Só quem ande muito bêbado é que pode sequer considerar que a morte de um Papa se sobrepõe à libertação de um povo. Com aquela cara de levar estalos o ministro Leitão Amaro apareceu a dizer que o 25 de Abril de 1974 ia ser comemorado “depois”, “lá para o 1º de Maio”, “mais tarde” porque, sustenta, o pobre Portugal está de luto e bandeira a meia-haste por causa do falecimento de um chefe de Estado estrangeiro
Esta gente está a gozar com o pagode (que somos nós) e eu, quando comecei a ouvir tal estultice pensei: queres ver tu que adiam a festa para 25 de Novembro e mata-se já o MFA, os três “Dês” de Abril, entrega-se isto à procedência (França) e traga-se vinho que de Pias só tem o nome?
Nem Aníbal I, o Inútil, se lembrou de tal coisa. Este Montenegro é uma peça de teatro de província dos anos ’30 e este PS está mais morto e embalsamado do que o Chico das Cruzes. Alguma vez se pode admitir não festejar o cinco de Outubro, dado o seu duplo significado? Os Conjurados? O 10 de Junho, ainda que este não sirva para nada?
Mas que porra é esta (porra quer dizer “vara”, para os mais sensíveis) com que nos querem dar na corneta? Passámos a ser estúpidos? Não há festa como esta, que me perdoe o PCP. O 25 de Abril é o fim das grandes corporações de financiamento estatal, a favor dos pequenos e médios negócios, ó senhores do PPD. É a liberdade de falar, pensar, agir, ler, aprender a ler, aprender, apenas. É o fim de boa parte do machismo, o fim das desigualdades básicas.
Querem então dizer-nos que, afinal, o 25 de Abril é um feriado móvel, como os religiosos? Que o Maia, o Jaime Neves, o Otelo foram apenas um mito de passagem beatificados pela Igreja Universal da Esquerdalha e que o Costa Gomes é um dogma açucarado? Que o abraço de Cunhal a Soares é uma vinheta que apenas merece pé de página para encher com um boneco qualquer livro sobre o grande Papa Paco?
Querem saber? Têm razão
Mas tenho em atenção que esta botada no coração me acorda para algo essencial: o 25 de Abril é popular. Não é dos corredores do Mosteiro de São Bento da Saúde que sairá coisa rara e boa. É nas e das ruas, esse papel. É nosso.
Que me interessa se o Presidente da República dá uma bicada ao primeiro-ministro? Que vale o remate a grosseria do líder da oposição contra o outro líder da oposição? Que farsolada é aquela do “eu tenho cravo na lapela, tu na mão e tu nem na mão nem no pé”? Finem-se, pois, as festas da mordomia, da burguesia balofa, a banda da GNR que desça a Avenida como todos nós fazemos e vá tocando o que lhe der na gana. Obrigado, Papa Paco. Boa pontaria para ires ter com o senhor e obrigar-nos a pensar que, quando liderados por mentecaptos, a nossa grande força é a união, a resistência e a celebração. É que nem tu, Jorge, que andaste na corda bamba da ditadura, haverias de querer que o povo estivesse triste, em vez de contente.
Comemorar o 25 de Abril a 1 de Maio e o 1 de Maio a 13 de Maio e o 13 de Maio a 10 de Junho, hein? Que tal? Letão, Luís, Pedro Nuno, Coiso, que tal? Vamos a elas? Eu levo o machete (não o Rui, coitado), para vos afiambrar as carnes pútridas.