Há notícias que, pela sua natureza, nos convidam a mais do que relatar factos: exigem contemplação. A inclusão do cardeal português José Tolentino de Mendonça entre os nomes mais citados para suceder ao Papa Francisco é uma dessas notícias. Um sinal dos tempos? Talvez. Um reflexo da Igreja que se quer mais aberta, dialogante e atenta às periferias do mundo? Sem dúvida.
Tolentino, o cardeal-poeta, o biblista de fala serena, o homem que encontra em cada palavra uma ponte para o outro, é hoje um dos 22 nomes apontados por vaticanistas como “papáveis”. E fá-lo sem estrondo, como é seu timbre. Com a discrição que só os que conhecem a força do silêncio sabem cultivar.

O percurso que o trouxe até esta possibilidade não é feito de ambições políticas, mas de serviço. Em 2018, o Papa Francisco confiou-lhe os exercícios espirituais da Cúria Romana — e o gesto valeu mais do que mil discursos. Meses depois, Tolentino foi chamado a ser guardião do saber da Igreja, como arquivista e bibliotecário da Santa Sé. Hoje, lidera o Dicastério para a Cultura e a Educação, uma missão que alia a fé à razão, a tradição à escuta do presente.
Entre os 140 cardeais com direito de voto, 110 foram escolhidos por Francisco. E, como o próprio Pontífice tem demonstrado, não é apenas a geografia que importa: é a sensibilidade, a capacidade de leitura do mundo, a coerência com o Evangelho. Neste novo tempo da Igreja, os cardeais não se reúnem com a frequência de outrora, e muitos mal se conhecem. A escolha do próximo Papa será, por isso, um ato de discernimento mais exigente — e talvez mais autêntico.
É neste contexto que o nome de Tolentino ganha peso. Não pela exposição mediática, mas pela densidade interior. Não por ser português, mas por encarnar, com delicadeza e profundidade, o espírito de Francisco: próximo dos pobres, atento à cultura, sensível às inquietações do nosso tempo.
Naturalmente, há quem veja com reservas o seu perfil. A sua abertura ao diálogo, a sua proximidade a correntes mais progressistas dentro da Igreja, a sua relação com o mundo da cultura — tudo isso pode ser lido como virtude ou como risco, conforme a perspetiva. Mas é precisamente esta capacidade de incomodar suavemente, de propor sem impor, que o torna uma figura singular neste colégio cardinalício.
A história da Igreja ensina-nos que o Espírito sopra onde quer — e muitas vezes onde menos se espera. Se Tolentino for chamado a ocupar o lugar de Pedro, fá-lo-á como sempre viveu: com humildade, com sensibilidade, com a convicção serena de que a beleza da fé se revela tanto no altar como na palavra, tanto no rito como na escuta.
Portugal poderá não ter apenas dado ao mundo um cardeal. Talvez tenha oferecido um poeta da fé. E, quem sabe, um futuro Papa.