Luís Montenegro, primeiro-ministro de Portugal, anunciou esta quarta-feira uma reestruturação profunda na empresa familiar Spinumviva, transferindo a gestão integral para os seus filhos e alterando a sede da sociedade. A decisão surge após revelações de que a empresa recebia 4.500 euros mensais do grupo Solverde por serviços de ‘compliance’ e protecção de dados, levantando questões sobre conflitos de interesses
Em declarações transmitidas após uma reunião extraordinária do Conselho de Ministros, Montenegro afirmou que os esclarecimentos prestados sobre o caso «não foram — e nunca serão — suficientes». Questionou ainda se os seus filhos deveriam ser «inibidos de dar seguimento ao que criaram» devido à sua posição política, defendendo o direito deles a prosseguir o legado empresarial.
Pressão política e moção de censura
A medida ocorre num contexto de tensão política, marcado pela moção de censura do partido Chega, rejeitada no Parlamento na semana passada, mas que ampliou o escrutínio sobre os laços do líder governamental com a Spinumviva. Montenegro garantiu ter-se abstido de «participar em decisões relativas à empresa» sempre que identificou riscos de conflito de interesses, sublinhando que «nunca cedi a nenhum interesse particular face ao interesse público». O primeiro-ministro admitiu apresentar uma Moção de Confiança – poder exclusivo do Governo – para ser certificado por voto dos partidos e continuar como chefe do Executivo.
A Spinumviva, até agora sediada na residência familiar, terá de mudar de localização. A empresa, que atua em áreas sensíveis como protecção de dados, teve 30% do seu volume de negócios em 2023 associado a clientes como o grupo Solverde, segundo dados divulgados pelo primeiro-ministro. Montenegro insistiu que todas as transacções foram declaradas e estão «dentro dos parâmetros de mercado».
Reacções e implicações políticas
A oposição mantém críticas. O Chega exige «transparência total» na gestão de negócios familiares de titulares de cargos públicos, enquanto analistas políticos interpretam a reestruturação como uma tentativa de Montenegro «isolar a esfera privada da governativa», conforme referiu ao Expresso o comentador João Miguel Tavares.
O primeiro-ministro não descarta a convocação de uma moção de confiança, caso a polémica persista. «Não pratiquei nenhum crime, nem tive falha ética», afirmou, reiterando compromisso com a «legalidade e transparência».
Próximos passos
A saída da esposa de Montenegro da sociedade e a transferência de gestão para os filhos visam, segundo o governante, «preservar o direito à iniciativa económica» dos descendentes. A decisão será monitorizada de perto nos próximos dias, num Parlamento dividido e com a opinião pública atenta aos desdobramentos de um caso que coloca a ética política no centro do debate.