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Programa do Governo guina à direita e deixa pobres sem protecção especial

O Programa do XXV Governo Constitucional de Portugal, apresentado na Assembleia da República em Junho de 2025, contém diversas medidas que podem ser caracterizadas como mais à direita, pró-capitalistas e favoráveis aos empregadores e classes mais abastadas. Após análise detalhada do documento, identificam-se várias orientações políticas que privilegiam os interesses empresariais e do capital. O debate encerra-se esta quarta-feira no Parlamento, com viabilização prometida do Chega! e do PS

Reforma Fiscal Favorável às Empresas e Classes Altas

Uma das medidas mais emblemáticas é a redução transversal do IRC (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas), com diminuição gradual até 17 por cento (e 15 por cento para PMEs). O governo já confirmou a intenção de diminuir as taxas de IRC de forma gradual até aos 17 por cento até ao final da legislatura. Esta medida representa um dos maiores benefícios fiscais para as empresas, reduzindo significativamente a carga tributária sobre os lucros empresariais.

O programa prevê estimular a poupança, evoluindo para um sistema de tributação limitada da poupança e dos rendimentos reinvestidos. Esta medida beneficia particularmente as classes mais abastadas, que têm maior capacidade de poupança e investimento. O governo propõe envolver produtos financeiros específicos para trabalhadores, associados a planos de poupança de longo prazo.

Reforma Fiscal Abrangente

O programa inclui o aprofundamento da simplificação fiscal e reforma da justiça tributária[1], com reforço da simplificação e previsibilidade fiscal, limitando a discricionariedade da autoridade tributária[2]. A redução do IRS em 2.000 milhões de euros ao longo da legislatura, com foco na classe média, representa também um alívio fiscal que beneficia principalmente os rendimentos mais elevados.

A redução do IRS, no valor de dois mil milhões de euros, é apresentada como medida de apoio à classe média, mas especialistas alertam que os maiores benefícios recaem sobre os contribuintes com rendimentos mais altos. Para João Pedro Martins, fiscalista e investigador da Universidade do Minho, “as alterações propostas criam uma carga fiscal significativamente mais leve para quem já tinha mais capacidade contributiva”.

Flexibilização das Relações Laborais

O governo propõe uma revisão da legislação laboral para melhorar a adequação do regime legal aos desafios do trabalho na era digital, equilibrar a proteção dos trabalhadores com uma maior flexibilidade dos regimes laborais. Esta revisão visa aumentar a produtividade e competitividade das empresas, representando uma orientação claramente pró-empresarial.
Medidas como a possibilidade de troca de salário por mais dias de férias e a redução do horário laboral com correspondente corte salarial suscitaram críticas tanto da oposição como de especialistas em Direito do Trabalho. Para a jurista Ana Luísa Duarte, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, “estas propostas transferem o risco e os custos da flexibilidade quase exclusivamente para os trabalhadores”.

Alterações ao Direito de Greve

Uma das medidas mais controversas é a intenção de “equilibrar de forma mais adequada o exercício do direito à greve com a satisfação de necessidades sociais impreteríveis”[9][10]. Esta proposta visa limitar o impacto das greves, especialmente nos serviços públicos essenciais, o que beneficia diretamente os empregadores ao reduzir o poder de pressão dos trabalhadores.

Novas Modalidades de Trabalho

O programa introduz a possibilidade de os trabalhadores “comprarem” dias de férias, trocando parte do salário por mais tempo de descanso. Esta medida, juntamente com a redução do horário de trabalho com redução proporcional do salário, transfere custos para os trabalhadores em benefício da flexibilidade empresarial.

O programa prevê reforçar a capitalização das empresas e o ecossistema de capital de risco, através da criação de um fundo de fundos, sob gestão do Banco Português de Fomento. Esta medida visa promover a mobilização de investimento privado e a capacitação do sector empresarial.

Pagamentos Estatais Acelerados

O governo compromete-se a garantir que o Estado paga a 30 dias, desenvolvendo sistemas de incentivos e penalização aos serviços envolvidos. Esta medida beneficia directamente as empresas que prestam serviços ao Estado, melhorando o seu fluxo de caixa.

O programa propõe eliminar barreiras à entrada em todos os setores e no acesso a profissões[2], bem como rever o papel e poderes de intervenção das ordens profissionais. Estas medidas favorecem a liberalização económica e a redução da regulamentação profissional.

Guerra à Burocracia

O governo declara uma “guerra à burocracia” através da desburocratização e aceleração dos regimes de licenciamento, de autorização e da contratação pública. Esta simplificação administrativa beneficia principalmente as empresas ao reduzir custos de contexto e acelerar processos de investimento.

O programa introduz mecanismos de “sunset clauses” e deferimento tácito[1], garantindo que a ausência de clarificação relativa a processos de licenciamento extingue determinadas exigências. Esta medida transfere o ónus da prova para o Estado, favorecendo os requerentes empresariais.

Política Migratória Restritiva

O programa propõe uma política migratória regida por um princípio de moderação firme: mais regulação e controlo[1][16]. Esta orientação inclui a revisão da lei da nacionalidade, alargando o tempo mínimo de residência e presença efetiva em território nacional, medidas que podem beneficiar empregadores ao manter pressão sobre os salários através do controlo da oferta de mão-de-obra.

Críticas da Oposição

A deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, classificou o programa como potencialmente “uma das grandes conquistas da extrema-direita e da direita extrema”, criticando o facto de o governo pretender “baixar os impostos aos gigantes empresariais”. A Frente Comum dos sindicatos classificou o programa como “um dos piores de sempre em democracia para a administração pública”, acusando o governo de promover a “individualização das relações de trabalho”.

Programa do Governo guina à direita e deixa pobres sem protecção especial
Foto: Observador – Mariana Mortágu

Associações empresariais reagiram com entusiasmo às medidas. A Confederação Empresarial de Portugal saudou o “compromisso com a competitividade e a simplificação”, destacando a intenção do Estado de pagar a 30 dias e a criação de um fundo para a capitalização de empresas.

Em contrapartida, o Partido Socialista (PS) classificou o programa como “um ataque à justiça fiscal e à coesão social”. Segundo a líder parlamentar, Alexandra Leitão, “não se trata de uma reforma, mas de um desmantelamento das bases do Estado social, feito em nome de uma suposta eficiência económica”.

O Partido Comunista Português (PCP) alertou para o “regresso da lógica de liberalização selvagem”, enquanto o Livre e o PAN acusaram o governo de “sacrificar direitos em troca de promessas de investimento que não têm garantia”.

O Programa do XXV Governo Constitucional evidencia uma clara orientação neoliberal e pró-empresarial, com medidas significativas de redução da carga fiscal sobre as empresas e classes mais abastadas, flexibilização das relações laborais em benefício dos empregadores, e simplificação administrativa que favorece o investimento privado. Esta agenda representa uma mudança substancial na política fiscal e laboral portuguesa, priorizando a competitividade empresarial e a atracção de capital sobre a protecção dos direitos laborais e a redistribuição de riqueza.

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