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O Império do Terror

Gostei dos discursos do 10 de junho, principalmente de Lídia Jorge, mesmo o de Marcelo não desiludiu, foram oportunos e claros ao levantarem questões atuais e pertinentes.

Desde já sublinho que havia outros aspetos a referenciar, designadamente nem uma palavra sobre os movimentos de libertação africanos, sobre a contribuição destes povos para o fim da dominação colonial portuguesa. É a narrativa do apaziguamento, da conciliação, que nos anuncia a bondade lusitana em levantar o véu de opressão dos nativos. Eram desnecessários estes laivos de Luso-tropicalismo…

Mas gostei que se lembrasse ser um escritor que representa o dia de Portugal, e não o asqueroso Dia da Raça, como acontecia até ao 25 de abril. Passou a ser Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, sublinhando que cultura e língua portuguesas estão espalhadas pelo mundo.

Gostei que se utilizasse a cultura para demonstrar que houve tempos em que potências colonialistas já tinham quem lembrasse os perigos de dividir o mundo em zonas de influência. Na verdade, Camões, Cervantes e Shakespeare, de modos diferentes, “expuseram os meandros da dominação, envolvidos com o tempo histórico dos impérios em que viveram”. 

Realçou-se ser inevitável que todos nós sejamos mestiços, – quando os povos se encontram há sempre misturas civilizacionais – o que significa que “ninguém tem sangue puro, a falácia da ascendência única não tem correspondência com a realidade.

Cada um de nós  é uma soma. Tem sangue do nativo e de migrante, do europeu e do africano, do branco e do negro e de todas as outras cores humanas”. Os Árabes, quando ocuparam a Península Ibérica chamavam-lhes “muladis”, de onde vem o termo mulato. A mistura vem de muito longe!

Sublinhou-se que todos nós “somos descendentes do escravo e do senhor que o escravizava, filhos do pirata e do que foi roubado. Mistura daquele que punia até à morte e do misericordioso que lhe limpava as feridas.” E eu acrescento:

Em todos os contactos entre os povos existiram abusos e pilhagens, sempre foi assim. Desses encontros, muitas vezes violentos, surgem injustiças, fosse no Egipto ou na China, impérios como o Asteca, o Romano ou o Inca, sem esquecer os vikings e os árabes, mesmo migrações no interior de África.

Quanto às reparações aos povos colonizados e escravizados, tem de existir seriedade em considerar o problema e deve haver políticas de compensação para pelo menos, e estou a falar do mínimo dos mínimos, criar condições para que os emigrantes em Portugal sejam bem recebidos e devidamente integrados.

Devia ter referido outro império, o do terror, agora corporizado em Israel! Um ato de invasão (Gaza, Cisjordania, Siria, Libano, agora o Irão) que não tem paralelo na destruição em impérios anteriores.

E só é apoiada pelo chamado ocidente alargado, com todos os outros países a condenarem, incluindo os países árabes que, mesmo quanto ao Irão que é Persa, criticam fortemente Israel, que está em roda livre, não liga a ninguém nem aos EUA, que ora condenam ora apoiam. Quanto aos países europeus, é infame a forma como “pedem por favor” a Israel para parar.

E por mais que se tentem nacionalismos e purismos, a verdade é que a sociedade global tende para a miscigenação. E estamos a entrar num mundo novo, onde a supremacia ocidental (primeiro europeia com Portugal, Espanha, Inglaterra e os seus impérios, depois dos EUA através do domínio económico e cultural do mundo) está a desaparecer.

Lídia Jorge avança: “no século XIX, o direito à proteção beneficiada pelo Estado começou a emergir.

Criaram-se documentos essenciais tendo em vista o respeito pelos cidadãos. Depois das duas guerras mundiais do século XX, foi redigida e aprovada a Carta dos Direitos Humanos e, durante algumas décadas, foi tentado implantá-los como código de referência um pouco por todo o mundo.

Só que ultimamente regride-se a cada dia que passa”. Camões define o ser humano como um ente  perseguido pelos elementos – “Onde pode acolher-se um fraco humano,/ onde terá segura a curta vida,/Que não se arme e se indigne o Céu sereno/Contra um bicho da Terra tão pequeno?” Lídia Jorge refere que ao ler Camões se comove com o seu destino, morreu pobre, com ele partilha da sua ideia de que um ser humano é um ser de resistência e de combate. É só preciso determinar a causa certa.

E essa causa está em que essa tal sociedade onde impera o lucro e a ambição pelo poder continua a existir, prevalece em todas as suas componentes.

Vencendo as desigualdades entre géneros, deixando de dividir o mundo entre bons e maus com base na cor da pele e, acima de tudo, acabando com a pobreza e a precariedade, o mundo ficará melhor.

Os extremistas de que Lídia Jorge falou não são apenas fascistas ou próximo, mas são o reflexo, através de uma resposta demagógica e gritada, da desilusão por cada vez se viver pior.

Eles sempre existiram, só que agora estão institucionalizados com partidos como o Chega ou grupelhos como 1143 de Mário Machado, ou marginais que se apresentam como neo-nazis.

Atacam a cultura (o actor da Barraca), usam a violência invocando o desporto (nazis do Sporting a queimarem carros e adeptos do Porto, são racistas e ignorantes (atacam voluntários que distribuem comida entre os sem abrigo).

Deviam ser considerados terroristas!
Nos anos 80 já existiam os skinheads…

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Joaquim Correia
Joaquim Correia
“É com prazer que passo a colaborar no jornal Regiões, até porque percebo que o conceito de “regiões” tem aqui um sentido abrangente e não meramente nacional, incluÍndo o resto do mundo. Será nessa perspectiva que tentarei contar algumas histórias.” Estudou em Portugal e Angola, onde também prestou Serviço Militar. Viveu 11 anos em Macau, ponto de partida para conhecer o Oriente. Licenciatura em Direito, tendo praticado advocacia Pós-Graduação em Ciências Documentais, tendo lecionado na Universidade de Macau. É autor de diversos trabalhos ligados à investigação, particularmente no campo musical

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