Assim que a fumata branca surge na Capela Sistina, anunciando a eleição de um novo Papa, inicia-se um processo ritualístico preciso, que combina tradição milenar, direito canónico e simbolismo espiritual. O pontífice, eleito em conclave pelos cardeais, enfrenta uma sequência de passos formais até assumir plenamente as funções de líder da Igreja Católica Apostólica Romana.
Aceitação e Primeiro Acto Público
Após a votação final, o decano do Colégio Cardinalício pergunta ao eleito se aceita o cargo. Uma vez obtido o “accepto”, o novo Papa escolhe o nome pontifício — prática iniciada no século VI — e veste a batina branca, substituindo a roupa cardinalícia roxa. Segue-se o anúncio histórico “Habemus Papam” na varanda da Basílica de São Pedro, onde o pontífice profere a primeira bênção Urbi et Orbi (à cidade de Roma e ao mundo). Este momento, transmitido globalmente, marca o primeiro contacto com os fiéis.
A Missa de Início do Ministério Petrino
A posse formal ocorre na Missa de Início do Ministério Petrino, geralmente alguns dias após a eleição. Aqui, o Papa recebe os símbolos de autoridade: o pálio (faixa de lã branca com cruzes, que representa o papel de pastor) e o anel do pescador (emblema da continuidade com São Pedro). A cerimónia, realizada na Praça de São Pedro, inclui a leitura do Evangelho em grego e latim, sublinhando a universalidade da Igreja. Segundo o Vaticano, este rito “confirma solenemente a missão de guiar o rebanho de Cristo”.
Tomada de Posse da Basílica de Latrão
Embora menos mediática, a visita à Arquibasílica de São João de Latrão — catedral do Bispo de Roma — é essencial. Este gesto, realizado dias após a posse, simboliza a tomada efectiva das funções episcopais na diocese romana. O Código de Direito Canónico (cânone 332) especifica que o Papa “adquire plena autoridade logo que aceita a eleição”, mas a tradição reforça que só após estes ritos a legitimidade se torna visível aos fiéis.
Plenos Poderes e Transição
A partir do momento da aceitação, o Papa tem autoridade para governar a Igreja. Contudo, certos actos práticos ocorrem nos dias seguintes: a ocupação do apartamento pontifício, a nomeação de secretários e a dissolução do conclave. O anel do predecessor é destruído (para evitar falsificações), e a Cúria Romana inicia a transição administrativa. O novo pontífice também recebe as chaves do Vaticano, gesto simbólico que remonta ao século XV.
Equilíbrio Entre Tradição e Modernidade
Especialistas sublinham que, apesar da rigidez ritual, cada Papa imprime singularidade. “A estrutura é imutável, mas detalhes como o discurso inicial ou ênfase pastoral variam conforme o perfil do eleito”, explica Marco Ventura, professor de Direito Religioso na Universidade de Siena (entrevista à agência ANSA, 2023). Francisco, por exemplo, dispensou partes da pompa em 2013, optando por simplicidade.
Do “accepto” à bênção final em Latrão, o processo dura cerca de uma semana. Embora o poder jurídico seja imediato, a dimensão simbólica — crucial numa instituição de 1,3 mil milhões de fiéis — consolida-se passo a passo, entrelaçando história, fé e dever.
Por curiosidade, um dos filmes nomeado aos Oscar em 2025 chama-se “Conclave” e está disponível na Netflix – conta todo o processo de eleição e as tramas internas que se julga terem lugar.