O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, lançou um alerta importante sobre o que considera serem “números enganadores” a respeito da capacidade de Portugal em reter os seus licenciados e jovens qualificados. No seu discurso de abertura na conferência do Banco de Portugal dedicada à educação e às qualificações, em Lisboa, Centeno sublinhou que o país deve enfrentar mitos persistentes sobre a emigração jovem e o défice de talento. “Por vezes, vivemos focados numa realidade que é descrita com números enganadores”, afirmou, ressaltando a importância de dados rigorosos para fundamentar políticas económicas eficazes.
Segundo o governador, os dados de que dispomos mostram uma realidade distinta daquela que é muitas vezes retratada: nos últimos oito anos, o número de portugueses com formação superior na população ativa tem crescido em média 70 mil pessoas por ano. Contrariando a ideia de fuga de talentos, as universidades portuguesas formam anualmente cerca de 50 mil novos licenciados, o que significa que Portugal está a captar mais talentos do que aqueles que saem. Assim, concluiu, o país é “um recetor líquido de diplomados com ensino superior”.
Centeno reforçou esta posição ao referir dados do Eurostat, que indicam que a percentagem de jovens portugueses a emigrar é, na verdade, inferior à de países como a Alemanha, a Dinamarca ou os Países Baixos. Esta é uma realidade que o governador tem sublinhado de forma consistente, defendendo que a narrativa sobre a emigração jovem deve ser vista com cautela para evitar interpretações incorretas.
A “Revolução Silenciosa” da Educação em Portugal
Centeno qualificou o progresso que Portugal tem feito na educação como uma “revolução silenciosa”. Para o economista, o país enfrenta agora o desafio de continuar a combater um legado de atraso no setor, advindo de um regime que, nas suas palavras, “reduziu o país à ignorância”. Contudo, advertiu, esta revolução educacional está longe de ser uma vitória assegurada. “É uma revolução contínua, que exigirá pelo menos mais 20 anos para que o país possa recuperar totalmente do atraso acumulado,” destacou.
Entre as prioridades que Centeno identificou para o futuro está o reforço do ensino pré-escolar e a recuperação das aprendizagens perdidas durante a pandemia de COVID-19, particularmente entre os jovens. A interrupção do ensino presencial teve impactos graves que podem repercutir-se na capacidade futura dos jovens competirem no mercado de trabalho, alertou. Se o atraso não for corrigido, o impacto sobre o desenvolvimento pessoal e profissional dos estudantes será profundo e de longa duração.
Educação como Pilar de uma Sociedade Preparada para o Futuro
Para Centeno, a educação é o maior investimento que Portugal pode fazer na construção de uma sociedade mais coesa e resiliente. “A educação é, sem dúvida, o maior investimento que podemos fazer para construir Portugal como sociedade mais forte, mais unida e melhor preparada para os desafios do futuro,” declarou o governador. Ele reiterou que para garantir o futuro das novas gerações e da democracia, Portugal deve garantir estabilidade a vários níveis: “desde logo a financeira, mas também a económica e a institucional”.
Ao longo da intervenção, Centeno reforçou a importância de dados fiáveis e da análise económica precisa na formulação de políticas públicas. No ano passado, Centeno já havia sublinhado as implicações negativas de interpretações erradas sobre as estatísticas de emigração e emprego. Alertava então para um erro estatístico sobre o número de licenciados na população ativa que estava a propagar uma visão incorreta, fazendo com que muitos portugueses “acabassem no divã do psicanalista”.
Hoje, na conferência do Banco de Portugal, Centeno destacou uma vez mais a necessidade de perspetivas informadas e precisas, essenciais para guiar as políticas económicas e educacionais do país. Segundo ele, só com uma abordagem assente em factos e não em perceções distorcidas será possível assegurar um futuro promissor para Portugal e as novas gerações.