A visita «surpresa» do presidente Joe Biden a Kiev na semana que assinala o primeiro aniversário da invasão da Ucrânia tornou-se um facto de relevância primordial. Ela confirma o envolvimento total dos Estados Unidos no apoio a um país que em 24 de Fevereiro de 2022 foi invadido pela Rússia que alegou a existência de neonazis e de uns drogados como justificativo da sua agressão.

A cena parece saída de um filme: o presidente americano, de 80 e muitos anos, viaja horas e horas de combóio a partir da Polónia numa deslocação que envolve delicados problemas de segurança para vir mostrar ao Mundo que está de alma e coração com a luta da resistência de um povo que viu o seu território invadido.

Se dúvidas houvesse elas esfumaram-se a partir do dia 20: a vitória militar da Rússia sobre a Ucrânia – seja lá o que isso signifique porque os objetivos russos parecem modificar-se ao longo da guerra – será difícil, será impossível mesmo. Ela significaria também a derrota dos Estados Unidos e nisso ninguém acredita.
O tom político atingiu o seu clímax nesta semana. No mesmo dia – na passada terça-feira – os presidentes russo e americano, afastados 1200 quilómetros, discursaram expondo as suas visões sobre esta guerra em solo ucraniano.
Enquanto Biden, em Varsóvia, agitava a bandeira da liberdade, proclamava a unidade reforçada da NATO e afirmava que a Rússia não ganharia o conflito, Putin, em Moscovo, agitava o papel da vítima.
Durante duas horas ele acusou o Ocidente e em particular os Estados Unidos de quererem destruir a Rússia e de terem começado a guerra que na realidade foi ele quem começou.
Defendeu os pretensos valores russos contra a «imoralidade» que grassa nos países ocidentais onde – ele afirmou no discurso – a pedofilia é normal. Retomou o espantalho nuclear ao anunciar que o seu país iria suspender a sua participação no tratado sobre armas nucleares estratégicas.
É caso para dizer: a Leste nada de novo. Enquanto Putin voltou a justificar a «operação militar especial» com os neonazis que pululam na Ucrânia,o seu parceiro Nedvdev falava nos «drogados» do governo de Kiev.
Passa um ano sobre o início desta guerra que o presidente russo julgava serem favas contadas, coisa para durar uns três dias. Quem não se lembra da coluna de tanques russos que marchou sobre Kiev? Coladinhos uns aos outros perfaziam 64 quilómetros, qualquer coisa como, grosso modo, é a distância que separa o Porto de Viana do Castelo.
Era uma espécie de marcha triunfal que se transformou numa marcha de retirada nunca tendo entrado na capital ucraniana. Numa das numerosas reportagens feitas por jornalistas portugueses sobre esta invasão um soldado ucraniano acusava os russos de covardes já que em vez uma luta cara a cara se refugiavam no uso de bombas.
É verdade: tem sido uma guerra à bomba. Num dia de mais intensidade de mísseis usados o custo, apenas nesse mesmo dia, foi calculado em 700 milhões de dólares.
Passado um ano o que nos vai pela memória é um país destruído, milhares de casas abatidas. Nesta fúria caíram também hospitais, creches, escolas, teatros e tudo o que parecesse um edifício.
Foram violações e execuções, crimes de guerra para todos os gostos. São cidades inteiras arrasadas. Nalgumas continuam a morar apenas alguns idosos que não têm para aonde ir. Em muitos locais falta tudo: água, electricidade, gás, comida.
Passado um ano os russos – que já perderam dezenas de milhares de soldados – não ganharam quase nada. Anexaram quatro regiões que por suspeitos referendos – para não lhes chamar outra coisa – batiam no peito afirmando a sua russofonia eterna.
Enquanto o Kremlin já vai «advertindo» outro país – a Moldávia – esta guerra está como os cestos, isto é, para lavar e durar. Quando terminará? Poderá ter fim? Talvez se a China mudar a sua posição – no que ninguém acredita – e optar por condenar a invasão.
Também poderá acontecer se Putin for embora e a sua sucessão se transformar numa confusão tal que a continuidade da guerra seja inviável. Provavelmente se ele for embora.