Um dia, duas vitórias para o Governo: a aprovação do Orçamento do Estado para 2026 e a nova Lei da Nacionalidade. Mas os aliados foram distintos, com Luís Montenegro a querer mostrar que não tem parceiro preferencial no novo quadro parlamentar. Se a primeira conquista foi graças à abstenção do PS, a segunda contou com a ajuda do Chega (e também da Iniciativa Liberal). O Chega que manteve o sentido de voto em segredo quase até ao fim também votou contra.
Sem maioria, o Governo do PSD e CDS-PP contou com a ajuda do PS para a viabilização do OE2026. À direita, Chega e IL não pouparam nas críticas, considerando que podia ser um Orçamento “socialista”.
José Pedro Aguiar-Branco, presidente da Assembleia da República, colocou a proposta de lei do Orçamento do Estado à votação e as bancadas parlamentares e deputados únicos levantaram-se quando foram questionados quem vota contra, quem se abstém e quem vota a favor. Foi assim aprovada na generalidade a proposta de lei de Orçamento do Estado para 2026, com os votos a favor das bancadas do PSD e CDS-PP e viabilizada pela abstenção do PS, do PAN e do JPP. Chega, IL, Livre, PCP e Bloco votaram contra.
O documento segue agora para a fase da especialidade, na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, onde as propostas de alteração dos partidos devem entrar até ao final da tarde de dia 7 de Novembro. A votação final global está marcada para 27 de Novembro.
O secretário-geral do PS colocou quatro condições para o partido viabilizar o Orçamento do Estado para 2026. Segundo o secretário-geral socialista, essas condições encontram-se satisfeitas, pelo que o PS deverá abster-se.
A primeira dessas condições visa manter o regime de Segurança Social na esfera estritamente pública. Uma matéria que, segundo especialistas, dificilmente seria alterada em sede orçamental e muito menos este ano, até porque ainda está em curso o trabalho de uma comissão nomeada para estudar a sustentabilidade da Segurança Social.
Mas os socialistas mantêm-se desconfiados sobre os projetos do Governo da AD nesta área, visto que o grupo de trabalho constituído pelo Governo para analisar e propor medidas para garantir a sustentabilidade da Segurança Social a longo prazo integrou nomes conhecidos pelo pendor fortemente privatizante, a começar pelo coordenador, Jorge Bravo, e a acabar na ex-deputada da IL, Carla Castro.
Esta equipa deverá, segundo o Governo, “promover uma análise integrada da sustentabilidade do sistema de pensões englobando o Sistema de Proteção Social de Cidadania e o Sistema Previdencial, com uma visão estratégica a longo prazo do Sistema Integrado da Segurança Social” e fazer “uma análise da sustentabilidade do Regime de Proteção Social convergente da Caixa Geral de Aposentações”, além de “definir estratégias e avaliar propostas que garantam a sustentabilidade a longo prazo do sistema de pensões e melhorem a sua adequação e equidade”.
Este é um dos “cavaleiros orçamentais” que o Executivo de Luís Montenegro, no seu processo de “dessalinização” do Orçamento, para o tornar mais palatável (ou inócuo) para PS e Chega, retirou das cogitações para o exercício orçamental de 2026.
A propósito, Rui Tavares alerta que “Miranda Sarmento está a proceder a uma operação de despolitização do Orçamento, como se o Orçamento pudesse ser uma coisa inteiramente técnica e como se isso fosse uma coisa boa”. Afastado, por ora, o tema pode transformar-se num importante “irritante” entre Governo e PS, logo que, nos princípios de 2026, a comissão vier a apresentar resultados.
Comunistas querem aumento de salários e pensões
Comunistas apresentaram as primeiras propostas de alteração ao OE2026, onde se inclui também o regime de dedicação exclusiva no SNS, o aumento de todas as pensões de reforma em 5%, com uma valorização mínima de 75 euros; reduzir as propinas e outras taxas cobradas aos estudantes do ensino superior em 50% em 2026, e eliminar o resto no ano seguinte; fixar o preço da botija de gás butano de 13kg em 20 euros; criar o regime de dedicação exclusiva no SNS com uma majoração de 50% do salário base; disponibilizar gratuitamente os medicamentos nas unidades de saúde públicas e nas farmácias comunitárias a utentes com mais de 65 anos, que sejam doentes crónicos ou tenham insuficiência económica.
Estas foram algumas das primeiras propostas de alteração ao Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) apresentadas pelo PCP nas primeiras horas do processo de especialidade. A que se juntam as propostas de aumento do subsídio de refeição para 12 euros e a da criação de uma rede pública de creches através da construção e reabilitação de imóveis públicos, que permita “assegurar, até 2031, a disponibilização de vagas” para todas as crianças até aos três anos.
Paula Santos, líder parlamentar comunista, anunciou também que o PCP entregou já um projecto de resolução que propõe o aumento do salário mínimo nacional para 1050 euros.
Questionada sobre se há estimativa do custo destas propostas ou se o partido irá propor medidas de captação de receita, Paula Santos disse que o partido também fará propostas de âmbito fiscal, apontando que, por exemplo, se o Governo acabasse com os benefícios fiscais a grandes empresas e a não-residentes, teria cerca de 1800 milhões de euros para poder valorizar as pensões de uma forma mais musculada e para outras medidas, como compensar o financiamento das universidades (tendo em conta o fim das propinas).
A líder parlamentar do PCP apontou também que a redução de quatro pontos no IRC (que impacta sobretudo nas grandes empresas) custará aos cofres do Estado 2000 milhões de euros.
ANFRE contra
Entretanto, a Associação Nacional de Freguesias considerou que o Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) é o pior dos últimos cinco anos e insuficiente para o funcionamento destas autarquias, reafirmando a necessidade da revisão da Lei das Finanças Locais.
A Anafre deu um parecer negativo à proposta de OE pelo terceiro ano consecutivo e destaca que a proposta para 2026 “reflete uma perda de receitas para as freguesias”, numa audição no âmbito da proposta de Orçamento do Estado para 2026.
“E porque é que eu digo que é o pior orçamento dos últimos cinco anos? Eu baseio-me nos factos. Em 2023, nós tivemos um aumento de 5,89% de todas as receitas. Em 2024, tivemos 19,17%. Em 2025 tivemos 13,50%. Em 2026 vamos ter 2,5%. Isto é factual. Isto reflete, com certeza, e é a opinião também dos meus colegas, uma perda de receitas para as freguesias”, disse Jorge Veloso, ainda presidente da Anafre.
O autarca admitiu que a proposta está perto do valor mínimo previsto na Lei das Finanças Locais (LFL), mas “é um valor exíguo, é muito pouco” e insuficiente para que as freguesias cumpram os seus compromissos.




