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Extinguiram os Guardas Florestais. E o País Continua a Arder

EDITORIAL
Por Fernando Jesus Pires, Diretor do jornal ORegiões
 
Em 2006, o então Governo da República, liderado por José Sócrates e com António Costa como ministro da Administração Interna, decidiu extinguir o Corpo Nacional da Guarda Florestal, integrando os seus elementos no quadro civil da GNR. Fê-lo através do Decreto-Lei n.º 22/2006, hoje citado com frequência — nem sempre com rigor, mas quase sempre com indignação. O diploma é claro: os guardas florestais não foram apenas redistribuídos; os seus postos foram extintos à medida que vagassem. O resultado? Um esvaziamento gradual de presença, conhecimento e proximidade nas nossas florestas
 
Hoje, quase vinte anos depois, a pergunta permanece mais atual do que nunca: quem apagou os olhos do Estado sobre o território? E porquê?
 
A floresta portuguesa continua a arder. E continua a arder não apenas por razões climáticas — que existem, sim — mas sobretudo por uma ausência estrutural de presença humana, técnica e institucional onde ela faz mais falta: no interior. O drama dos incêndios não é apenas ecológico. É também social, económico e político. E, sobretudo, é previsível.
 
A narrativa oficial insiste nos meios de combate. Aviões, helicópteros, comunicações sofisticadas e reforços sazonais. Mas nada substitui o que o Estado deliberadamente desmantelou: a vigilância contínua, o conhecimento do terreno e o compromisso de proximidade que os antigos guardas florestais garantiam. Eram mais do que funcionários públicos — eram sentinelas do território.
 
Os incêndios que devastam o país, ano após ano, são o sintoma visível de um problema mais profundo: o abandono do interior. Onde há menos votos, há menos atenção. Onde há menos mediatismo, há menos investimento. A política tem-se mostrado cega a esta realidade. Pior ainda: tem agido contra ela. E a extinção do Corpo Nacional da Guarda Florestal é um exemplo flagrante dessa cegueira.
 
Sabemos, e devemos recordar com clareza, que o decreto de 2006 foi assinado por duas figuras centrais da vida política nacional: José Sócrates e António Costa. Não se trata de apontar o dedo por desportivismo partidário, mas de reconhecer as consequências objetivas de decisões tomadas no passado recente. Responsabilidade política exige memória. E memória não é vingança — é condição para não repetir erros.
 
Os milhões que o país gasta, todos os verões, no combate às chamas podiam ser aplicados em prevenção permanente. Podiam financiar o retorno de estruturas locais, apoiar a agricultura de pequena escala, remunerar quem cuida da terra e do território. Mas essa opção implicaria mudar prioridades. E colocar o interior no centro das decisões.
 
Enquanto isso não acontecer, as serras continuarão a arder. As aldeias continuarão a desaparecer. E o país continuará a lamentar, todos os agostos, aquilo que não quis resolver em janeiro.
 
Em nome do jornal ORegiões, cuja missão é dar voz aos territórios esquecidos, afirmamos sem hesitação: a extinção dos guardas florestais foi um erro estratégico, político e civilizacional. Recuperar a vigilância do território é uma urgência nacional — e não apenas uma memória amarga.
 
Nota editorial: Este texto representa a posição editorial do jornal ORegiões. Publicado ao abrigo da liberdade de imprensa e expressão, garantidas constitucionalmente, tem como objetivo contribuir para um debate público informado, plural e responsável sobre o futuro da floresta, do interior e da coesão territorial em Portugal.
 
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Fernando Jesus Pires
Fernando Jesus Pireshttps://oregioes.pt/fotojornalista-fernando-pires-jesus/
Jornalista há 35 anos, trabalhou como enviado especial em Macau, República Popular da China, Tailândia, Taiwan, Hong Kong, Coréia do Sul e Paralelo 38, Espanha, Andorra, França, Marrocos, Argélia, Sahara e Mauritânia.

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