Entre críticas à falta de meios de combate aos incêndios florestais e garantias do Governo de que estava a ser feito tudo o que era possível, as últimas semanas foram marcadas pelos fogos que atingiram, sobretudo, a região centro e norte do país. Do tom inicial da ministra da Administração Interna, que considerou “irrelevante” o número de meios de combate aéreos disponíveis, ao timing da activação do Mecanismo Europeu de Protecção Civil ― sem esquecer a realização da Festa do Pontal ―, Luís Montenegro acabou a cancelar as férias, mas nem isso aliviou a pressão da oposição sobre o Governo. Entretanto, o Primeiro-ministro convocou, para esta quinta-feira, em Viseu, um Conselho de Ministros extraordinário para “aprovar medidas de apoio às populações afectadas pelos incêndios florestais”.
Portugal continental tem sido afetado por múltiplos incêndios rurais de grande dimensão desde julho, sobretudo nas regiões Norte e Centro, que já provocaram quatro mortos, incluindo um bombeiro, e vários feridos, alguns com gravidade, e destruíram total ou parcialmente casas de primeira e segunda habitação, bem como explorações agrícolas e pecuárias e área florestal.
O Governo tem sido alvo de críticas e, perante as muitas acusações, Rui Rocha, secretário de Estado da Proteção Civil, garante que o Executivo tem dado “uma resposta positiva”, no entanto admite falhas.

O secretário de Estado, em declarações à SIC, observa que “não há memória” neste século de um período tão prolongado de condições meteorológicas adversas. No entanto, como realça, a partir da noite desta quarta-feira, as temperaturas vão diminuir, bem como a humidade , pelo que, por isso, a situação de alerta não será prolongada.
“São esses aspetos que nos levaram a não prolongar a situação de alerta, tendo também a consciência que já estamos num período prolongado e que também tem consequências do ponto de vista de algumas atividades que ficam condicionadas”, explica.
Por ter sido autarca em Ansião, inclusive no ano de 2017, garante saber o que é “a aflição e o drama de ter chamas por todo o lado”, mas aponta que tem havido sempre “quatro ou cinco incêndios de grandes dimensões” que mobilizam simultaneamente milhares de operacionais, razão pela qual, muitas vezes, algumas populações não recebem auxílio imediato.
Rui Rocha reconhece, contudo, que este ano se têm verificado “circunstâncias anormais”, como trovoadas secas e ventos “convectivos”, que têm agravado a situação de incêndios.
“Descoordenação momentânea”
Questionado se o Governo falou na preparação desta época do ano, Rui Rocha admite que “possa haver alguma descoordenação momentânea” devido à complexidade dos teatros de operações: “aquilo que o dispositivo, a forma como tem respondido, apesar de todas estas incidências, julgo que tem sido uma resposta positiva. Com as lacunas que temos verificado, mas, de facto, tentando balancear todo um dispositivo nacional”.
O secretário de Estado entende que o Governo “deve fazer a preparação de um conjunto de políticas”, nomeadamente de “prevenção, de organização do território, de valorização da floresta e da responsabilidade coletiva”.
O presidente da Liga dos Bombeiros considera que, nos últimos dias, tem faltado um rosto de comando nacional, crítica que não é validada por Rui Rocha, que recorda que o comandante nacional da Proteção Civil tem, quase diariamente, vindo a público informar a população sobre a situação que assola o país e, muitas vezes, desloca-se aos territórios afetados. Mais uma vez, afirma que as previsões para os próximos dias são animadoras.
“Hoje temos dois incêndios ativos. É um número bastante mais reduzido do que aquilo que nos fustigou em momentos anteriores, com 10 ou 12 teatros de operações, e, portanto, estamos confiantes que também vai ser possível dar uma forma de fazer descansar o dispositivo, que tem que estar, se me permite a expressão, mas tem estado em carga máxima durante 25 dias, e, portanto, estou certo de que com as condições meteorológicas mais favoráveis vai ser possível também nós balancearmos eventuais ocorrências que possam vir a acontecer.”
