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Panteão já guarda os restos mortais do escritor que “transformou a literatura”

Depois de quatro anos de espera, Eça de Queiroz está no Panteão. A decisão foi polémica e contestada, mas finalmente o escritor, jornalista e diplomata foi trasladado para o Panteão Nacional esta quarta-feira, 8 de Janeiro, ficando sepultado na última sala livre na Igreja de Santa Engrácia, deixando apenas mais três lugares livres para serem depositados os restos mortais de outras personalidades portuguesas

Panteão já guarda os restos mortais do escritor que "transformou a literatura"
Foto: João Porfírio / Observador

Eça de Queirós repousa, enfim, no Panteão Nacional, em Lisboa, e numa cerimónia pautada por momentos de leitura da obra do escritor, e de música mencionada nos seus livros, Marcelo Rebelo de Sousa e José Pedro Aguiar Branco destacaram a intemporalidade das palavras de Eça e dos seus comentários sobre o país. Afonso Reis Cabral, trineto do escritor e presidente da Fundação Eça de Queiroz, fez o elogio fúnebre, evocando o “artista metódico e compulsivo”.

As duas principais figuras da hierarquia do Estado fizeram um exercício sobre o que diria Eça do evento, com um discurso ao jeito do próprio autor e defenderam que a maior homenagem a fazer é continuar a lê-lo. Já no final do seu discurso, o presidente da Assembleia da República aproveitou para deixar uma farpa contra “megalomanias”.

Para Marcelo Rebelo de Sousa, poucos escritores estão tão vivos quanto Eça de Queiroz.  “Vivos porque os lemos de facto, por oposição a termos lido por obrigação escolar, por oposição a serem um vago nome de rua ou de jardim. Quantos serão esses mortos aos quais damos vida porque os lemos?”, questionou.

Para Marcelo, “a maior homenagem a Eça será sem dúvida reeditá-lo, estudá-lo e, acima de tudo, lê-lo”, mas “há actos de justiça, como esta trasladação, mesmo não conhecendo as vontades do escritor sobre a matéria”.

“Nunca haverá uma maneira certa de comemorar Eça, porque todas as comemorações ficam aquém. São de algum modo desajustadas”, disse.

“Esta sessão é uma homenagem dos portugueses através dos seus representantes. Não é um ato de somenos, antes um justo reconhecimento. Mas sabemos que temos de cuidar sobretudo da obra de Eça”, concluiu.

Eça anti-populismo

No seu discurso, José Pedro Aguiar-Branco começou por salientar a atualidade de Eça de Queiroz, assinalando que fala “de elites fascinadas com o estrangeiro e tantas vezes desligadas das vivências nacionais, de burgueses citadinos deslumbrados com o materialismo, de gente simples em serras abandonadas pelos círculos do poder, de jovens decididos a revolucionar o mundo que caem na resignação e no cinismo”.

“Será sobretudo a sua ironia e o seu prazer em derrubar ídolos que nos protegerá de triunfalismos e megalomanias”, disse o presidente da Assembleia da República a fechar o seu o discurso, num comentário bem mais focado no presente, uma deixa subtil contra o populismo. 

“Se assim for, também por isso, valeu a pena” esta cerimónia, salientou José Pedro Aguiar Branco, que elevou o estatuto de Eça de Queirós como um provedor nacional, um escritor e um homem a quem as críticas são sempre permitidas. Tecendo paralelismos com o passado e o presente, o presidente da Assembleia da República disse Eça é “mais do que qualquer outro, o escritor que nos descobre os vícios, o que nos denuncia, o que brinca, mesmo à distância do tempo, com os nossos defeitos coletivos.”

“Há críticas que só aceitamos quando são feitas pelos nossos. Há verdades que só os mais próximos nos podem dizer. Eça de Queirós conquistou na cultura portuguesa esse estatuto”, afirmou. Falou das críticas de Eça e da sua intemporalidade, sobre os políticos que “lidam mal com as farpas da imprensa” e sobre as elites, mas não deixou de notar que as críticas partem de alguém que “só podia gostar muito deste país”.

Enalteceu também o “brilho no seu percurso diplomático” em Cuba, onde serviu como diplomata e onde promoveu uma “defesa intransigente do humanismo”. “Foi muito mais do que um escritor. Foi, numa palavra, um reformista, e naqueles tempos reformista era um insulto. Hoje, para uns tantos, não será muito diferente”, vincou.

Aguiar Branco admitiu que Eça, num possível comentário irónico sobre a cerimónia desta quarta-feira e os discursos do próprio presidente do Parlamento, “certamente escreveria uma das suas melhores crónicas de sempre”. “E é por isso que o seu lugar sempre foi o óbvio: entre os nossos maiores, onde pertence, neste silêncio fala com eloquência”, sublinhou. Deixou ainda um agradecimento à aldeia de Santa Cruz do Douro, em Baião, onde o autor estava sepultado até agora, por “partilhá-lo com milhões de portugueses”.

Falta de espaço

O escritor Eça de Queiroz foi sepultado na última sala livre na Igreja de Santa Engrácia, no Panteão Nacional, deixando apenas mais três lugares livres para serem depositados os restos mortais de outras personalidades portuguesas.

O diretor do Panteão, Santiago Macias, explica que há outras soluções disponíveis, como por exemplo a homenagem através de placa – como acontece com o diplomata Aristides de Sousa Mendes. Outra das hipóteses apontada é “espaçar mais” este tipo de cerimónias, “também para não as banalizar”.

Por fim, o diretor do Panteão aponta ainda a possibilidade de construir uma cripta, o que implicará uma logística mais complexa e meios “seguramente maiores”.

“É uma hipótese, se se considerar que o Panteão deve desempenhar esta função”, concluiu.

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