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Estado só executou 44% das verbas do PRR para defesa da floresta

Frentes de incêndio de grande dimensão, aldeias em risco e um dispositivo de combate posto à prova semanas a fio — as imagens repetem-se verão após verão. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que dos 22,2 mil milhões de euros globais que compõem o envelope contratou cerca de 577 milhões de euros para as florestas portuguesas, prometia ser uma oportunidade histórica para inverter este ciclo, mas quatro anos depois da sua aprovação centenas de milhares de hectares arderam e a execução financeira desta componente está aquém do esperado, com apenas 44% das verbas pagas até 28 de agosto, segundo dados extraídos do Portal Mais Transparência.

Enquanto a floresta continua a aguardar pelas mudanças de fundo que prometem reduzir a vulnerabilidade do território aos incêndios, o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) está a conseguir produzir resultados no reforço dos meios de combate: viaturas, radares e helicópteros chegaram ao terreno e representam hoje o lado mais palpável da aplicação do envelope europeu, que só para esta componente contratou 577 milhões de euros.

Contudo, o Estado português executou apenas 44% dos fundos destinados à floresta no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), apesar de ter reforçado o combate a incêndios com a aquisição de meios aéreos e terrestres. A lentidão na execução deve-se a atrasos na implementação de medidas de transformação da paisagem, enquanto os meios de combate, como helicópteros, viaturas e radares, foram adquiridos.

A Comissão Nacional de Acompanhamento (CNA) do PRR classificou vários destes projetos como “críticos”, sinalizando que dificilmente serão cumpridos no calendário europeu, o que pode implicar a devolução de verbas.

A transformação da paisagem, eixo central com 261 milhões de euros, tem apenas 22% de execução: 53,7 milhões pagos a 338 projetos. A lentidão resulta da dificuldade em mobilizar proprietários rurais e de atrasos no Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF).

Também a Rede Primária de Faixas de Combustível mostra fortes atrasos: dos 21 mil hectares previstos, apenas 3977 estavam concluídos até abril. A execução financeira rondava os 23%.

Em contraciclo, o Cadastro da Propriedade e o Sistema de Monitorização do Solo estão mais avançados, com 62% de execução. O Balcão Único do Prédio já registou 2,6 milhões de terrenos rústicos (30% da meta) e o levantamento aéreo com tecnologia LIDAR está quase concluído. Ainda assim, vários problemas técnicos e suspensões temporárias de financiamento fragilizaram o processo.

Cortes de 100 milhões de apoios

Os atrasos na execução do PRR são especialmente preocupantes tendo em conta os cortes que o Governo de Luís Montenegro fez no âmbito da terceira reprogramação do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) em outubro de 2024.

Na altura, mais de 20 organizações ambientalistas criticaram a proposta e fizeram as contas, estimando que estava em causa uma redução de 44% na globalidade, com o corte total a rondar os 122 milhões de euros.

A 12 de outubro, quando o documento foi entregue em Bruxelas, a associação ambientalista Zero e o Centro Pinus emitiram um comunicado conjunto onde descreviam a decisão do Governo como “completamente incompreensível e inaceitável”.

“Todos os especialistas têm alertado para a necessidade de aumentar a gestão florestal e a Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) também salientou, no último relatório anual, que a intervenção no território não acontece ainda à escala espacial suficiente e apelou ao aumento dessa escala“, referiu o comunicado, citado pelo Público.

Este corte foi recentemente discutido no Parlamento, na sequência dos grandes incêndios que assolaram o país nos últimos meses, pela voz de Paulo Raimundo, que estima que o valor cortado seja de 114 milhões de euros.

“O país, como disse, não precisa de pactos como aquele pacto que cortou só no ano passado 114 milhões de euros de apoio à floresta, ora aí estão agora as lágrimas de crocodilo. O ano passado cortaram 114 milhões de euros de apoios à floresta e agora choram lágrimas de crocodilo porque a floresta está a arder. Obrigadinho, mas nós assim não vamos lá”, afirmou o líder do PCP no debate parlamentar.

Na sua justificação para os cortes dada em outubro, o executivo da AD não contrariou a estimativa de 122 milhões de euros dos grupos ambientalistas e referiu que estavam a ser feitos investimentos na floresta com outras verbas, nomeadamente as vindas do PRR: “No caso das intervenções florestais, é de destacar no PRR a medida C08-Florestas, que tem financiamentos com elevado volume disponíveis para o futuro próximo, com intersecções com o PEPAC.”

ZERO desmente razões do Governo

A associação ZERO refutou a razão dada pelo Governo, lembrando que “os diferentes instrumentos de financiamento foram concebidos para serem complementares“. “O PRR apoiará o investimento em cerca de 140 mil hectares, que representam apenas 5% dos 3,3 milhões de hectares classificados como territórios vulneráveis aos incêndios. O PEPAC, e outros instrumentos, como o Fundo Ambiental são, assim, indispensáveis para chegar a estes e a outros territórios”, criticou.

Apesar dos apoios financeiros comunitários, um facto é que o Estado português combate os grandes incêndios com aviões alugados, de um modelo com 30 anos, fora de prazo de validade. Quando as chamas se tornam trágicas, o que acontece todos os anos, fica dependente da ajuda internacional.

Os Canadair de Marrocos, agora, e os de Espanha e Itália, na carnificina de 2017, serviram de Santa Bárbara ao ‘dispositivo’ português, cada vez mais caro e impotente para travar a trovoada de fogos florestais que nos visita, sem falhas, a cada verão.

Entre críticas à falta de meios de combate aos incêndios florestais e garantias do Governo de que estava a ser feito tudo o que era possível, o mês de agosto ficou marcado pelos fogos que atingiram, sobretudo, a região centro e norte do país.

Do tom inicial da ministra da Administração Interna, que considerou “irrelevante” o número de meios de combate aéreos disponíveis, ao timing da activação do Mecanismo Europeu de Protecção Civil ― sem esquecer a realização da Festa do Pontal ―, Luís Montenegro acabou a cancelar as férias, mas nem isso aliviou a pressão da oposição sobre o Governo, que, por várias vezes, avisou o executivo sobre a necessidade de activar os mecanismos europeus de apoio ao combate aos incêndios florestais.

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