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Pactos de suicídio preocupam: Ocorrências recentes expõem vulnerabilidade

A vulnerabilidade psicológica dos jovens volta a merecer atenção após recentes ocorrências de ideação suicida em grupo, incluindo casos de pacto de morte, forçando a sociedade a confrontar a dramática realidade do suicídio adolescente. A situação expõe a urgência de activar protocolos eficazes e de reconhecer os sinais de risco nesta faixa etária.

O problema de saúde pública que é o suicídio entre adolescentes e jovens adultos – a principal causa de morte nesta faixa etária em Portugal, segundo algumas referências – ganhou particular destaque com relatos recentes.

No passado mês de Outubro, por exemplo, um caso na região de Viseu veio a público, no qual quatro estudantes de uma escola secundária manifestaram ideação suicida, dois dos quais com um pacto de morte. Foi evitado o pior pela intervenção de uma psicóloga e de um familiar, como revelou a Ordem dos Advogados (OA) num comunicado. Esta situação, somada a duas mortes consumadas no mesmo estabelecimento de ensino nos meses de Maio e Setembro, sublinha a gravidade e a necessidade de acção imediata, escolar e familiar.

Os pactos de suicídio, embora sejam eventos raros, representando menos de um por cento do total de suicídios, são de extrema preocupação quando envolvem jovens. São definidos como a decisão de duas ou mais pessoas, na esmagadora maioria das vezes duas, de morrerem em conjunto, ao mesmo tempo, e no mesmo local. Este fenómeno surge, muitas vezes, num contexto de forte ligação emocional e isolamento social, onde a dor de um é reforçada e validada pelo outro, conduzindo a uma “solução” compartilhada para problemas que parecem insuperáveis.

O Que Leva um Grupo de Jovens ao Pacto de Morte

A psicologia explica que a adolescência é uma fase de grande fragilidade emocional, onde a identidade e o sentido de pertença são cruciais. Os pactos de suicídio entre jovens resultam de uma combinação de factores: a desesperança perante o futuro, o sentimento de solidão intensa, a crença de serem um “fardo” para os outros e, fundamentalmente, a busca por uma solução para um sofrimento insuportável. Nestes grupos, onde existe uma dinâmica de codependência, a ideia de falecer em conjunto pode ser vista como um acto de lealdade ou uma forma de evitar a dor de ser abandonado pelo outro.

O sociólogo Émile Durkheim, em seu estudo seminal sobre o suicídio, identificou o fenómeno do «suicídio egoísta», que decorre da falta de integração social do indivíduo, e o «suicídio altruísta», onde o indivíduo está demasiado integrado num grupo e sacrifica-se por ele. Os pactos de suicídio podem conter elementos de ambos, com o grupo a isolar-se da sociedade ao mesmo tempo que a ligação interna se torna demasiado intensa.

Sinais de Alerta a Não Ignorar

Pais, professores e amigos devem estar atentos aos sinais de alerta. Estes não diferem muito dos sinais de risco de suicídio individual, mas no caso de um pacto, podem surgir de forma mais coordenada ou mútua entre os envolvidos. Os principais sinais incluem:

● Alterações Comportamentais Drásticas: Isolamento persistente, desinteresse por actividades de que antes gostava, descuido com a aparência e higiene pessoal (especialmente se for uma mudança abrupta).

● Expressões Verbais: Comentários recorrentes sobre o desejo de morrer, frases como «queria nunca ter nascido», ou sentir-se um «fardo» para a família. Ameaças de suicídio, directas ou indirectas, devem ser levadas a sério.

● Comportamento de Risco: Envolvimento em actividades perigosas ou imprudentes, aumento do consumo de álcool ou drogas.

● Despedidas e Organização: Doação de bens pessoais significativos, arranjo da vida pessoal ou escrita de notas de despedida, mesmo que em formato digital.

● Vínculos Partilhados: Uma intensa, e por vezes súbita, proximidade e exclusividade entre os membros do grupo, com mensagens secretas ou planos partilhados que excluem os demais.

A Longa História dos Pactos de Suicídio

O acto de tirar a própria vida em conjunto não é uma novidade na História. Os pactos de suicídio (ou as «mortes diádicas», no vocabulário técnico) têm raízes profundas, atravessando culturas e épocas, desde a Antiguidade até aos nossos dias, apresentando-se em contextos variados, desde a tragédia romântica à contestação política extrema.

Na Antiguidade Clássica, o suicídio era encarado de forma distinta, conforme a ética social. Exemplo famoso e mítico é o de Píramo e Tisbe, na Metamorfoses de Ovídio, onde dois amantes da Babilónia cometem suicídio um após o outro, por desentendimento trágico, acto que influenciou séculos de literatura romântica. Nos países orientais, como o Japão, os duplos suicídios («shinjuu») surgiram, frequentemente, no contexto de casais impedidos de consumar o seu amor devido à oposição familiar, um fenómeno recorrente nos séculos XVII e XVIII.

Na era moderna, o fenómeno ressurgiu com novos contornos, muitas vezes ligado a cultos religiosos ou movimentos extremistas. O caso mais emblemático do século XX é, sem dúvida, o suicídio colectivo de mais de novecentos membros do templo do Povo em Jonestown, Guiana, em 1978, liderados por Jim Jones, onde a ideologia e a coacção exerceram um papel fulcral na adesão ao pacto de morte. Mais recentemente, o acesso à internet facilitou a formação de pactos de suicídio por meio de fóruns e redes sociais, onde o anonimato e a distância física criam um espaço de validação mútua para a ideação suicida.

O fenómeno do pacto de suicídio, do ponto de vista psicológico, é um acto de renúncia, um grito de dor que se torna consensual num grupo restrito, onde a morte é vista como a única escapatória para o sofrimento partilhado.

O Papel Crucial da Intervenção

Para travar esta espiral de desespero, a acção preventiva e o apoio incondicional são as únicas vias eficazes. A responsabilidade é partilhada entre a família, a escola e a sociedade em geral.

O Que Fazer:

1. Promover a Comunicação Aberta: Criar um ambiente onde o jovem se sinta seguro para expressar sentimentos e dúvidas sem medo de ser julgado ou desvalorizado.

2. Estar Atento aos Sinais: Pais e professores devem aprender a reconhecer os sinais de alerta, especialmente o isolamento e as mudanças bruscas de humor ou comportamento.

3. Procurar Ajuda Profissional Imediata: Se for detectada ideação suicida, não se deve assumir que é uma «chamada de atenção». É fundamental procurar apoio psicológico e psiquiátrico com urgência. A Linha de Aconselhamento Psicológico do Serviço Nacional de Saúde (SNS 24) e outras linhas de crise estão disponíveis para orientação.

4. Limitar o Acesso a Meios Letais: Reduzir o acesso a medicamentos, armas de fogo ou outros meios que possam ser usados para o suicídio, sobretudo em casa.

A protecção e a esperança são os antídotos. É fundamental que os jovens em risco percebam que não estão sozinhos e que a dor, por maior que seja, não é permanente.

Linhas de Apoio e Ajuda Psicológica em Portugal:

● Emergência: Ligar 112

● Serviço de Aconselhamento Psicológico (SNS 24): 808 24 24 24 (disponível vinte e quatro horas por dia)

● Linha SOS Voz Amiga: 213 544 545 / 912 802 669 / 963 524 660 (diariamente das dezasseis horas às vinte e quatro horas)

● SOS Estudante: 239 484 020 / 969 554 545 / 915 246 060 (diariamente das vinte horas à uma hora)

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