Presidente da ASPROSOC denuncia escassez de recursos humanos na Força Aérea e critica decisão do Governo de investir em aeronaves obsoletas. Ministro da Defesa é alvo de pedidos de demissão

Pilotos da Força Aérea Portuguesa estão a recorrer a licenças sem vencimento para prestar serviço em empresas privadas de combate a incêndios. A denúncia é feita por João Paulo Saraiva, presidente da Associação de Proteção Civil (ASPROSOC), que alerta para a falta de efetivos disponíveis caso o Ministério da Defesa pretenda acionar os novos kits de combate a incêndios anunciados para aviões militares.
“Se surgirem neste exato momento os kits para combate a incêndios nos KC-390 e nos helicópteros, o senhor ministro sabe perfeitamente que não tem pilotos para colocar esses meios a operar”, afirmou Saraiva em entrevista à rádio Antena 1. Segundo ele, muitos dos pilotos formados, incluindo os treinados para helicópteros do Exército que nunca chegaram a operar, continuam a manter horas de voo e acabam por trabalhar no setor privado, onde a remuneração é substancialmente superior.
A situação é agravada pelo anúncio feito na última quarta-feira pelo ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, de que o Estado vai investir cerca de 16 milhões de euros na aquisição de dois kits de combate a incêndios florestais, destinados a equipar aeronaves C-130 da Força Aérea. A intenção do Governo é ter os aviões operacionais o mais rapidamente possível, ainda que não neste verão, devido ao tempo necessário para instalação dos sistemas e formação de equipas especializadas.
“Equipar aviões em fim de vida é um erro”
Contudo, a decisão governamental está longe de ser consensual. João Paulo Saraiva considera que o investimento é inadequado por se destinar a aeronaves que, segundo ele, “estão em vias de ficar inoperacionais”. “São duas aeronaves que já não reúnem condições para continuar em operação por muito mais tempo. Vão-se adquirir kits que o país já teve e que foram deixados a apodrecer”, criticou.
O presidente da ASPROSOC vai mais longe e pede a demissão do ministro Nuno Melo, acusando-o de má gestão dos recursos do Ministério da Defesa no que diz respeito ao combate aos incêndios florestais. “Sugerimos a demissão do ministro da Defesa. Claramente não está a saber conduzir o que precisa ser feito. No que respeita aos meios aéreos, é lamentável a posição do senhor ministro.”
Meios aéreos devem ser entregues à Força Aérea, diz ASPROCIVIL
A polémica não se limita à ASPROSOC. Também a Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Proteção Civil (ASPROCIVIL) defende mudanças estruturais no modelo de combate aéreo a incêndios. Jorge Silva, vice-presidente da associação, propõe que a totalidade dos meios aéreos passe a ser gerida diretamente pela Força Aérea, que considera mais preparada e estratégica para essa missão.
“Defendemos que os meios aéreos deviam passar de vez para a esfera da Força Aérea Nacional. Poderíamos desenvolver uma frota de canadairs para atuar no verão contra os incêndios, e no inverno, como hidroaviões, serviriam na missão de busca e salvamento no Atlântico Norte — uma área de responsabilidade portuguesa”, explicou.
Em plena época de fogos florestais, a falta de coordenação entre o Ministério da Defesa e as entidades de proteção civil, somada à fuga de profissionais para o setor privado, lança dúvidas sobre a capacidade de resposta do país aos incêndios de grandes proporções.