José Alberto “Pepe” Mujica, antigo presidente do Uruguai e uma das figuras políticas mais carismáticas da América Latina, morreu esta terça-feira, 13 de maio de 2025, aos 89 anos, vítima de um cancro no esófago. Conhecido mundialmente pela sua austeridade pessoal, discurso humanista e crítica feroz ao consumismo, Mujica liderou o Uruguai entre 2010 e 2015, ficando na memória coletiva como um exemplo raro de coerência entre palavra e ação.
Nascido em Montevideu, a 20 de maio de 1935, Mujica teve uma juventude marcada pela militância revolucionária. Integrado na guerrilha dos Tupamaros nos anos 70, sobreviveu a seis tiros e passou quase 15 anos nas prisões da ditadura militar. As condições extremas do cativeiro não quebraram o seu espírito: moldaram-no.
Com o regresso da democracia, lançou-se na política institucional. Foi eleito deputado em 1994, senador em 1999 e, aos 74 anos, venceu as eleições presidenciais. No poder, aprovou medidas progressistas que colocaram o Uruguai na vanguarda regional: legalizou o consumo de cannabis, autorizou a interrupção voluntária da gravidez e instituiu o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Apesar do cargo, recusou as mordomias do Estado. Não viveu no palácio presidencial, mas sim na sua modesta quinta em Rincón del Cerro, nos arredores da capital. Continuou a cultivar a terra com as próprias mãos e doava cerca de 90% do seu salário a organizações de solidariedade. Guardava apenas o equivalente a mil euros mensais. “Tenho de ficar bem com essa quantia, porque há muitos uruguaios que vivem com muito menos”, afirmou ao jornal El Mundo.
Num dos seus últimos testemunhos públicos, em novembro de 2024, disse ao El País: “Dediquei-me a mudar o mundo e não mudei nada, mas estive entretido e deu sentido à minha vida. Morrerei feliz.” Já antes, em entrevista ao New York Times, expressara o desejo de ser recordado como um “velho louco”.
Para Mujica, o consumismo era o verdadeiro cárcere moderno. “O Uruguai tem 3,5 milhões de habitantes. Importa 27 milhões de pares de sapatos. Para quê?”, questionava. Defendia menos trabalho, mais tempo livre e uma vida liberta da “lei da necessidade”. Considerava que, fora disso, “o mercado domina-nos e rouba-nos a vida”.
O atual presidente do Uruguai, Yamandú Orsi, prestou homenagem ao seu antecessor na rede social X. “É com profundo pesar que comunicamos o falecimento do nosso camarada Pepe Mujica. Presidente, militante, dirigente e líder. Vamos sentir muito a tua falta, meu velho. Obrigado por tudo o que nos deste e pelo teu profundo amor pelo teu povo.”
A morte de Mujica marca o fim de uma era. Deixa um legado de coerência, humildade e compromisso político raro. O mundo despede-se de um homem que, mesmo sem mudar o mundo, tocou milhões de consciências — e isso, talvez, seja mais revolucionário do que qualquer lei.