Ativado mecanismo europeu
O Executivo liderado por Luís Montenegro ativou o Mecanismo Europeu de Proteção Civil depois de um período de mais de duas semanas de combate às chamas, uma decisão que não tem escapado a críticas.
Sobre essa matéria, o secretário de Estado explica que esse é “um mecanismo de último recurso” e lembra que Bruxelas “não tem um lote de aeronaves que está disponível para distribuir” pelos Estados-membros.
“Dar nota de que quando tivemos a informação que dois canadairs ficaram avariados, imediatamente tentámos o acordo bilateral com Espanha. Um apoio para colmatar essa circunstância, que veio imediatamente com os dois canadaires, não de Espanha, mas do Reino de Marrocos, que estão até amanhã. Prolongaram a sua estadia e estão connosco. Conseguimos, já depois de acionar o mecanismo europeu, a parelha de fire bosses da Suécia, que já começou a operar”, informou.
Nos últimos dias, lamenta, o grande problema não tem sido a falta de meios aéreos, mas sim o facto de as aeronaves não poderem operar devido à falta de condições: “isso é a maior angústia que nós temos. É perceber que temos os meios, mas perceber que não temos as condições em momentos muito determinantes para um determinado teatro de operações”.
Novamente sobre o Mecanismo Europeu de Proteção Civil, Rui Rocha explica que a necessidade de ativação foi sinalizada na sexta-feira.
Conselho de Ministros vai aprovar apoios a populações
O secretário de Estado garante ainda que o ministro da Economia, o ministro Adjunto e da Coesão e o ministro da Agricultura já “estão a fazer o levantamento a estudar a forma de apoio” às pessoas afetadas pelos incêndios.
Aliás, esta quarta-feira, terminada a situação de alerta, e quando há ainda dois grandes incêndios ativos e a preocupar, o gabinete do primeiro-ministro informa que Luís Montenegro convocou o elenco governativo para um Conselho de Ministros Extraordinário a realizar amanhã (quinta-feira) e com um único ponto na agenda: “aprovar medidas de apoio às populações afectadas pelos incêndios florestais”.
A reunião decorrerá em Viseu, um dos distritos mais afetados pelos incêndios dos últimos dias. Este anúncio acontece um dia depois de, em comunicado conjunto, os Ministérios da Economia e Coesão Territorial e da Agricultura e Mar, terem informado de que estão, “desde o primeiro dia dos fogos florestais, a proceder ao levantamento dos prejuízos nas regiões afetadas pelos incêndios no Centro e Norte do país, assegurando uma presença constante no terreno junto dos agricultores e comunidades atingidas”.
O objetivo é, explicavam, o de garantir “uma avaliação rigorosa e rápida da extensão dos danos sofridos” para que fosse possível “avançar rapidamente para o apoio financeiro” aos afetados pelos incêndios, estando o foco centrado na identificação de “necessidades de reparação de explorações”, “reposição do potencial produtivo” e de “primeiras habitações afetadas”, mas também de indústrias e comércios.
A promessa é a de que, “o Governo, tal como fez nos incêndios de setembro de 2024, ajudará rapidamente as populações, agricultores, produtores, empresários e os que sofreram perdas e prejuízos, em primeira habitação, culturas, animais, e equipamentos agrícolas, industriais e comerciais”.
Cenário atual
Desde julho que Portugal continental tem sido afetado por vários incêndios de grande dimensão, sobretudo nas regiões Norte e Centro, que já provocaram três mortos, incluindo um bombeiro, e vários feridos, alguns com gravidade, além de casas de primeira e segunda habitação destruídas, bem como explorações agrícolas e pecuárias, e uma vasta área florestal.
Segundo dados oficiais provisórios, até 20 de agosto arderam mais de 222 mil hectares no país, ultrapassando a área ardida em todo o ano de 2024.