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Criminalidade violenta cresce no distrito de Castelo Branco

A criminalidade grave e violenta tem vindo a aumentar no distrito de Castelo Branco ao longo das últimas duas décadas, contrariando a tendência nacional de estabilização dos índices criminais.

Segundo os Relatórios Anuais de Segurança Interna (RASI) e os dados oficiais da Polícia de Segurança Pública (PSP), da Guarda Nacional Republicana (GNR) e da Polícia Judiciária (PJ), registou-se, entre 2005 e 2025, uma subida gradual mas persistente de ocorrências violentas, nomeadamente agressões, roubos com violência e crimes praticados no contexto familiar. Embora os dados mais recentes da Câmara Municipal de Castelo Branco refiram uma descida global da criminalidade participada entre 2023 e 2024 – menos 10,2 por cento, com a redução de 1 850 para 1 661 crimes – este abrandamento não se reflecte na criminalidade violenta, que continua a aumentar em número e gravidade.

Entre os crimes com maior crescimento, destacam-se as agressões físicas, simples e qualificadas, que aumentaram significativamente na última década. Os roubos com recurso à violência ou intimidação, mesmo em zonas centrais e habitualmente mais policiadas, mantêm-se em níveis preocupantes. A criminalidade no espaço doméstico, especialmente a violência contra mulheres e crianças, embora menos numerosa em termos absolutos, tem vindo a ganhar peso no universo das queixas recebidas pela GNR e pela APAV. Os relatórios anuais da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima mostram um crescimento constante de denúncias no distrito, em particular nos concelhos de maior isolamento rural.

Apesar do aumento das denúncias, uma parte significativa dos casos não chega a julgamento. De acordo com dados compilados pelos serviços do Ministério da Justiça, cerca de 60 por cento das queixas relativas a crime violento são encaminhadas para os tribunais, mas apenas uma fração – estimada em menos de 30 por cento – resulta em condenações com trânsito em julgado. As restantes situações acabam arquivadas, prescritas ou resolvidas por outras vias, nomeadamente acordos extrajudiciais. Esta diferença entre participação e resolução judicial reflecte um sistema judicial sob pressão, onde a morosidade dos processos, a escassez de meios humanos e a relutância de muitas vítimas em manter o processo até ao fim dificultam a aplicação da justiça.

Do ponto de vista sociológico, o agravamento da criminalidade violenta em regiões do interior como Castelo Branco está fortemente ligado a fenómenos estruturais de desigualdade e fragilidade económica. O despovoamento rural, a escassez de oportunidades profissionais, o envelhecimento da população e o encerramento progressivo de serviços públicos têm contribuído para uma sensação generalizada de abandono e insegurança. Este contexto social de vulnerabilidade fomenta tensões e conflitos, potenciando comportamentos violentos, muitas vezes exacerbados por consumo de álcool e isolamento social. A este cenário soma-se o enfraquecimento das redes de solidariedade comunitária e familiar, que, em tempos, desempenhavam um papel importante na regulação social e prevenção de conflitos.

A violência doméstica, por exemplo, ganhou expressão à medida que se foram tornando mais visíveis e denunciados comportamentos antes tolerados ou silenciados em meios pequenos e conservadores.

O criminólogo António Cardoso, da Universidade de Coimbra, sublinha que «a desestruturação do tecido social agrário eleva as tensões e a propensão para actos violentos», lembrando que «a ausência de mecanismos eficazes de integração, nomeadamente para jovens sem ocupação ou rendimento, cria terreno fértil para a violência». Já Ana Sousa, jurista da APAV, considera que «o crescimento das denúncias de agressões no seio familiar não significa necessariamente um aumento do número de casos, mas sim uma maior capacidade das vítimas para os expor». Apesar deste sinal positivo, alerta que «a persistência de factores culturais e socioeconómicos dificulta uma resposta institucional eficaz, especialmente em comunidades mais fechadas».

Embora existam medidas de policiamento de proximidade e campanhas de sensibilização em curso, as autoridades admitem que só uma abordagem articulada entre forças de segurança, justiça, escolas, serviços sociais e associações locais poderá inverter o ciclo. O reforço do apoio psicológico, a formação de técnicos especializados e o investimento em políticas públicas que valorizem o interior do país surgem como linhas estratégicas possíveis. Para muitos, a segurança futura do distrito dependerá menos da vigilância do que da reconstrução do seu tecido social.

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