O Partido Socialista, esse grande defensor da democracia, da transparência e das instituições, acaba de colocar em marcha mais um dos seus atos de bravura política: a tão aguardada comissão parlamentar de inquérito à empresa de Luís Montenegro, o atual Primeiro-Ministro. Uma medida corajosa, sem dúvida, e totalmente desinteressada, como sempre, no nome da “verdade” e da salvaguarda do nosso “regime democrático”. A questão é que, ao olhar para este espetáculo, começa a ser difícil distinguir entre um ato de defesa da transparência e um circo montado para consumo mediático
Segundo Pedro Nuno Santos, a crise política atravessada pelo governo é de tal magnitude que o “regime” – essa construção indiscutível do PS – está à beira do colapso. E quem seria o responsável por tamanha catástrofe? