As audições desta quinta-feira no julgamento da Operação Marquês trouxeram novos detalhes sobre as movimentações financeiras do antigo primeiro-ministro José Sócrates. Em tribunal, a gerente da sua conta na Caixa Geral de Depósitos revelou que a mãe do ex-governante transferiu “dezenas de milhares de euros” para o filho, que, segundo o seu testemunho, raramente sabia o saldo bancário que possuía
Gerente descreve falta de controlo financeiro de Sócrates
Teresa Veríssimo, gerente da CGD responsável pela conta de Sócrates entre 2009 e 2014, explicou ao coletivo de juízes que as transferências feitas pela mãe do antigo chefe de Governo, Maria Adelaide Monteiro, eram consideradas “normais”, uma vez que eram solicitadas diretamente por telefone.
Os montantes movimentados situavam-se “nas dezenas de milhares de euros”, embora a testemunha não tenha precisado as datas exactas das operações.
Questionada pelo Ministério Público sobre a origem do dinheiro, a bancária afastou a hipótese de depósitos em numerário e apontou como justificação a “venda de um ou dois imóveis” pertencentes à mãe de Sócrates.
A gerente afirmou ainda que o ex-governante “normalmente não tinha consciência do dinheiro disponível na conta”, mencionando que o saldo e os limites dos cartões de crédito eram frequentemente atingidos.
“Recordo-me de ele me ligar a queixar-se de que o cartão não funcionava e de termos verificado que o ‘plafond’ estava esgotado”, relatou Teresa Veríssimo em tribunal.
Empregada doméstica nega entregas de dinheiro
Na mesma sessão, foi também ouvida Maria Rita Gomes, antiga empregada doméstica da mãe de José Sócrates. A testemunha declarou não se recordar de ter entregue qualquer quantia em numerário à sua patroa por instrução do antigo primeiro-ministro, referindo que tal teria acontecido há mais de dez anos.
A mulher, que trabalhou para Maria Adelaide Monteiro entre 1998 e 2014, negou igualmente ter transportado dinheiro de Sócrates para a mãe ou para o irmão falecido. Mesmo após ter sido confrontada com escutas telefónicas de Agosto de 2014 — nas quais o ex-primeiro-ministro e a mãe falam em “papéis”, alegadamente um código para quatro mil euros — manteve a resposta inicial.
Maria Rita Gomes recordou, contudo, que Maria Adelaide Monteiro lhe pedia ocasionalmente para realizar depósitos bancários numa conta de um irmão de Sócrates. Garantiu também nunca ter visto envelopes com dinheiro nas casas onde prestava serviço.
Ministério Público mantém suspeitas sobre origem dos fundos
Na acusação, o Ministério Público sustenta que o dinheiro em causa pertencia, na realidade, ao empresário Carlos Santos Silva, considerado testa-de-ferro de José Sócrates. Segundo o MP, o antigo primeiro-ministro dispunha desses fundos através de terceiros para financiar despesas pessoais e familiares, incluindo transferências para a mãe.
Um processo com 21 arguidos e 22 crimes imputados a Sócrates
José Sócrates, de 68 anos, responde em tribunal por 22 crimes, entre os quais três de corrupção, falsificação de documentos, branqueamento de capitais e fraude fiscal qualificada. O Ministério Público alega que o antigo governante recebeu milhões de euros em contrapartida de decisões políticas e administrativas favoráveis aos grupos Lena, Espírito Santo e Vale do Lobo.
O julgamento, em curso desde 3 de Julho de 2025 no Tribunal Central Criminal de Lisboa, envolve 21 arguidos e deverá prolongar-se até, pelo menos, 18 de Dezembro de 2025.








