Sexta-feira,Outubro 31, 2025
15.9 C
Castelo Branco

- Publicidade -

Quando o Estado renuncia à imprensa: o fracasso que expõe uma omissão constitucional

A admissão do Ministro Leitão Amaro de que o programa de assinaturas gratuitas para jovens “não funcionou” é um raro momento de franqueza política, mas evidencia a falha estrutural do Estado em promover leitura, literacia mediática e acesso à informação credível.

O problema não é apenas desconhecimento do programa pelos beneficiários; é a ausência de uma estratégia nacional coerente que aproxime as novas gerações do jornalismo. O plano, limitado a 4.500 assinaturas, existiu apenas no papel e falhou por ausência de campanha eficaz. Uma política pública que não atinge o público não é política — é simulacro.

O fracasso afeta diretamente a imprensa nacional com foco regional e local, pilares do país real. São estes jornais que fiscalizam o poder local, dão voz às comunidades e mantêm viva a memória territorial. A omissão do Estado enfraquece o jornalismo, em vez de protegê-lo. Criar programas simbólicos sem meios adequados de execução não apoia a imprensa; condena-a à invisibilidade e à dependência.

É urgente substituir gestos simbólicos por políticas estruturadas. O Estado deve criar um apoio financeiro direto, regular e transparente aos órgãos de comunicação registados na ERC, abrangendo apenas os que cumprem obrigações legais e deontológicas, mantendo edição impressa e digital, inclusive da diáspora e lusofonia. Não se trata de assistencialismo, mas de investimento na democracia, assegurando liberdade editorial e continuidade do serviço público essencial que é o jornalismo.

A liberdade de imprensa não se garante com discursos; exige condições concretas de existência. Uma imprensa enfraquecida compromete o escrutínio do poder, a educação cívica e o direito do cidadão a ser informado. Sem políticas consistentes, os jovens permanecem afastados da leitura, a democracia enfraquece e o país perde consciência.

Impõe-se a criação de um Fundo Nacional de Apoio Direto à Imprensa, com gestão transparente e fiscalização independente, garantindo transferências mensais previsíveis, auditadas pela ERC e Inspeção-Geral de Finanças. O objetivo é assegurar independência, não dependência, reforçar a coesão nacional e aproximar as novas gerações da informação rigorosa e plural.

Anexo jurídico e administrativo

A Constituição da República Portuguesa obriga o Estado a garantir liberdade de expressão e informação (art. 37.º), liberdade de imprensa e independência dos meios (art. 38.º) e promoção da cultura e leitura (art. 73.º n.º 2), tornando o apoio à imprensa uma obrigação, não opção. As leis de imprensa (Lei n.º 2/99), audiovisual (Lei n.º 27/2007) e da ERC (Lei n.º 78/2015) legitimam apoios públicos diretos desde que transparentes e fiscalizados.

O modelo proposto deve prever critérios objetivos de elegibilidade, transferência mensal direta, auditoria anual e transparência pública total. O jornalismo é serviço essencial à democracia. Sem imprensa sustentável, o escrutínio do poder e o acesso à verdade tornam-se frágeis. Substituir medidas simbólicas por políticas estruturadas é juridicamente possível, constitucionalmente legítimo e socialmente indispensável.

Sem imprensa viva, o país perde voz, consciência e cidadania. A liberdade de imprensa é o termómetro da democracia. Sem jornais vivos, não há futuro.

Fernando Jesus Pires
Jornalista – CP, Diretor do jornal ORegiões
© Direitos de autor protegidos. Reprodução total ou parcial proibida sem autorização.

- Publicidade -

Não perca esta e outras novidades! Subscreva a nossa newsletter e receba as notícias mais importantes da semana, nacionais e internacionais, diretamente no seu email. Fique sempre informado!

Partilhe nas redes sociais:
Fernando Jesus Pires
Fernando Jesus Pireshttps://oregioes.pt/fotojornalista-fernando-pires-jesus/
Jornalista há 35 anos, trabalhou como enviado especial em Macau, República Popular da China, Tailândia, Taiwan, Hong Kong, Coréia do Sul e Paralelo 38, Espanha, Andorra, França, Marrocos, Argélia, Sahara e Mauritânia.

Destaques

- Publicidade -

Artigos do autor