Quinta-feira,Fevereiro 13, 2025
6.3 C
Castelo Branco

- Publicidade -

Ui di Sabroso! Que tal uma Ceia de Natal diferente?

Olha-se e parecem acepipes portugueses, canjas e outras sopas, feijoadas e bacalhau assado, galinha dourada e arroz de marisco, e mesmo bebinca (eu sei, essa é goesa, lá iremos). Mas depois repara-se que tem sopa de fitas chinesa, o odor a gengibre invade os sentidos, a galinha é picante como a africana mas sabe a coco e açafrão! O arroz chao chao – um arroz frito com com ervilhas, ovo e tudo o mais que se quiser incluir – acompanham um cozido a macaense, a que chamam tacho, com ingredientes locais, chouriço adocicado, batatas, nabo branco chinês, pele de porco assada na areia.

E o porco com molho balichão, confeccionado com camarão, aguardente, sal, pimenta, louro e malaguetas, entre outros ingredientes possíveis. Quando é bem preparado, o molho balichão pode conservar-se durante meses, em local fresco. Em Goa chamam-lhe balchão, mas é idêntico.

O caranguejo, que nós saboreamos cozido com maionese e vinha branco, marisco dos pobres, aqui aparece envolto num molho avermelhado com sabor intenso a caril e muita cebola refogada. Ao porco assado chamam-lhe bassafá e leva tamarindo, que nos transporta para a Malásia. E que tal um bitoque… a que chamaremos minchi: arroz, batatas fritas aos cubinhos, carne picada e um ovo estrelado por cima, com a indispensável soja.

Nas sobremesas, fios de ovos, bolo menino com cheirinho e sabor a manteiga, coco e ovos…alua, alua ou aluar, sobremesa feita de farinha de trigo, açucar, ovos e sal, muchi muchi que leva coco, lá continua o ingrediente oriental, das índias e outros orientes…

E é altura de falar da bebinca, um doce de Goa, feito com 7 camadas, gemas, açúcar, leite de coco, farinha, manteiga clarificada, noz moscada e água, o que originou a denominação de “Bebinca das 7 folhas”. Mas na cozinha macaense também existe bebinca, só que é com nabo branco, chouriço chinês adocicado, “camarãozinho pequenino tudo bem cozidinho a vapor e quentinho… é uma iguaria de matar as ganas de muitos macaenses esfomeados”, afirma o meu amigo Rodolfo, “macaense de gema”, agora alentejano de Évora.

Ceias pantagruélicas: mesa “farta” é uma tradição do macaense!

Gosto de conversar com o Rodolfo, somos companheiros de profissão, ambos trabalhámos na Universidade de Macau como bibliotecários. Costumávamos ir a Cantão, pouco mais que 2 horas de camioneta, e perdíamo-nos em lojinhas coloridas antes de explorarmos o mercado local: cão e gato esfolado, galinhas degoladas à nossa frente, peixes a saltarem dos aquários para o chão, tudo se vende vivo e preparado para o cliente levar na altura. Rebentos de bambus salpicavam rebentos de feijão mungo, couve branca, cenoura, cogumelos pretos, vagem de ervilha, tudo muito fresco e cores vibrantes.

Sabores, amores e odores que são regados com bom tinto ou, por vezes, uma boa aguardente de arroz.

O aparecimento desta tradição culinária data dos séculos XV e XVI, época em que os portugueses navegaram rumo ao Oriente, passando por África, Índia e Malaca, chegando à região chinesa de Macau. Durante este longo período, os portugueses utilizavam nos seus cozinhados não só os ingredientes facilmente conserváveis como bacalhau seco, chouriço português, azeite, vinho e azeitonas pretas, mas também os ingredientes e especiarias de vários lugares por onde passavam, como o piripíri africano, o caril indiano e o leite de coco do sudeste asiático, conseguindo combinar perfeitamente os métodos tradicionais da culinária portuguesa com os das culinárias da Ásia e África. Assim nasceu este estilo culinário de fusão.

A Casa de Macau, em Lisboa, costuma organizar, de forma mais ou menos privada, o chamado Chá Gordo, convívio com uma refeição volante realizada normalmente para comemorar feriados católicos, mas também outras cerimónias, como casamentos. Uma espécie de lanche ajantarado, que acontecia sobretudo nas casas das antigas famílias macaenses. Penso que o único restaurante de comida macaense em Lisboa, o Patuá, acabou por fechar em meados deste ano de 2024.

Se souberem de mais algum, avisem! Ui di Sabroso!

- Publicidade -

Não perca esta e outras novidades! Subscreva a nossa newsletter e receba as notícias mais importantes da semana, nacionais e internacionais, diretamente no seu email. Fique sempre informado!

Partilhe nas redes sociais:
Joaquim Correia
Joaquim Correia
“É com prazer que passo a colaborar no jornal Regiões, até porque percebo que o conceito de “regiões” tem aqui um sentido abrangente e não meramente nacional, incluÍndo o resto do mundo. Será nessa perspectiva que tentarei contar algumas histórias.” Estudou em Portugal e Angola, onde também prestou Serviço Militar. Viveu 11 anos em Macau, ponto de partida para conhecer o Oriente. Licenciatura em Direito, tendo praticado advocacia Pós-Graduação em Ciências Documentais, tendo lecionado na Universidade de Macau. É autor de diversos trabalhos ligados à investigação, particularmente no campo musical

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Destaques

- Publicidade -

Artigos do autor