Quarta-feira,Junho 18, 2025
16.6 C
Castelo Branco

- Publicidade -

A imprensa regional anda a definhar há 50 anos

No seguimento dos artigos onde falei e continuarei a falar sobre o jornalismo
regional, temos que, sem sombra de dúvida, dedicar um capítulo para falar da
forma como os órgãos de comunicação social regionais se formam e gerem,
bem como também escamotear o que de facto está mal e devia ser corrigido,
no que concerne ao financiamento das empresas que gerem os títulos de
comunicação.

Primeiramente, temos de entender que os órgãos de comunicação regionais,
antes de o serem, em primeiro lugar são empresas, ou outra qualquer forma
jurídica fiscal, devidamente legal e autorizada. Depois de devidamente
constituído o veículo comercial e fiscal, inicia-se o processo de registo junto à
ERC, do novo órgão de comunicação pretendido. Após a aprovação, pode-se
iniciar o trabalho de comunicação, seja em que formato for, através de texto,
áudio, som, televisão, no online, impresso, ou em ambos.

O problema começa após 6 meses, em que e por via da dimensão da maior
parte dos órgãos de comunicação regionais existentes, (arrisco dizer talvez
mais de 80%), não existe capacidade financeira para criar uma estrutura
comercial que traga retorno para a empresa detentora do título em atividade
(salvo obviamente alguns títulos que o conseguem, felizmente).

A parca publicidade angariada depressa se esgota, e o jornalismo regional não sendo
apoiado estatalmente ou localmente, pelo trabalho que faz, sendo a primeira
linha de uma democracia sã (dizem os entendidos), na minha opinião cada vez
mais instável, não resta outra hipótese que é a de começarem a criar buraco
financeiro, fechando a atividade algum tempo depois, ou mesmo emagrecerem
o título para os serviços mínimos, ansiando que alguma coisa vá mudar no
futuro.

Isto, caros leitores e colegas, advém da má regulação do setor por parte do
estado, bem como de uma política de apoios financeiros, quase em exclusivo
para os órgãos nacionais, em detrimento dos regionais. Aplaude-se o trabalho
do jornalismo regional, no levantamento de questões fundamentais, na
divulgação do que de melhor se faz, semanalmente, nos concelhos, mas
depois não se criam mecanismos de apoio financeiros. Pede-se que façamos
gratuitamente este trabalho, sem pensarem que existem custos e nem sempre
a publicidade angariada cobre os custos de exploração (ordenados,
equipamento, rendas e gestão diária).

A publicidade nacional privada, raramente baixa aos regionais, fruto de e mais
uma vez, uma má regulação do setor. Eu percebo que não caiba ao governo
dizer às empresas que tem de gastar determinado valor no jornalismo regional,
pois sendo empresas privadas, não se pode, de modo algum, condicionar a liberdade de escolha dos veículos publicitários que usam para divulgar os seus produtos, mas o governo também pode recusar determinadas adjudicações, mediante determinados posicionamentos. Ou não? Conhecem o regulamento que obriga as rádios (públicas ou privadas) a passarem uma determinada percentagem de música portuguesa, em função da que não é? Neste caso, e a bem da música portuguesa, o governo impõe esta condição. Porque não e em defesa do jornalismo regional, também impor-se que as empresas que trabalhem para o estado (central ou local), e nos seus orçamentos de marketing, terem de cativar uma verba para apoiar a imprensa regional? É assim tão censurável? Penso que não e resolveria uma grande parte dos problemas neste setor.

A somar ao problema de uma prática já enraizada, de que raramente as marcas nacionais estão presentes nos órgãos regionais, pelo menos com alguma expressão, é o próprio governo que não dá o exemplo. O valor que cativa anualmente para adjudicar publicidade no setor regional da comunicação, raramente tem uma execução que ultrapassa metade do previsto, simplesmente porque os ministérios e as secretarias de estado estão-se nas tintas.

É mais confortável e rápido negociar com 4 ou 5 grupos que detém 80% dos órgãos nacionais, a terem de construir uma plataforma que vise trabalhar com o setor regional. O mais caricato é que a verba para o regional, em larga medida, nada tem a ver com as verbas para o nacional (falo apenas de publicidade, nada mais).

