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Putin, finalmente, goza com Trump. E bem.

Há momentos em que a História decide entrar num bar, pedir uma bebida forte e olhar à volta como quem escolhe a próxima vítima do seu sarcasmo. Esta semana, a escolha recaiu sobre dois homens que confundem poder com performance teatral: Vladimir Putin, o maestro da eternidade enfadada, e Donald Trump, o palhaço com ambições de imperador romano mas sem o latim mínimo para a inscrição.

Trump chamou Putin de “louco”. Disse-o com aquela autoridade de quem já confundiu o Nepal com o Nipple e acredita que o Sol gira à volta dos campos de golfe que tem em Mar-a-Lago. Foi na sua rede social, um misto de diário de adolescente com delírios de César Bórgia em dieta de fast-food. Acusou o czar de Moscovo de querer paz enquanto bombardeia Kiev. E esperava, talvez, um debate. Recebeu uma caçoada.

O Kremlin respondeu com um floreado de sarcasmo digno das cartas de Fiódor Dostoievski em ressaca. Dmitri Peskov, o porta-voz que fala como quem vende tapetes mágicos de duplo sentido, disse que compreendia Trump — que atravessava “um momento difícil”. Sublinhou com compaixão, e um bigode metafórico, que havia “muitas emoções em simultâneo”. Uma espécie de psiquiatra involuntário, com a subtileza de quem recomenda lítio no chá de camomila.

Não é todos os dias que a Rússia se levanta do trono gelado da impassibilidade para gozar. Mas, desta vez, fez questão. E não respondeu com tanques. Respondeu com troça. Putin, o Eterno — espécie de Brejnev com Botox — aplicou a sua política externa mais eficaz: o desprezo encenado com rigor soviético.

E Trump, claro, caiu. Caiu como um pato. Donald. Sem asas. Direto na armadilha do espelho, onde se vê sempre maior, mais viril, mais astuto. Mas Putin olhou-o como se olha um urso de peluche que repete frases ofensivas em russo falso. E passou-lhe a mão pelo pêlo ao contrário.

Esta relação de sadomasoquismo diplomático tem contornos teológicos. Trump, o messias decadente, vê-se como enviado de um Apocalipse de rating; Putin, o demiurgo frio, escreve evangelhos com fósforos usados. Ambos sabem que já não são o que foram — mas insistem em representar versões caricaturais de si mesmos, como se a política fosse um carnaval perpetuado por algoritmos.

Há aqui uma tragicomédia que Hesíodo invejaria: um homem que se diz perseguido por bruxas eleitorais, chamado “Donaldo” por engano num documento oficial do Pentágono, acusa outro homem, ex-agente do KGB e campeão de judo interior, de ser instável. E este, em resposta, oferece-lhe uma manta emocional. Com padrão de troça.

Não estamos, portanto, num embate geopolítico. Estamos num episódio perdido de Monty Python’s Cold War. Um sketch escrito por um estagiário bêbado de Gogol, passado num mundo onde a loucura já não é diagnosticada — é eleita.

A questão, portanto, não é se Trump está louco. Isso seria ofensivo para os verdadeiramente descompensados, que ainda mantêm alguma coerência interna. A questão é: por que raio continuamos a levá-lo a sério? Porque lhe damos palco, microfone, teleponto e escadote para gritar as suas platitudes alaranjadas como se fossem versículos?

A resposta pode estar em algo que o alquimista Paracelso escreveu no século XVI: “O veneno está na dose”. E Trump, como personalidade política, já passou todas as doses letais do absurdo. Só que o mundo, em vez de antídoto, continua a servir-lhe microfones.

Putin, ao menos, percebeu. Descontou-o. Fez o que o Ocidente devia ter feito desde o início: tratá-lo como uma criança mimada num jantar de gala. Com paciência fingida e a firme convicção de que não se lhe deve dar o açúcar.

No fundo, talvez seja isto: o século XXI é um recreio sem vigilância. E há quem ainda ache que gritar mais alto lhe dá razão. Mas há esperança. Porque quando o palhaço não é a piada — é o alvo da piada — talvez estejamos, finalmente, a crescer.

Ou então não. Mas ao menos rimo-nos.

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Joao Vasco Almeida
Joao Vasco Almeida
Editor Executivo. Jornalista 2554, autor de obras de ficção e humor, radialista, compositor, ‘blogger’,' vlogger' e produtor. Agricultor devido às sobreirinhas.

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