A qualidade de um governo não se mede pela qualidade profissional ou características pessoais dos ministros, mas pelas políticas que irão executar. Na perspectiva de um analista ou eleitor de esquerda, se o seu programa for de direita, mesmo aplicando bem essas ideias, não será necessariamente um bom governo. O mesmo se aplica para quem acredita que governar à direita trará a melhoria das condições económicas e sociais da população: não seria a competência duma governação dita progressista que levaria aquelas forças a considerar um governo como “bom”
Daí a dificuldade em acreditar que governos de tecnocratas, supostamente sem ideologia definida, mas “meros” especialistas nas matérias de que serão executantes, possam receber “cheque em branco” quanto às suas decisões económicas, sociais, culturais, etc. Mas esse nem é o caso deste governo PSD, com um elemento CDS.
A direita ganhou as eleições, AD, IL e Chega têm maioria absoluta. A vitória de Montenegro foi curta e esta fragilidade obriga a governar, direta ou indiretamente, com o Chega, até porque não existem grandes diferenças ideológicas entre estes partidos. Pontualmente (?), o Primeiro Ministro contará com a ajuda do PS.
A esquerda está em minoria, e os diversos partidos (PS, PCP, BE, Livre, PAN) são suficientemente diferentes entre si para não ser fácil tomar posições comuns anti-direita. Lembre-se que várias medidas económicas da AD irão utilizar as contas certas e os excedentes deixadas pelo PS, que preferiu a obediência às exigências da UE, em vez da concretização de legitimas reivindicações.
Assim, não é um “tiro no escuro” que alguns partidos de esquerda desde já declarem que irão votar contra este programa de governo, na generalidade, o que não impede que possam votar a favor de algumas decisões.
O perfil dos ministros até poderá cumprir com o que Montenegro (colaborador de Passos Coelho na aplicação das imposições da Troika) espera, pois são personagens da sua área e confiança. Por outro lado, independentemente do programa de governo, o perfil direitista da generalidade dos ministros anuncia as políticas que irão ser aplicadas. Serão antecipadamente aprovadas por conservadores e neoliberais, até porque vários deles exerceram cargos governamentais quando Passos Coelho foi primeiro ministro. Vejamos, a mero título de exemplo:
Ministro da Defesa, Nuno Melo, militarista convicto, alinhará com as diretivas belicistas da EU e Nato.
Pedro Reis, o novo Ministro da Economia, agraciado por Cavaco, considera que quanto menos estado, melhor.
Paulo Rangel, Ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros, não denunciará a perda de soberania que a integração na UE obriga.
É conhecida a opção da Ministra da Saúde, Ana Paula Martins, pelas parcerias publico-privadas.
O Ministro das Infraestruturas e Habitação, Miguel Pinto Luz, poderá vir a vender a companhia aérea TAP pela segunda vez, depois do desastre da venda à Atlantic Gateway.
E assim por diante…
Todavia, confesso existir uma ministra, Margarida Blasco, da Administração Interna, de quem espero alguma oposição às movimentações mais extremistas dos sindicatos de polícia.
O “prazo de validade” deste governo dependerá de como conseguir equilibrar as exigências do Chega com a pontual (?) colaboração do PS.