No passado dia 25 de maio celebrou-se o Dia Internacional da Criança
Desaparecida. Em Portugal, há pelo menos onze casos por resolver, mas só
Madeleine Beth McCann, nascida em Leicester a 12 de maio de 2003, sai nas
notícias: há poucos dias, 30 inspetores da PJ, acompanhados por autoridades
inglesas e alemãs, deram por finda nova “ronda” de buscas infrutíferas.
É estranho e até um pouco revoltante, não acham?
Foi a 3 de Maio de 2007 que Maddie, na altura com três anos, desapareceu
enquanto estava de férias com os pais e irmãos gémeos na Praia da Luz, no
Algarve. Dezoito anos depois, continuam as buscas! Tanto dinheiro já foi gasto,
tantos recursos utilizados na investigação, com policias e detetives, bombeiros e mergulhadores de vários países a voarem e a explorarem “valas e valedos”, limpa-se e analisa-se água de poços e esgotos, revistam-se casas e casinhas, algumas através de fotografias de satélite, usam-se georadares que permitem investigar o sub-solo, procuram-se vestígios e nada se encontra, tudo noticiado por dezenas de jornalistas de todo o mundo.
O principal suspeito continua a ser Christian Bruecker, mas nada de novo se
descobre que o incrimine, como realça Diogo do Amaral, ex-detetive que em 2008
escreveu um livro onde aponta os pais de Madeleine como causadores do desaparecimento, encobrindo a “não intencional” morte da filha no seu apartamento de férias.
Nos últimos anos, quantas crianças – para não falar em adultos – já desapareceram
em Portugal, crianças que já estão esquecidas e arquivadas, depois de
incomparável menos utilização de recursos na procura. Há conhecimento de pelo
menos dez, sem contar com Maddie.
No final do texto lembramos os nomes desses inexplicáveis eclipses de meninos e meninas, agora possíveis adultos. No entanto, foi criado um fundo financeiro destinado a angariar contribuições apenas para encontrar uma criança, o Fundo de Madeleine, tendo parte do dinheiro sido usado para os pais da menina pagarem prestações de seu empréstimo imobiliário…
Só as buscas das autoridades britânicas já custaram cerca de 15 milhões de euros!
Não há valores sobre os custos da investigação da polícia portuguesa e da alemã,
mas em 2012, Fernando Pinto Monteiro, ex-Procurador-Geral da República, já dizia
que as buscas por Maddie eram as mais caras de sempre em Portugal. Em
Inglaterra, uma criança é dada como desaparecida a cada três minutos e 195 mil
menores desaparecem todos os anos. No entanto, nenhuma recebe a mesma
atenção que Maddie. Afinal, o que torna este caso diferente?
As razões são reflexo do mundo em que vivemos, onde certas características justificam e impulsionam comportamentos: a menina é branca e bonitinha, os pais são ricos e influentes, conhecem altas figuras da política e economia inglesa. Dela sabemos tudo: cabelo loirinho, liso, curto pelos ombros, uma mancha castanha na íris do olho direito, verde (o esquerdo era azul e verde). E todos se lembram de ver a mãe, com semblante carregado, de mão dada ao marido, a usar sempre uma pulseira verde e outra amarela – as cores da esperança em Portugal e em Inglaterra, de onde Madeleine era natural. Tudo encaixava para chamar a atenção da comunicação social.
Na verdade, existem fortes relações dos McCann com o ex-primeiro-ministro
britânico Gordon Brown. Gerry McCann era conselheiro médico de um comité do
Governo britânico chamado COMARE, grupo de especialistas responsável por
pareceres sobre o impacto da radioatividade no ambiente e na saúde, com ligações
a uma empresa que explora centrais nucleares em Inglaterra e França.
