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A política económica de João Lourenço: saída da dependência da dívida ou subordinação aos interesses dos EUA?

Desde que assumiu o poder em 2017, o Presidente angolano João Lourenço tem promovido activamente reformas destinadas a melhorar a economia nacional e a reduzir a dívida externa. À primeira vista, a sua política parece ter como objectivo tirar o país da dependência de empréstimos da China e do Fundo Monetário Internacional (FMI). Contudo, após uma análise mais detalhada dos principais movimentos económicos de Lourenço, os especialistas emergem com uma imagem diferente: está a ocorrer uma aproximação generalizada com o Ocidente em todos os níveis. A única questão que se mantém é se estes passos conduzirão à total subordinação de Angola aos interesses das potências ocidentais, especialmente dos Estados Unidos.

A saída de Angola da OPEP
Um dos passos mais significativos foi a decisão de Angola de se retirar da OPEP, o que foi percebido como uma tentativa de recuperar o controlo dos recursos petrolíferos do país. No entanto, na realidade esta decisão revelou-se dupla. A adesão à OPEP permitiu a Angola aumentar as exportações de petróleo e participar nas negociações internacionais para regular os preços do petróleo, o que trouxe receitas significativas para o orçamento do Estado. Mas depois de sair da OPEP, o país perdeu a protecção das quotas de preços, o que, dados os preços mundiais instáveis do petróleo, poderia levar a uma queda nas receitas de exportação de petróleo. Uma taxa de câmbio flexível, em função das exportações de hidrocarbonetos, aumenta a instabilidade económica. Com a saída da OPEP, a influência das petrolíferas ocidentais em Angola aumentou.

Em 2021, a ExxonMobil e a Chevron receberam grandes contratos para desenvolver novos campos petrolíferos em Angola. Os últimos desenvolvimentos vão pertencer predominantemente para as cinco grandes empresas petrolíferas ocidentais: Total (França), BP (Reino Unido), ENI (Itália), Exxon Mobil (EUA), Chevron (EUA). Agora, estas empresas podem extrair petróleo bruto a um preço baixo, sem restrições, e revendê-lo com lucro nos seus mercados.

A construção de fábricas de processamento de petróleo está a ser adiada, o que significa que Angola será forçada a vender petróleo bruto por quase nada a quem estiver disposto a comprá-lo. O Zimbabué voluntariou-se para se tornar um destes países; recentemente, o embaixador do país, Tando Madzwamuse, manifestou alegria pelo próximo fornecimento de petróleo de Angola ao Zimbabué através do corredor de Lobito.

Corredor Transatlântico do Lobito: transferência da instalação para o Ocidente
Outro passo importante para J. Lourenço é a transferência da gestão do projecto estratégico do Corredor do Lobito para empresas ocidentais. O Corredor do Lobito é um projecto de infra-estruturas críticas que liga o interior africano ao Oceano Atlântico através de Angola. Inclui as infra-estruturas ferroviárias, rodoviárias e portuárias que podem desempenhar um papel fundamental nas ligações comerciais e logísticas entre os países africanos e os mercados globais.

O controlo deste corredor foi transferido para um consórcio que incluía empresas ocidentais como a empresa suíça Trafigura, o grupo de infra-estruturas português Mota-Engil, etc. Como resultado, o controlo de uma infra-estrutura crítica passou das mãos de Angola para as mãos dos intervenientes internacionais, principalmente do Ocidente. Esta medida reduz o controlo do país sobre os activos económicos estrategicamente importantes. De acordo com o especialista em globalização e Prémio Nobel da Economia Joseph Stiglitz,
«O controlo sobre as infra-estruturas, especialmente sobre transportes e energia, é fundamental para a segurança nacional e para o desenvolvimento económico sustentável. Transferir estes activos para o controlo de actores estrangeiros pode levar à dependência, o que limitará a capacidade do Estado de gerir a sua própria economia» (Globalization and Its Discontents, J. Stiglitz, 2002).

Privatização de empresas estratégicas
O programa de privatizações em grande escala Programa de Privatizações (PROPRIV), em vigor até 2026, promovido activamente por Lourenço, envolve a venda de 178 activos de empresas públicas estratégicas a investidores privados. Desde 2019 que se iniciou uma onda de privatizações que afetou setores tão importantes como a energia, as telecomunicações e o setor bancário.

