“Negligente, irresponsável e incompetente”. Estes foram os três adjetivos que o líder do PS, Pedro Nuno Santos, escolheu esta tarde para qualificar a conduta do Governo na crise do INEM, da ministra da Saúde, mas sobretudo do primeiro-ministro, Luís Montenegro que, disse, desvalorizou as graves falhas no atendimento do INEM. O secretário-geral dos socialistas disse “o problema não é apenas da ministra da Saúde”, é já o “problema de um primeiro-ministro que gera insegurança”
O secretário geral do PS, Pedro Nuno Santos, pede “consequências políticas” pelos problemas decorrentes da greve no INEM, mas não é a cabeça da ministra da Saúde que pede, apontando antes todas as responsabilidades ao primeiro-ministro e à “gestão da greve” que, diz, “provocou já danos na vida de alguns portugueses e gera em todos sentimento de insegurança”. “Estamos perante uma situação muito grave, de negligência, de irresponsabilidade e de incompetência do Governo”, disse tentando acertar diretamente em Luís Montenegro.
“O Governo nada fez para evitar a greve nem para minorar os seus impactos”, acusou o líder dos socialistas a partir da sede do partido, em Lisboa, para onde convocou os jornalistas. Numa altura em que a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde abriu inquérito às mortes por alegados atrasos no INEM nestes dias de greve, Pedro Nuno Santos vem dizer que “infelizmente foi só após oito mortes, aparentemente motivadas por atraso nos serviços de emergência médica, que o Governo sentiu a necessidade de intervir”.
Durante a conferência de imprensa, o socialista disse que “bastava uma reunião para impedir que a greve acontecesse tal como agora foi conseguido”. E diz que “neste caso concreto o Governo tinha obrigação de apresentar uma proposta de serviços mínimos”, contestando a tese de que nesta situação não podiam ser convocados. “Também podem ser decretados às greves ao trabalho suplementar”, assegurou em declarações aos jornalistas.
O socialista pediu “consequências políticas” e tentou separar o tema da falta de “investimento” na área e recusou muito diretamente que o Governo “se esconda no Governo anterior” — a única coisa que quis trazer do anterior Governo foi a memória da sua própria atuação como ministro das Infraestruturas muito concretamente nas negociações que, em 2019, se envolveu para chegar ao acordo que pôs fim (ao fim de três dias) à greve dos motoristas de matérias perigosas.
O objetivo do líder do partido é focar o caso no primeiro-ministro, coisa que já tinha feito, exatamente nos mesmos moldes (“o problema já não é da ministra, é do primeiro-ministro”) sobre as declarações polémicas da ministra da Administração Interna sobre o direito à greve dos polícias. “Esta greve nos serviços de emergência pré-hospitalares acontece com este Governo e no momento em que era preciso lidar com ela, o Governo falhou e foi só oito mortes depois que chamou o sindicato e mandou parar a greve”, declarou, salientando que “este problema não é só da ministra, é do Governo todo e do primeiro-ministro em particular que podia ter optado por dizer que ia averiguar, mas optou por desvalorizar esta greve dizendo que não podem andar sempre atrás de pré-avisos de greve”.
Segundo Pedro Nuno fica, assim, demonstrado que “o problema não se resolve só com a substituição da ministra, mas com a forma como o Governo resolve problemas”. “É quando governos são testados com casos concretos que se avalia a sua competência”, atirou apontando “demasiados casos” que “mostram que o Governo tem falhado no que é mais essencial”.
Questionado insistentemente sobre se pede a demissão da ministra da Saúde, o socialista diz que Ana Paula Martins tem “revelado grande incapacidade na gestão do dossier da Saúde”, mas diz que “o problema não é só a ministra”. E remete para o primeiro-ministro a “avaliação das condições” da ministra para continuar.
Governo não descurou problemas no INEM
Em resposta a Pedro Nuno dos Santos, Luís Montenegro rejeita a ideia de que o Governo não se tenha apercebido da gravidade do que se estava a passar na emergência pré-hospitalar e diz que não é por mudar as pessoas nos cargos que se resolvem os problemas.
