Na década de 1990, casais jovens equipavam as primeiras casas com frigoríficos ou máquinas de lavar roupa vendidos a preços reduzidos por terem «pequenos defeitos» — uma mancha na pintura, um botão desalinhado ou um rótulo mal colado. Três décadas depois, esta alternativa económica mantém-se, embora com novos canais: além do tradicional «passa-palavra», surgiram plataformas online e lojas de fábrica que comercializam estes produtos, agora procurados também por famílias com menos recursos e jovens em casas partilhadas.
Uma investigação OREGIÕES realizada junto de fabricantes, retalhistas e associações de consumidores confirma que marcas como Bosch, Siemens e Whirlpool continuam a direccionar electrodomésticos com falhas estéticas para canais específicos. Em Portugal, estes produtos são vendidos através de:
1. Lojas de Fábrica: Espaços físicos como a Worten Outlet (grupo Sonae) e a Electro outlet da MediaMarkt disponibilizam artigos com pequenos defeitos, garantindo a mesma funcionalidade e garantia. Localizam-se maioritariamente em zonas industriais (ex: Loures, Maia).
2. Sites de Segunda Escolha: Plataformas como ReTeka (especializada em produtos recondicionados) e secções de «outlet» em sites da Rádio Popular ou El Corte Inglés oferecem descontos até 60 por cento.
3. Mercado Informal: Grupos no Facebook («Electrodomésticos em Portugal»), o OLX e o CustoJusto concentram anúncios de particulares e pequenos revendedores.
Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam que 43 por cento dos jovens até aos 34 anos vivem em casas arrendadas, muitas vezes partilhadas. «Prefiro pagar 300 euros por um frigorífico novo com um risco na lateral do que 800 euros por um impecável», afirma Marta Silva, 28 anos, residente em Braga.
A durabilidade destes electrodomésticos — muitos ultrapassam duas décadas de uso — justifica a procura. «São os mesmos componentes dos produtos de primeira linha, apenas rejeitados por detalhes visuais», explica João Ribeiro, que foi gestor de uma loja de fábrica da Siemens na Margem Sul, Lisboa.
Se antigamente estas vendas dependiam do boca-a-boca, hoje a digitalização democratizou o acesso. A Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor (DECO) alerta, porém, para riscos: «Recomendamos verificar se o defeito é realmente só cosmético e confirmar a garantia», sublinha fonte institucional.
Já as marcas adoptam estratégias ambíguas: evitam publicitar estes canais para não afectar a imagem premium, mas aproveitam-nos para escoar stock. «É um mercado paralelo, mas essencial para evitar desperdício», admite um funcionário da Bosch sob anonimato.
Além dos produtos com pequenos defeitos, especialistas sugerem:
● Comércio de Segunda Mão: Feiras de electrodomésticos usados (ex: Feira da Vandoma, Porto) e sites como Wallapop.
● Recondicionados Garantidos: Empresas como a Remarq (Lisboa) reparam equipamentos com avarias técnicas e vendem com garantia de dois anos.
● Aluguer de Longa Duração: Serviços como o Casivo permitem alugar electrodomésticos por meses ou anos.
Dicas para Poupar Mais: Truques de Especialistas
1. Negociar em Lojas Físicas Funcionários de retalhistas confirmam ser possível obter descontos adicionais em produtos expostos ou com defeitos menores, principalmente no final do mês, quando as equipas comerciais tentam cumprir metas. «Basta perguntar ao gerente se há margem para baixar o preço», revela uma colaboradora da MediaMarkt.
2. Aproveitar Períodos de Saldos Grandes superfícies como a Worten e a Rádio Popular fazem liquidações em Janeiro e Julho, com descontos até 50 por cento em modelos descontinuados. A Black Friday (24 de Novembro) também é uma oportunidade, mas exige comparação de preços históricos mediante extensões de navegador como o Keepa.
3. Programas de Fidelização Cartões de cliente (ex: Continente Card) acumulam pontos convertíveis em descontos em electrodomésticos. Jovens entre 18 e 25 anos têm ainda acesso a promoções exclusivas via plataformas como o Estudante VIP.
4. Cashback e Cupões Online Sites como KuantoKusta comparam preços e incluem links para cupões de desconto (ex: 10 por cento na primeira compra na Amazon.es). Aplicações de cashback (ex: Swisslife) devolvem até cinco por cento do valor gasto em lojas parceiras.
5. Comprar em Conjunto Grupos de amigos ou vizinhos podem adquirir electrodomésticos a granel directamente de importadores, poupando até 30 por cento. A DECO recomenda contratos escritos para evitar conflitos.
6. Atenção à Eficiência Energética Aparelhos com classe A+++ custam mais, mas reduzem a factura da luz. O programa PAEEC (Plano de Acção para a Eficiência Energética) do Governo português oferece incentivos até 250 euros para substituição de equipamentos antigos.
7. Reparar em Vez de Substituir O movimento Right to Repair ganha força: sites como iFixit oferecem manuais grátis para reparar pequenas avarias. Em Lisboa, oficinas como a ElectroLab realizam workshops mensais para aprender a substituir peças.
8. Monitorizar Mercados Locais Feiras municipais (ex: Mercado de Benfica, Lisboa) vendem electrodomésticos usados testados por técnicos. Algumas juntas de freguesia, como a de Matosinhos, organizam bazares sociais com preços simbólicos.
Com a crise habitacional e a inflação, analistas preveem que este mercado cresça 15 por cento até 2025. A tendência de consumo sustentável pode ainda levar mais marcas a criar canais oficiais para produtos «imperfeitos», seguindo exemplos como o da IKEA, que desde 2022 vende móveis com defeitos em secções dedicadas.
Nota de Redacção: Foram contactadas as marcas mencionadas, a DECO e o INE para validação de dados. Nenhuma das empresas contestou as informações. A omissão de marcas, regra básica do jornalismo, seria impossível neste texto que se deve considerar de divulgação e não de reportagem. No entanto, O Regiões não teve nenhuma contrapartida financeira ou outra sobre este artigo.