Ou seja, se determinado ministério não gastar a verba afeta ao setor regional, simplesmente essa verba não transita para outra rúbrica, dando-se, no final do exercício, como não executada, figurando nas contas do governo, na rúbrica da não execução orçamental, no final do ano. Interpelando-se estes senhores dos ministérios, sobre a razão destes procedimentos em relação ao setor regional, têm a devida lata de dizer que os jornais regionais é que não se aproximam e não enviam propostas.

Em 2022,2023, 2024 e 2025, tive o cuidado de contatar 8 ministérios e 4 secretarias de estado, bem como 23 institutos públicos (fiz isto todos os anos), que dependem do orçamento de estado, nomeadamente e no que concerne à rúbrica da publicidade. Em 4 anos de contatos, em mais de 150 e-mails e 65 chamadas feitas, o resultado foi ZERO. Nem uma adjudicação, nem um pedidode orçamento, e a taxa de ausência de respostas por parte dos destinatários, ronda os 95%.

Com isto não digo que não existam órgãos regionais que fazem adjudicações
ao estado, mas são muito poucos, contando-se pelos dedos. Nas adjudicações
ao poder regional (quase em exclusivo às câmaras), existe uma inversão de
180 graus. As câmaras continuam a ser ainda o maior cliente da imprensa
regional, embora, na minha opinião, terá de se regular o acesso a essas
adjudicações, no sentido de permitir uma maior clareza que possa tornar mais
independente a relação de certos órgãos com o poder local. Mas isto dá outro
artigo!

No governo anterior, iniciou-se um trabalho com o ex-secretário de estado
(agora Ministro) e mesmo com o Ministro da tutela da altura (agora candidato à
CM do Porto), e embora não seja ainda a solução perfeita, é um começo. Mas
como já referi em artigo anterior, receio que esse trabalho seja para meter na
gaveta, se o setor regional não se mexer, organizar-se e começar a fazer
algum barulho.

Tem de se perceber que ao governo em exercício (qualquer um), não interessa
reforçar os poderes dos jornalistas. Governos caem e são eleitos em Portugal e
no mundo, muito devido à ação de um verdadeiro jornalismo independente, que
denuncia o que mal está e consequentemente faz cair secretários de estados,
ministros e governos. Como os governos não podem tocar nos nacionais,
exercem uma espécie de vingança nos regionais. Vão dando umas migalhas
de vez em quando (e às vezes uns doces), mas o verdadeiro manjar dos
deuses é sempre para os mesmos.

Há que rapidamente alterar esta política. Nos últimos 20 anos fecharam mais
de metade dos títulos regionais e neste momento mais de 80% do que existe
ainda em atividade encontra-se com grandes dificuldades de solvência.
Há que fazer um trabalho urgente de sensibilização da opinião pública.

Somente com quem nos lê, vê e ouve, podemos ter força. Quem nos lê, vê e
ouve diariamente, são os que votam, são os que têm opinião na sociedade e
são aqueles que serão a nossa força futura. Há que os trazer para o problema,
explicar o que está mal e fazer dessas pessoas parte da solução.

Por outro lado, temos de unir o setor, identificar os pontos fracos, apresentar
propostas e traçar estratégias. Basta de falarmos para dentro e muitas vezes
entre os dentes, com a boca meio fechada.

No nosso setor, infelizmente, também temos indivíduos que não prestam, que
se vendem ao poder em troca de algumas benesses exclusivas, para que
paralisem o nosso setor e incrementem uma política de demagogia estruturada,
adiando dessa forma posicionamentos que há muito deveriam estar no terreno.
Esses indivíduos têm de ser também postos fora das estruturas associativas,
denunciados e se for caso disso processados judicialmente. O setor do
jornalismo regional tem de se purgar para renascer.

Somos muito pequenos separados, mas muito fortes juntos.

José Vieira
Jornalista e Presidente da Mesa da Assembleia Geral da APMEDIO
(Associação Portuguesa dos Media Digitais Online)

- Publicidade -

Não perca esta e outras novidades! Subscreva a nossa newsletter e receba as notícias mais importantes da semana, nacionais e internacionais, diretamente no seu email. Fique sempre informado!

Partilhe nas redes sociais:

Destaques

- Publicidade -

Artigos do autor

Não está autorizado a replicar o conteúdo deste site.