Duas testemunhas afirmaram esta quarta-feira, no Tribunal Central Criminal de Sintra, que Odair Moniz não tinha qualquer objeto nas mãos no momento em que foi mortalmente atingido por um agente da PSP na Cova da Moura, Amadora, em outubro de 2024. As declarações contrariam a versão apresentada pelo polícia Bruno Pinto, que justificou os disparos com o alegado receio de estar a ser ameaçado com uma faca.
Durante a sessão, Fábio Duarte, de 31 anos, e o sobrinho Evandro Duarte, de 21, garantiram ao Ministério Público que Odair Moniz “não tinha nada na mão” quando o agente disparou. Ambos presenciaram a altercação que culminou com a morte do cidadão cabo-verdiano, de 43 anos, residente no Bairro do Zambujal, Amadora.
Segundo os dois homens, os tiros foram efetuados na sequência de uma disputa entre o polícia e a vítima, que tentava evitar ser algemada e detida. “Acabou por haver uma disputa. O Odair tentou afastá-lo, o polícia tentou pô-lo no chão e depois efetuou os disparos”, descreveu Evandro Duarte, sublinhando que os tiros foram “para baixo”.
Fábio Duarte acrescentou que, no primeiro disparo, Bruno Pinto encontrava-se a curta distância, com a arma junto ao corpo. No segundo tiro, o agente “já estava com os braços estendidos”, disparando de forma mais afastada.
A sessão ficou ainda marcada pelas dúvidas do coletivo de juízes quanto à real visibilidade de uma das testemunhas. Um dos magistrados recorreu à aplicação Google Maps para confrontar o jovem Evandro Duarte sobre o local onde dizia estar no momento do incidente, concluindo que a distância e o ângulo poderiam dificultar a observação direta do que ocorreu.
Contradições e contexto do processo
Na primeira audiência do julgamento, a 22 de outubro, o agente Bruno Pinto, de 28 anos, declarou que disparou por acreditar que Odair o ameaçava com uma lâmina. Afirmou ter visto “um brilho metálico” na zona da cintura da vítima e reagiu em defesa própria. No entanto, a acusação do Ministério Público, formalizada em janeiro de 2025, não menciona qualquer ameaça com arma branca.
De acordo com a investigação, o primeiro disparo atingiu Odair Moniz no tórax, a uma distância entre 20 e 50 centímetros, e o segundo na virilha, entre 75 centímetros e um metro. Ambos os tiros foram fatais.
Odair Moniz foi alvejado a 21 de outubro de 2024, depois de ter tentado fugir à PSP na sequência de uma infração rodoviária. A tentativa de detenção culminou com a sua morte no bairro da Cova da Moura, episódio que provocou protestos e forte indignação pública.
Bruno Pinto encontra-se suspenso de funções há cerca de um ano, em liberdade, e enfrenta agora uma acusação de homicídio simples, crime punível com pena de prisão entre oito e dezasseis anos.
O julgamento prossegue a 10 de novembro, no Tribunal Central Criminal de Sintra, com a audição de novas testemunhas que poderão esclarecer as circunstâncias exatas da morte de Odair Moniz.