E, acreditem, na área das Ciências Sociais há quem defenda existir um fenómeno
designado por “síndrome da mulher branca desaparecida”, um termo usado para se
referir à diferença nos gastos policiais e na cobertura mediática dada a casos de
desaparecimento de mulheres e meninas brancas, geralmente jovens, bonitas e de
classe alta, em comparação com pessoas de minorias étnicas ou de classes
económicas mais baixas. Um bom exemplo disto é a atenção que o caso de Gabby
Petito teve e continua a ter, dando origem, como a aconteceu ao caso Maddie, a
documentários transmitidos nas plataformas de streaming. A jovem influencer de 22
anos desapareceu enquanto fazia uma viagem com o namorado pelos parques
naturais dos Estados Unidos, tendo-se sabido depois que tinha sido assassinada
pelo parceiro.
O crime encheu primeiras páginas por todo o mundo, em contraste com a falta de
atenção dada à verdadeira epidemia de mulheres indígenas que desaparecem
todos os anos nos Estados Unidos. Só em 2016, foram denunciados 5712 casos de
mulheres e meninas nativas que desapareceram, mas só 116 casos foram
registados na base de dados de pessoas desaparecidas do Departamento de
Justiça.
Se os desaparecimentos de crianças já tendem a atrair mais atenção, o caso
Maddie tem outros ingredientes que o tornaram ainda mais mediático. A menina era
também uma turista de férias com a família de classe média alta no Algarve, um dos
destinos de eleição dos britânicos. O medo alimenta muitas vezes a cobertura que a
imprensa faz de um caso, e este desaparecimento gerou alarme entre os milhares
de britânicos que todos os anos passam férias no Algarve.
E, claro, surgem teorias da conspiração. Em 2016 a Polícia britânica abriu uma
investigação ao falecido ex-deputado Clement Freud, neto do famoso psicanalista,
que tinha sido acusado de pedofilia. Freud, que morreu em abril de 2009 poucos
dias antes de completar 85 anos, tinha uma casa de férias na Praia da Luz e,
semanas depois do desaparecimento da criança inglesa, entrou em contacto com
Gerry e Kate McCann, tornando-se amigo deles e acolhendo-os na sua casa em
pelo menos duas ocasiões…
A atenção dos media multiplica as justificações para as buscas continuarem…
desde que haja dinheiro!
Misteriosos desaparecimentos de meninos e meninas que não têm o que Maddie
tem. Como se sentirão pais e amigos destes seres humanos?
Mário Sousinha saiu de casa num fatídico dia de 2019 e não voltou: ninguém sabe
se foi morto ou se cometeu suicídio, se teve um acidente ou quis fugir.
Rosiney Oliveira, nasceu em 1987, desapareceu em 2018, logo depois de ser
despedida de um restaurante e nunca mais ter dado sinais de vida.
Tatiana Paula Mesquita Mendes (ou Odete Araújo Freman) nasceu em junho de
1998. Desapareceu em maio de 2005, tinha nacionalidade guineense.
Sofia Catarina Andrade de Oliveira nasceu em fevereiro de 2002, Sofia foi dada
como desaparecida dois anos depois.
Rui Manuel Pereira desapareceu de Famalicão em 1999, quando brincava no
Parque de Sinçães, junto ao bairro onde vivia.
Rui Pedro Teixeira Mendonça tinha onze anos quando foi visto pela última vez, a
andar de bicicleta, num terreno atrás do escritório onde a mãe trabalhava, em Lousada, na tarde de 4 de março de 1998.
João José Gomes Teles deixou de ser visto a 6 de outubro de 1998. Tinha 16 anos
e frequentava o 9.o ano. Desapareceu no Largo do Machiqueiro, em Câmara de
Lobos, Madeira, de onde é natural.
Cláudia Alexandra Silva Sousa nasceu em 1987, desapareceu em 1994, a caminho
da escola. Tinha sete anos. Chamavam-lhe “Carricinha”.
Jorge Manuel Sepúlveda, natural de Massarelos, no Porto. Tinha 14 anos quando
desapareceu, a 15 de agosto de 1991.
Hélder Alexandre Ferro Pagarim Cavaco é um dos mais antigos casos de jovens
desaparecidos em Portugal. Nasceu em julho de 1973, em Santiago do Cacém, no
distrito de Setúbal. Desapareceu em janeiro de 1990, com 16 anos, na zona da
praia de São Torpes, em Sines. Praticava surf.








