Na vastidão da internet, onde todos têm uma voz e uma opinião a partilhar, um espaço tem vindo a brilhar com uma luz peculiar: a caixa de comentários do site ORegiões
Não só pelos debates que ali surgem, mas pela miríade de manifestações tão diversas quanto a cor das camisas num desfile de Carnaval. Este é o local onde o império da opinião se faz mais forte, onde a crítica fervorosa àquilo que é dito e escrito, transforma-se num espetáculo de resistência e, muitas vezes, de desconstrução.
Mas ao contrário do que muitos gostariam de acreditar, a verdadeira natureza dos comentários é, na sua essência, um reflexo de como, por vezes, o debate político em Portugal se enreda em um jogo de lealdade partidária cega. No que se refere às minhas crónicas, por exemplo, a reação a cada linha escrita é um verdadeiro termómetro da polarização que nos afecta. Uns amam, outros detestam, e outros simplesmente se ofendem, porque, ao lerem, encontram algo que os remete para um amigo, ou para um amigo político. Nada contra, a liberdade de opinião está garantida.
Contudo, é inevitável que surjam aqueles que, cegamente, se posicionam ao lado do emblema político, como se fosse uma questão de honra ou de sobrevivência. Para esses, uma crítica, por mais fundamentada que seja, é inadmissível, porque vai contra o partido, contra o seu escudo ideológico, contra o seu “mestre” político. E aí começam os comentários carregados de ressentimento e acusações: “És contra o meu partido, logo és contra mim!” Mas será que a crítica política precisa de ser uma trincheira de guerra? Ou seria mais interessante se tivesse a capacidade de abrir os olhos e ver para além da capa partidária? Talvez.
É interessante como muitos comentadores esquecem que, mais importante que a etiqueta política que se veste, está a essência do que está a ser dito. Quando escrevo sobre erros, práticas duvidosas ou decisões impopulares, não o faço com um dedo acusador direcionado a um partido, mas para aqueles que, dentro de qualquer espectro político, perpetuam o erro. Não é pessoal, é apenas análise. Para uns, no entanto, a crítica é só uma ofensa disfarçada.
Mas quem são estas pessoas que, ao se manifestarem, expõem a sua limitação em ver além do seu próprio umbigo político? Como se só quem veste o mesmo emblema partidário tivesse a capacidade de ver a realidade. Estes são os intelectuais de algibeira, aqueles que, quando se posicionam, acreditam que têm a chave da verdade. São os mesmos que, empoleirados na sua grande cidade de cimento, onde as ruas são calcadas por carros e o verde se perde entre os prédios, olham para o interior do país como se fosse um vasto campo de ignorância e atraso.
Imaginam que quem vive no interior não tem acesso ao conhecimento, que não lê livros ou que a vida lá é apenas um caminho de becos sem saída. Mas como podem esses mesmos intelectuais afirmar tais coisas, quando nem conhecem a vida no interior, nem sabem como o mundo ali pulsa? A realidade do interior é, para eles, um território distante, envolto em estereótipos e mitos urbanos. Que sabem eles da vida de quem vive entre os campos e as aldeias? Não sabem, porque nunca saíram da sua bolha. E essa bolha, à falta de um espelho que a reflita, não permite ver as falhas que existem em todo o lado.
A caixa de comentários do ORegiões, em sua verdadeira grandeza, é o palco onde estas contradições se manifestam, onde cada um expressa sua indignação e a sua insatisfação. Mas no meio disso tudo, sempre surgem aqueles que se apegam à cartilha barata da crítica sem reflexão. Aqueles que, armados de um raciocínio enjaulado e um preconceito ainda mais profundo, despejam as suas lições de moral política, como se a verdade fosse uma única linha traçada a giz. Esses não têm olhos para ver, nem ouvidos para escutar.
É preciso entender que a verdadeira crítica, aquela que constrói e não destrói, não está condicionada ao lado político em que nos encontramos. Ela deve ser livre, sem amarras, sem dogmas. A política não é um jogo de amizade ou inimigos, mas um espaço onde os erros devem ser apontados, as falhas corrigidas e o debate sempre enriquecido. E quem não consegue ver isso, perde-se no seu próprio labirinto de crenças estreitas, longe da verdadeira essência do diálogo.
Por isso, meus caros, continue-se a comentar, continue-se a partilhar, mas que o comentário não seja uma arma de ataque. Que seja, antes, uma oportunidade para abrir os olhos e a mente, para criticar, sim, mas com reflexão, com inteligência e, acima de tudo, com um pouco mais de respeito. O mundo não se resume a um partido, mas a todos os cidadãos que têm a coragem de pensar além do imediato e do superficial.