As eleições presidenciais de 2026 em Portugal estão a ser uma verdadeira comédia de equívocos. De repente, um desfile de personagens possiveis candidatos, mais ou menos conhecidos, enche o palco político, todos em busca de um lugar confortável no trono da presidência. Entre as alternativas encontramos nomes como Gouveia e Melo, Marques Mendes, Sampaio da Nóvoa, Santana Lopes, Mário Centeno, Passos Coelho, António José Seguro e o já habitual Ventura. E a questão que paira no ar é clara: o que, afinal, o povo quer para o futuro deste país? O que se espera, com alguma sensatez, de um novo Presidente da República, depois de Marcelo Rebelo de Sousa, que ao longo do seu mandato teve mais deambulações do que realmente certezas?
Não é segredo para ninguém que a presidência de Marcelo foi marcada por excessos e uma inquietante falta de seriedade institucional. Em vez de enaltecer a figura presidencial como a verdadeira representação da autoridade do Estado, o Presidente português transformou-se, ao longo dos anos, mais num animador de festas políticas do que num líder. A imagem de “homem do povo”, sempre pronto a dar um abraço e uma boa piada, fez mais pela descredibilização da instituição presidencial do que qualquer reforma constitucional. A presidência de Marcelo foi um constante jogo de aparências e disfarces: ora parecia um estadista ponderado, ora caía na tentação de piadas de mau gosto, que mais pareciam saídas de um talk-show, do que de uma esfera de responsabilidade política. E é isso que fica: a bipolaridade institucional, onde um Presidente não sabia quando deveria ser sereno e quando se tornava o “palhaço” da praça pública.
Eis que surge Gouveia e Melo, com a promessa de restaurar a autoridade presidencial. O almirante, conhecido pela sua postura militarista e pela sua gestão da crise pandémica, quer ser visto como a solução para um país que, à primeira vista, parece carecer de disciplina. A sua imagem de “homem de ação” – forjada nas batalhas contra o COVID-19, onde se apresentou em uniforme camuflado como se estivesse no meio de uma guerra – foi reforçada por declarações sobre a necessidade de disciplina e ordem. Gouveia e Melo promete mais controle, mais rigidez, como se a solução para os problemas do país fosse simples: basta aplicar uma dose de disciplina militar. Mas é essa a visão que o país precisa? Um Presidente que, em nome de uma suposta ordem, se deixe levar pelo autoritarismo disfarçado de rigor? O recente episódio das controvérsias com os militares da Marinha, onde o almirante afirmou que “não há forças armadas sem disciplina”, deixa uma pergunta no ar: até onde Gouveia e Melo estaria disposto a ir para instaurar uma ordem que, na sua cabeça, seria o remédio para todos os males?
É aqui que reside o grande dilema. O que, de facto, queremos para o cargo de Presidente da República? Será que estamos dispostos a trocar um líder que transformou a presidência numa piada de mau gosto por outro que, com a sua postura militarista, arrisca transformar o país numa marcha disciplinada, mas com sérias ameaças à liberdade democrática? O cargo de Presidente da República deve representar o equilíbrio, a imparcialidade, a dignidade. Não se trata de ser um ditador, como o fantasma do salazarismo, nem um amigo sem autoridade. O Presidente da República deve ser, acima de tudo, o maior embaixador de Portugal – dentro e fora do país –, promovendo a dignidade nacional, não a sua própria imagem pessoal.
Neste momento crítico da nossa história, o que o povo precisa não é de mais figuras autoritárias ou de líderes que confundem a presidência com uma actuação de stand-up comedy. O que precisamos é de um líder que saiba restaurar a confiança na política, que defenda, de forma irrepreensível, a liberdade democrática e que seja, acima de tudo, um exemplo de dignidade e responsabilidade. A presidência de 2026 não pode ser um jogo de forças políticas em disputa, mas um momento de união e reflexão sobre o futuro de Portugal.
O povo, este povo, não deve ceder à tentação do autoritarismo disfarçado de disciplina, nem à banalização do cargo de Presidente com piadas e gestos efémeros. Precisamos de mais: de um líder que, com seriedade e visão, seja capaz de olhar para o futuro deste país com os olhos da responsabilidade e da dignidade que ele merece. A presidência de 2026 deve ser a alvorada de um novo tempo, onde o equilíbrio, a liberdade e a democracia não sejam apenas palavras, mas sim valores vivos que moldam o nosso presente e futuro. E é isso que o povo merece: um Presidente que, de facto, honre a sua função.