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No Dia da Mulher, Portugal assinala 50 anos sobre o acesso das mulheres ao voto

Todos os anos, a 8 de março, celebra-se o Dia Internacional da Mulher. Mas, em Portugal, só há 50 anos, todas as mulheres conquistaram o direito de votar. Durante décadas, cada conquista vinha acompanhada de um mas. Contudo, a luta pela igualdade continua: as mulheres continuam a ser minoria nos espaços de decisão. Continuam a ganhar menos. Continuam a ser vítimas de violência e a ter a sua liberdade questionada. No nosso país a história do direito das mulheres ao voto começou na ousadia da médica Carolina Beatriz Ângelo, em 1911, registou avanços durante o Estado Novo como forma de controlo, mas só o 25 de Abril o consagrou em pleno.

A 8 de março celebra-se o Dia Internacional da Mulher para comemorar e honrar as realizações das mulheres, aumentar a sensibilização para as disparidades de género e a discriminação, bem como promover o apoio global às mulheres. A ideia de uma comemoração anual surgiu depois que o Partido Socialista da América organizou o Dia das Mulheres, em 20 de fevereiro de 1909, em Nova York — uma jornada de manifestação pela igualdade de direitos civis e em favor do voto feminino, porque a democracia só é plena quando inclui todas e todos.

Em Portugal, Carolina Beatriz Ângelo (1878-1911), médica, republicana e sufragista, foi a primeira mulher a votar, nas eleições realizadas para a Assembleia Nacional Constituinte, no dia 28 de maio de 1911. Carolina conseguiu votar por ter recorrido ao tribunal, cuja decisão foi a seu favor. Contudo, o voto feminino foi introduzido em Portugal apenas em 1931 e só após o 25 de Abril de 1974 se consagrou o sufrágio universal.

Este foi o primeiro marco de um longo caminho que o movimento sufragista e feminista fez em Portugal até ao pleno acesso das mulheres (e homens) ao voto, cujos 50 anos foram assinalados esta sexta-feira na Assembleia da República numa sessão solene evocativa proposta pelo Livre.

“Por causa dessa ousadia, como na altura se chamou, a lei eleitoral em 1913 foi alterada, passando a designar como cidadãos eleitores apenas os do sexo masculino, para evitar que as mulheres recorressem a esse argumento semântico-jurídico do conceito de cidadão para exercerem o seu direito de voto”, explicou à Lusa a investigadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade NOVA-FCSH, Fátima Mariano.

A alteração à lei “frustrou as aspirações” das feministas, que tinham acreditado nas promessas do Partido Republicano Português, mas acalmou os anseios dos políticos republicanos, preocupados que “as mulheres votassem nos partidos mais conservadores e os afastassem do poder” num período conturbado a nível político e económico.

Em 1931, a ditadura militar concede o voto muito restrito – condicionado por habilitações literárias ou lucros financeiros – a algumas mulheres “apenas para a eleição dos vogais das juntas de freguesia e das câmaras municipais, mas de facto há um voto já da mulher”.

Utilizando o mesmo argumento dos republicanos para não conceder o direito ao sufrágio, o novo regime considerou que “dando o voto às mulheres conservadoras” isso iria legitimá-lo.

Na obra “Às Urnas. A reivindicação do voto feminino na Península Ibérica (1821-1934)” (Imprensa de Ciências Sociais, 2022), Fátima Mariano realça que, ironicamente, “as promessas que os homens da I República nunca cumpriram, apesar da insistência das associações sufragistas, seriam satisfeitas por um regime de cariz católico e antiliberal”.

“Fadas” do lar

O Estado Novo, que “promoveu o retorno ao modelo tradicional de família, e impôs o regresso das mulheres ao lar e a glorificação do seu papel enquanto esposas, mães e donas de casa”, tinha, contudo, um objetivo em mente.

“A aprovação do sufrágio feminino e a eleição das primeiras deputadas não surgiram como resposta às pressões das sufragistas, mas como forma de travar o feminismo laico e maçónico, de reorientar as mulheres para os valores cristãos (dos quais se tinham afastado) e de as controlar, remetendo-as de novo para o espaço privado e ocupando-as com atividades de natureza caritativa”, é explicado na obra.

Neste contexto, foi em ditadura que foram eleitas as três primeiras mulheres deputadas (Domitila Hormizinda de Carvalho, Maria Cândida Parreira e Maria Guardiola) que tinham uma ação política restrita, não intervindo sobre “assuntos mais económicos ou financeiros”.

Em 1968, é aprovada pela primeira vez uma lei que equipara o sufrágio feminino e masculino, exigindo a homens e mulheres os mesmos requisitos para votar, ainda com limitações.

Vitória tardia e difícil

Contudo, foi a Revolução dos Cravos, em 25 de Abril de 1974, que consagrou este direito em pleno. A Constituição de 1976 estabelece que “têm direito de sufrágio todos os cidadãos maiores de dezoito anos”, sem distinções de sexo ou de outro tipo, algo que se mantém até hoje. No dia 15 de novembro de 1974, todas as mulheres em Portugal conquistaram o direito pleno de votar. Foi uma vitória tardia e difícil, conquistada passo a passo contra uma série de barreiras e “mas” impostos pela sociedade e pela lei.

Interrogada sobre o facto de Portugal nunca ter tido uma mulher como Presidente da República ou primeira-ministra eleita, Fátima Mariano salientou que as tarefas domésticas e o cuidar da família ainda recaem muito sobre as mulheres, diminuindo o seu tempo.

“É verdade que já passaram 50 anos e que as coisas deveriam ter mudado se calhar um pouco mais, mas é um caminho que nós temos que continuar a percorrer e a batalhar todos os dias”, afirmou.

Esta sexta-feira, numa clara demonstração da importância, cada vez maior, do papel da mulher na vida política nacional, o Expresso editou o mais recente relatório da Comissão Europeia sobre igualdade de género na União Europeia, divulgado esta sexta-feira, que revela que quase 85% dos portugueses concordam que ter mais mulheres na política leva a melhores decisões. Trata-se da percentagem mais alta entre os 21 países analisados.

No entanto, persistem “visões estereotipadas” na Europa, como a crença de que “as mulheres não têm ambição suficiente para alcançar cargos de topo”.

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