O Banco Espírito Santo Angola (BESA) recusou prestar esclarecimentos sobre várias transferências de milhões de euros para o Sporting Clube de Portugal, realizadas entre 2011 e 2012, apesar dos insistentes pedidos do Banco Espírito Santo (BES). A revelação foi feita esta sexta-feira em tribunal por Vera Pita, responsável pela auditoria ao BESA encomendada pelo Banco de Portugal à Deloitte.
Em causa estão quatro transferências de cerca de 15 milhões de euros no total, efectuadas para uma conta da Sporting SAD com recurso a uma conta do BESA domiciliada no BES em Lisboa. Estas operações suscitaram dúvidas à equipa de ‘compliance’ do BES, que procurou obter esclarecimentos junto da sua congénere angolana. Nunca recebeu resposta.
“A maior parte das vezes em que são feitos pedidos de esclarecimento ao BESA, não existe resposta ou a resposta é inconclusiva”, afirmou a auditora durante o julgamento que decorre no Tribunal Central Criminal de Lisboa, no âmbito do caso BESA. A responsável sublinhou que esta falta de cooperação foi “uma questão transversal” ao longo da análise conduzida em 2014.
A consultora financeira alertou que o simples facto de existir um pedido de explicação não significa, por si só, que a operação seja ilegal. No entanto, explicou que as características das transferências — nomeadamente os montantes envolvidos e o destino para uma entidade desportiva — implicam riscos elevados e, por isso, exigem especial escrutínio ao abrigo da legislação de combate ao branqueamento de capitais.
Segundo a acusação do Ministério Público, o então presidente do BESA, Álvaro Sobrinho, terá ordenado estas transferências, utilizando fundos obtidos pelo BESA através de linhas de crédito e facilidades de tesouraria fornecidas pelo BES. Os procuradores sustentam que os valores nunca foram devidamente justificados e que configuram parte de um alegado esquema de desvio de fundos superior a mil milhões de euros.
Álvaro Sobrinho é um dos cinco arguidos no processo. Juntamente com ele, sentam-se no banco dos réus o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado — de 81 anos e diagnosticado com Alzheimer —, e o seu antigo braço-direito, Amílcar Morais Pires, que até agora é o único dos acusados que aceitou prestar declarações em tribunal.

Os arguidos enfrentam acusações de abuso de confiança, burla e branqueamento de capitais. Todos negam qualquer prática criminosa.
Este processo incide essencialmente sobre as operações realizadas entre 2007 e 2012, período durante o qual foram estabelecidas várias linhas de financiamento entre o BES e a sua subsidiária angolana, o BESA. O banco português colapsou no verão de 2014, e o BESA foi posteriormente liquidado em outubro do mesmo ano.
O julgamento, iniciado a 5 de Maio, encontra-se ainda na fase inicial, com a audição das testemunhas indicadas pela acusação. A Deloitte é a primeira entidade a prestar depoimento, numa sessão que promete trazer à luz novos detalhes sobre um dos maiores escândalos financeiros da história recente portuguesa.