O Governo de Israel condenou com dureza a decisão de Espanha de anular unilateralmente um contrato de compra de armamento, no valor de 6,6 milhões de euros, com a empresa israelita IMI Systems. O acordo previa a aquisição de 15,3 milhões de balas destinadas à Guarda Civil espanhola
A decisão, anunciada pelo executivo espanhol esta quinta-feira, provocou de imediato uma resposta firme do Ministério dos Negócios Estrangeiros israelita, que, através de um porta-voz, classificou o gesto como uma “violação grave” de um contrato legalmente vinculativo e um ataque à relação bilateral entre os dois países. Israel sublinhou que rejeita categoricamente a intenção de Madrid em suspender futuros acordos de defesa com empresas israelitas.
Este cancelamento surge no seguimento de uma crescente tensão dentro da coligação governamental espanhola, composta pelo Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e a plataforma de esquerda Somar. O caso provocou o que membros do próprio Governo descreveram como a “maior crise” da atual legislatura.
Fontes oficiais do executivo espanhol afirmaram à agência Lusa que a decisão partiu diretamente do primeiro-ministro Pedro Sánchez e da vice-presidente Yolanda Díaz. Ambos consideraram que o contrato não podia manter-se, atendendo ao compromisso assumido pela coligação com a causa palestiniana e à política de embargo à venda e compra de armamento com Israel, em vigor desde 7 de outubro de 2023.
A polémica estalou quando se soube que, apesar do embargo anunciado no ano anterior, o Ministério da Administração Interna autorizara o avanço do contrato com a empresa israelita. A revelação motivou reações indignadas dentro do Governo, sobretudo por parte da Esquerda Unida (IU), uma das forças integrantes do Somar.
O líder da IU, Antonio Maíllo, declarou não aceitar que fundos públicos financiem o que descreveu como “um Estado genocida”. Por seu lado, Enrique Santiago, líder parlamentar da IU, defendeu a demissão dos ministros da Defesa e da Administração Interna, apontando falhas graves na execução da política externa e de defesa do país.
O Ministério da Administração Interna justificou a adjudicação com base num parecer jurídico da Advocacia Geral do Estado, que alertara para os custos jurídicos e financeiros associados à anulação do contrato numa fase avançada de execução.
Yolanda Díaz, vice-presidente e uma das figuras mais influentes do Somar, exigiu explicações ao ministro Fernando Grande-Marlaska e classificou o episódio como uma violação dos acordos políticos estabelecidos na coligação.
Apesar da tensão, não foram oficialmente confirmadas demissões nem a saída de ministros do Somar, embora a hipótese de uma remodelação governamental não esteja afastada.
Este episódio reflete as crescentes divergências internas da coligação progressista espanhola quanto à política externa, em especial sobre o posicionamento face ao conflito entre Israel e Palestina, num contexto em que já foram contabilizadas mais de 50 mil mortes em Gaza desde outubro de 2023.