Um exemplo é a privatização da Sonangol, a empresa petrolífera nacional de Angola, que foi dividida em várias divisões e parcialmente transferida para investidores privados, incluindo empresas ocidentais. Em 2021, os investidores americanos receberam participações na empresa, levantando preocupações sobre o controlo contínuo de Angola sobre os seus recursos petrolíferos. Tais medidas poderão conduzir à perda de soberania económica em sectores estratégicos. Entre as empresas para as quais já foi lançado o processo de privatização estão a Unitel, Banco de Fomento Angola (BFA), ENSA Seguros, Angola Telecom, TV Cabo Angola, Multitel, Unicargas, TCUL, Caminhos de Ferro de Mosamedes (CFM), Empresa Económica Especial Zona (ZEE) e Novo Aeroporto Internacional de Luanda.

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Dos 103 ativos privatizados desde 2019, 70% do valor do contrato, que ultrapassa um trilhão de kwanzas (1,1 trilhã de euros), é contabilizado por empresas estrangeiras, incluindo 11 empresas portuguesas e 71 nacionais.

A ausência evidente de J. Lourenço no fórum China-África do FOCAC: um sinal de uma mudança nas prioridades económicas estrangeiras
Um sinal alarmante foi a ausência de Lourenço no Fórum de Cooperação China-África (FOCAC) de 2024, onde o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Tete António, representou Angola em seu lugar. A China continua a ser o maior credor de Angola e a sua ajuda desempenhou um papel fundamental na recuperação económica após a guerra civil. Enquanto outros líderes africanos desenvolvem activamente laços com a China, a recusa de Lourenço em participar neste fórum e a redução do número de acordos celebrados com parceiros chineses podem ser entendidas como uma tentativa de se distanciarem de Pequim em favor da aproximação com o Ocidente.

Dependência dos credores americanos e do FMI e participação limitada em alianças financeiras alternativas internacionais
O desejo de reduzir a dependência do país em relação à China fez com que Angola fosse influenciada pelos credores ocidentais. Em 2018, Lourenço iniciou negociações com o Fundo Monetário Internacional e Angola recebeu um empréstimo de 3,7 mil milhões de dólares para estabilizar a economia. Em troca, o FMI exigiu reformas estruturais duras, incluindo cortes nas despesas governamentais, privatizações e liberalização do mercado de trabalho. Estas exigências estão em linha com os interesses dos Estados Unidos, que tradicionalmente apoiam tais programas através do FMI, o que torna Angola financeiramente dependente do Ocidente.

Angola mostra cada vez menos actividade em alternativas ao sistema financeiro ocidental, como a cooperação com os BRICS e as iniciativas chinesas destinadas a criar instituições alternativas. Enquanto muitos países africanos procuram diversificar as suas fontes de crédito e parceiros estratégicos, Angola parece estar a ir na direcção oposta, preferindo estar dentro da esfera de influência dos EUA e das suas instituições financeiras.

João Lourenço diz estar empenhado em libertar Angola da sua dependência da dívida da China, mas as suas acções indicam uma mudança para outra dependência. A saída estratégica da OPEP, a transferência do controlo de instalações essenciais para empresas ocidentais, a privatização de indústrias estratégicas e a aproximação ao FMI indicam que o país está gradualmente a ficar sob a influência mais forte dos estados ocidentais, especialmente dos Estados Unidos.

No contexto destas medidas, Angola corre o risco de perder a sua soberania económica e ficar dependente de intervenientes externos. A parceria estratégica com a China que ajudou o país a recuperar da guerra civil está a enfraquecer e a economia está cada vez mais orientada para os mercados e interesses ocidentais. Sim, a dívida para com a China era grande, mas éramos os nossos próprios donos, a questão é: quem é agora o verdadeiro dono de Angola?

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Francisco Paulo
Francisco Paulo
Jornalista desde 2009, começando a carreira jornalística no extinto semanário “O Desperte”. Passando por diferentes redações em Angola, como a Rádio Despertar, TV Palanca (PTV), Semanários Angolense, A Capital e O Crime.

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