Paulo Rangel alerta para a desvantagem da Europa na tendência de “regular em demasia” na era digital e sublinha a urgência de reinventar a democracia para responder aos desafios tecnológicos
No contexto da Web Summit 2024, em Lisboa, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, fez um alerta contundente sobre as desvantagens da excessiva regulação europeia, apelando à procura de um equilíbrio entre a promoção do desenvolvimento tecnológico e a salvaguarda dos valores democráticos e dos direitos humanos.
Rangel sublinhou a “tendência cultural” europeia para uma regulação excessiva, caracterizando-a como uma desvantagem competitiva face a outras regiões, onde a inovação tecnológica é menos condicionada por restrições legais. “A Europa tem uma tendência cultural para regular em demasia, e isso é naturalmente uma desvantagem. Precisamos de equilíbrio, é sempre uma questão de equilíbrio, e de acomodar tanto o desenvolvimento tecnológico como os valores democráticos e os direitos humanos”, afirmou o ministro, no palco de uma das principais cimeiras tecnológicas a nível mundial.
Durante a sessão intitulada “Equilibrar Tecnologia, Confiança e os Valores Democráticos”, em que também participou o vice-primeiro-ministro do Luxemburgo, Xavier Bettel, Rangel destacou a crescente distância entre as instituições democráticas tradicionais e as necessidades da sociedade contemporânea, especialmente no que respeita ao papel central da tecnologia na vida dos cidadãos. Para o ministro, essa clivagem entre instituições e população torna imperativo o desenvolvimento de uma nova abordagem que seja simultaneamente protetora dos direitos fundamentais e adaptada ao ritmo acelerado da inovação.
“A única forma de proteger os direitos fundamentais é através de uma regulamentação equilibrada e de instituições que consigam salvaguardar liberdades essenciais, como a liberdade de expressão e o direito à privacidade, ao mesmo tempo que regulam o impacto dos monopólios no setor tecnológico”, explicou. Para Rangel, a resposta passa por criar uma estrutura que, sem asfixiar o progresso, permita uma fiscalização eficiente dos grandes grupos tecnológicos.
Um dos pontos centrais do discurso de Rangel foi o apelo para a “reinvenção” da democracia, que atualmente se encontra, segundo o ministro, ainda ancorada num formato territorial e físico. Rangel defende que a democracia precisa de evoluir para um modelo digital que esteja à altura dos desafios colocados pelo mundo online. “A democracia, enquanto fenómeno territorial e ancorado no mundo físico, já não responde plenamente aos desafios do presente. É necessário reinventá-la, rumo a uma espécie de democracia digital, para que possamos integrar tanto o território como o mundo digital,” frisou.
A Web Summit 2024, que decorre entre 11 e 14 de novembro no Parque das Nações, tem reunido mais de 71.500 participantes de todo o mundo, incluindo líderes empresariais, start-ups, investidores, representantes governamentais e profissionais de comunicação. Este ano, o evento conta com a presença de 953 oradores, mais de mil investidores e 3.000 empresas, configurando-se como um palco global para o debate sobre o impacto do desenvolvimento tecnológico na sociedade, na economia e na política.
O alerta de Rangel reflete uma preocupação crescente entre os líderes europeus: como integrar a rápida inovação tecnológica sem comprometer os valores democráticos que caracterizam a identidade europeia.