O mundo parece ter sido varrido por uma tempestade perfeita, um alinhamento apocalíptico de tensões e conflitos que vai desde o Kremlin até à península coreana, passando por desertos e cidades cercadas no Médio Oriente. É uma coreografia macabra, onde cada ator parece decidido a provar que, sim, podemos fazer pior.
A Coreia do Norte, esse enigma hermético e obcecado com um protagonismo militarista, vê finalmente a sua oportunidade de ouro. Kim Jong-un, tantas vezes retratado como caricatura de ditador, emerge agora no palco global com ambições renovadas e armas em riste. Até há pouco tempo, Pyongyang era um ator de segunda linha nas tensões globais, mas, com o mundo a desmoronar-se em conflitos por todos os lados, a sua entrada na guerra ao lado da Rússia contra a Ucrânia transforma-o numa peça letal neste xadrez sangrento.
Para a Rússia, a aliança com Kim representa um pacto perigoso, talvez desesperado. É a resposta de Putin à falta de apoio do Ocidente, que se fecha cada vez mais contra Moscovo com sanções. E para Kim, é a oportunidade de, finalmente, mostrar ao mundo as suas capacidades bélicas, num cenário que dificilmente poderia ser mais dramático. A aliança reforça-se e as armas começam a falar. Mas qual será o preço? Que tipo de precedente estamos a estabelecer ao tolerar que uma ditadura nuclear jogue as suas cartas no meio de um conflito global?
Entretanto, não podemos ignorar o Médio Oriente, esse barril de pólvora onde o fósforo aceso está sempre a um passo de cair. Israel, o Hamas, o Hezbollah e agora o Irão, que promete uma “resposta destrutiva” com um fervor quase bíblico. Este é o cenário onde fanatismos religiosos e ambições políticas se entrelaçam numa espiral de violência incessante, deixando no seu rastro apenas destruição e desalento. Qual será o limite? Quantos civis terão de sucumbir para que alguém, em algum lugar, se dê conta do absurdo?
E se isto não fosse já o suficiente para que o planeta inteiro segurasse a respiração, olhemos agora para o Ocidente. A América prepara-se para mais uma ronda de eleições, e não há nada mais perigoso do que uma potência global num ciclo eleitoral turbulento. A política internacional, em tempos de paz, é uma dança subtil de interesses e influências, mas em tempos de guerra, qualquer erro de cálculo pode ter consequências devastadoras. A Europa, por sua vez, não está imune. A Espanha, por exemplo, enfrenta um drama climático sem precedentes. A Mãe Natureza parece ter esgotado a sua paciência e, enquanto as temperaturas sobem e os campos secam, a realidade da crise climática torna-se um pesadelo palpável.
Num quadro onde as potências mundiais mais parecem atores de uma tragédia shakespeariana, cabe-nos questionar o papel da diplomacia, da ética e do sentido comum. Estamos à beira de um precipício. Será que estamos prontos para dar o passo?
“Portugal à Beira do Colapso Social: Entre a Indiferença e a Realidade”
Enquanto o mundo se consome em guerras e crises, Portugal parece, à primeira vista, alheado, quase apático. De cá, observa-se o pandemónio internacional com a distância de quem vê um incêndio no horizonte: o fumo ainda não chegou, mas o vento sopra na nossa direção. E é precisamente este distanciamento que preocupa. Por cada manchete alarmante sobre o colapso económico noutro país, por cada relato de exclusão social, Portugal devia acender os sinais de alerta. No entanto, os nossos políticos parecem mais ocupados a manter o espetáculo mediático interno, ignorando que a nossa estabilidade social e económica é tão frágil quanto uma casa de cartas.
Enquanto as crises externas se adensam, multiplicam-se também os sintomas de um descontentamento social crescente em Portugal. A precariedade laboral, o desemprego disfarçado e a inflação que não dá tréguas estão a empurrar muitas famílias para um ponto de rutura. A exclusão social, que já não é só um problema de periferias urbanas, alastra-se de forma silenciosa, entranhando-se no coração das nossas cidades. E que fazem os nossos líderes? Prosseguem num teatro político onde a realidade das dificuldades diárias de muitos cidadãos é ignorada, em nome de promessas vazias e conferências de imprensa cuidadosamente ensaiadas.
Mas como podemos permitir-nos a este desleixo? Portugal, com a sua economia dependente e vulnerável, devia estar a preparar-se para o pior. Devíamos estar a reforçar a rede de apoio social, a investir em políticas inclusivas e a promover um crescimento sustentável. Em vez disso, os nossos dirigentes continuam presos numa bolha de desinteresse, como se o resto do mundo fosse apenas um cenário distante, sem consequências para o “cantinho” lusitano. Continuam a ignorar as falências iminentes, os problemas de habitação, a falta de resposta eficaz nos serviços de saúde e os desafios na educação, preferindo alimentar um circo de intrigas e jogos de poder que apenas perpetuam o status quo.
E o que dizer do tratamento dado à classe média e aos jovens? A ilusão de estabilidade já não convence, e quem pode — sobretudo os mais jovens — começa a olhar para fora, em busca de oportunidades num estrangeiro que, paradoxalmente, também enfrenta os seus próprios desafios. É como se assistíssemos a uma lenta hemorragia social, enquanto as elites políticas nos asseguram que tudo está bem, que “Portugal é seguro”. Ora, segurança não é apenas a ausência de guerra no território; segurança é também garantir que os cidadãos têm acesso a uma vida digna, que a juventude tem um futuro e que a desigualdade não se transforma num fosso irreparável.
No final, resta-nos a pergunta essencial: até quando continuaremos a ignorar o espelho que o cenário internacional nos oferece? Ignorar o estado do mundo e a sua influência na nossa realidade interna é um erro estratégico que o país, neste momento, não se pode permitir. A crise social que já lateja nas ruas pode ser o estopim para algo muito mais sério, e é um erro subestimá-la. Portugal precisa, mais do que nunca, de políticos com visão, de líderes que sejam capazes de sair do espetáculo e entrar na realidade — antes que esta se imponha de forma avassaladora.