Em entrevista recente a um órgão de comunicação social local, Leopoldo Rodrigues afirmou, com a habitual confiança, que a marca Sabores de Perdição “está bem consolidada”. Mas ironia das ironias, quem tratou de a enterrar durante três anos do seu mandato foi ele próprio. Agora, às pressas e já com o relógio eleitoral a ditar os tempos, decide desenterrar o festival, numa tentativa de resgatar o brilho perdido e, claro, de alimentar a sua campanha. Mas, ao que parece, quem desenterra mal, acaba por exibir o esqueleto em vez de lhe devolver a vida.
É curioso como Rodrigues reconhece que o anterior executivo consolidou a marca. Não é todos os dias que se ouve um autarca admitir tacitamente que o trabalho anterior foi bem feito. O que ele esquece de mencionar é que, sob a sua gestão, esse mesmo trabalho foi meticulosamente deixado a apodrecer. Três anos de inércia, e quando finalmente decide ressuscitar o evento, fá-lo de forma apressada e atabalhoada, sem a elevação e o brilho que outros tempos e outras mãos lhe deram.
Se a marca estava bem consolidada, porque foi necessário deixá-la adormecida durante tanto tempo? O que se passou durante esses três anos que justificasse enterrar um festival que era uma referência da cidade? Faltou visão, faltou empenho, ou, simplesmente, faltou interesse? Seja qual for a resposta, o que é certo é que o regresso do Sabores de Perdição, tal como foi feito, mais pareceu um desenterrar forçado para servir a agenda política do que um verdadeiro renascimento para a cidade e os seus cidadãos.
Rodrigues poderia, de facto, ter dado ao festival a elevação que outrora teve, mas escolheu o caminho mais fácil: o de fazer algo, só para dizer que fez, sem o cuidado necessário para garantir o sucesso. A tenda monumental, o palco mal colocado, o espaço apertado e as multidões mal acomodadas revelam que o evento foi organizado à pressa, sem a devida atenção aos detalhes que fazem a diferença entre um festival memorável e um fiasco frustrante.
Desenterrar, caro Leopoldo, não é só levantar o que estava escondido. É revitalizar, reerguer, dar-lhe nova vida. E isso, claramente, não foi feito. O que tivemos foi um festival que, longe de se afirmar como um evento de excelência, se tornou mais um exemplo daquilo que é uma gestão à vista, onde o que importa é a aparência de fazer algo, mesmo que o resultado fique muito aquém daquilo que era esperado e merecido.
O Sabores de Perdição merecia mais. Merecia voltar com a força e o prestígio que lhe foi atribuído no passado, não como mais uma peça de propaganda eleitoral, mas como um verdadeiro evento cultural e gastronómico que faz jus à sua história. O que ficou, no entanto, foi uma sensação de desilusão, de que o festival foi desenterrado, sim, mas para ficar meio exposto, sem brilho e sem o respeito que o seu legado exigia.