Em declarações, a partir de Budapeste, o primeiro-ministro voltou a prometer reforçar o Instituto Nacional de Emergência Médica.
Montenegro sublinhou que o Executivo não pode andar ao sabor de pré-avisos de greve. O chefe de Executivo diz ainda que a única consequência política do que se passou é trabalhar para melhorar a situação da emergência hospitalar.
Marcelo quer problemas resolvidos
Enquanto os partidos a pedem a demissão da ministra da Saúde, o Presidente da República é mais contido nas palavras. Marcelo Rebelo de Sousa não quis, esta sexta-feira, pronunciar-se sobre se a ministra da Saúde tem ou não condições para se manter no cargo, depois de ter sido conhecido que Ana Paula Martins podia ter evitado a greve do INEM, mas não o fez.
Questionado pelos jornalistas, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu que o importante é que a “questão do INEM seja resolvida rapidamente”.
“Eu mantenho aquilo que disse. O que é fundamental é que a questão seja resolvida rapidamente. Nós temos de pensar do ponto de vista das pessoas, do ponto dos portugueses e das portuguesas e, portanto, seja rápida a resolução do problema.”
Sobre o assunto, foi ainda questionado sobre um possível afastamento de Ana Paula Martins do cargo, mas também a isso disse que “não se iria pronunciar”, respondendo aos jornalistas que “neste momento o ponto fundamental é que rapidamente se encontre uma solução que importa aos portugueses”.
“Quero focar-me no que é essencial, e o focar-me no essencial é as pessoas que estão numa situação de emergência esperam respostas de emergência e nesse sentido o que interessa é encontrar as respostas rápidas para os portugueses”.
MP abre 5 inquéritos às mortes
Recorde-se que até ao momento, e em apenas uma semana, há a registar oito mortes relacionadas com falhas no Instituto Nacional de Emergência Médica, que se acentuaram com a paralisação dos técnicos que foi suspensa esta quinta-feira depois de se terem reunido com a ministra.
As mortes alegadamente relacionadas com a falta de socorro por parte do INEM já motivaram a abertura de cinco inquéritos pelo Ministério Público (MP), um dos quais arquivado por ausência de indícios de crime.
Segundo informação prestada à Lusa pela Procuradoria-Geral da República (PGR), foram abertos inquéritos pelo Ministério Público às mortes ocorridas alegadamente na sequência da falta de assistência por parte do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) em Bragança, Cacela Velha, Vendas Novas, Almada e Ansião.
Sobre os casos de Bragança, Cacela Velha, Vendas Novas e Almada, a PGR referiu que “se encontram em investigação”.
“Relativamente aos factos de Ansião, na sequência da comunicação do óbito, foi aberto um inquérito. Coligidos os elementos de prova – designadamente a informação da GNR; as declarações prestadas por testemunhas, bem como do relatório do hábito externo realizado – concluiu o Ministério Público não haver indícios da prática de crime, tendo o inquérito sido arquivado”, explicou a PGR sobre o arquivamento do inquérito do caso de Ansião.
A PGR acrescenta ainda que “quanto a outras situações”, está ainda “a aguardar informação”.
As falhas ou atrasos na resposta do serviço 112 e no encaminhamento para os Centros de Orientação de Doentes Urgentes (CODU), do INEM, devido à greve dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) têm levantado polémica e já terão levado à morte de pelo menos oito pessoas
Os TEPH iniciaram no dia 30 de outubro uma greve às horas extraordinárias para pedir a revisão da carreira e melhores condições salariais, paralisação que suspenderam na quinta-feira, após o sindicato ter assinado um protocolo negocial com o Ministério da Saúde.
Na segunda-feira, a greve obrigou à paragem de 44 meios de socorro no país durante o turno da tarde, agravando-se os atrasos no atendimento da linha 112.