresas caso assumisse um cargo formal. Este acrónimo – que também remete para Dogecoin, uma criptomoeda promovida por Musk – simboliza a relação simbiótica e controversa entre o magnata e a nova administração.
“Estamos a assistir a uma mudança profunda na forma como o poder é distribuído nos Estados Unidos. Elon Musk, com este cargo informal mas influente, terá um poder tremendo para moldar políticas e decisões”, concluiu Daniela Melo.
A Democracia Americana à Prova
A fragilidade das instituições democráticas será, segundo analistas, o verdadeiro teste desta nova era. Resta saber se o Congresso e outras estruturas de equilíbrio de poder conseguirão conter a influência crescente de Musk e preservar os alicerces da democracia americana.
