O presidente da Câmara de Loures reconhece que “deveria ter sido mais claro” quando defendeu despejos “sem dó nem piedade” , mas não pode aceitar ser condenado por uma frase menos feliz. Para Ricardo Leão, “ser de esquerda não pode significar enfiar a cabeça na areia quando se trata de temas mais sensíveis de gerir” realçando que defende valores que fazem dele um homem de esquerda
Num artigo opinião divulgado no jornal Público, o presidente Câmara Municipal de Loures, Ricardo Leão, não aceita ser condenado pelas suas declarações sobre o despejo de inquilinos, na sequência da morte de Odair Moniz, realçando que defende valores que fazem dele um homem de esquerda, escrevendo ainda que “ser de esquerda não pode significar enfiar a cabeça na areia quando se trata de temas mais sensíveis de gerir”.
“E a segurança é um deles. Conciliar este valor com a solidariedade, entreajuda e políticas públicas sociais, é o elefante que temos na sala e que muitos conscientemente, teimam em ignorar. É essencial que a esquerda tenha a coragem de encarar este elefante, fazendo-o sem tabus ou preconceitos, com respostas e soluções. Continuar a ignorar é entregar questões estruturais à direita e ao populismo. Sabemos bem que a política, tal como a natureza, tem horror ao vazio”, salientou.
Ricardo Leão reconhece no artigo que as afirmações “foram um momento menos feliz” e não refletem o que quis dizer e “muito menos” o que pensa.
“Deveria ter sido mais claro na minha comunicação. Aceito e reconheço isso. Mas não posso aceitar ser condenado por uma frase menos feliz. Humanismo, solidariedade e inclusão são valores que muito prezo e que têm pautado a minha conduta pessoal, profissional e política. São valores que fazem de mim um homem de esquerda”, escreve o autarca no Público.
Firmeza no combate ao populismo
Na opinião do autarca de Loures, combater o populismo exige firmeza, mas também exige respostas.
“E faltará ao PS quem faltar a este debate. Não basta rasgar as vestes. Sabemos bem que os eleitores do populismo não surgem de geração espontânea. São produto das falhas e omissões de muitos de nós, decisores políticos e públicos. São resultado da incapacidade de escutar as necessidades das pessoas”, afirmou.
No artigo, o autarca destaca o trabalho que tem sido feito em Loures para “encontrar o justo equilíbrio de uma resposta solidária inclusiva e responsável”.
“Quem, como eu conhece bem as áreas metropolitanas sabe que acumulámos nos nossos territórios reservatórios de descontentamento onde começam agora, a despontar sinais de revolta. Este não é um debate só nosso: atravessa toda a Europa”, disse.
As críticas de António Costa
Na semana passada, também num artigo publicado no jornal Público, o ex-primeiro-ministro António Costa, o deputado e membro da Comissão Política Concelhia de Lisboa, José Leitão, e o ex-eurodeputado Pedro Silva Pereira, criticaram as declarações do autarca de Loures, considerando que despejos arrendatários de habitações municipais como “sanções acessórias” complementares de “sanções criminais” ofendem os valores, cultura e identidade do partido.
Os militantes socialistas consideraram que “além de violar grosseiramente as competências reservadas da Assembleia da República e dos tribunais, os despejos atingiram, de forma manifestamente desproporcionada, o direito fundamental à habitação dos próprios e, por maioria de razão, dos inocentes que, integrando o respetivo agregado familiar, seriam colateralmente punidos apenas por residirem na mesma habitação”.
Posteriormente, Ricardo Leão pediu a demissão da presidência da Federação de Lisboa do PS para evitar que o partido seja prejudicado pela polémica.
Leader do PS fala em mau momento
Em jeito de resposta aos críticos de Ricardo Leão, Pedro Nuno Santos, durante uma visita aos bairros do Zambujal e da Cova da Moura (ambos na Amadora), qualificou apenas como um “momento mau” aquele em que o presidente socialista da Câmara de Loures, Ricardo Leão, se associou a uma resolução proposta pelo Chega na autarquia.
“Na vida todos temos bons momentos e todos temos maus momentos”, desvalorizou Pedro Nuno Santos, considerando que a tomada de posição de Ricardo Leão não pode invalidar uma avaliação globalmente positiva do “trabalho muito importante” que o autarca tem conduzido em prol da população de Loures.
Embora dizendo também que o PS não podia nunca associar-se a moções do Chega, muito menos com o teor referido, o secretário-geral do PS deu sinal implícito, com o argumento do “momento mau”, de que as declarações de Ricardo Leão não deviam impossibilitar de se recandidatar pelo PS às próximas eleições autárquicas.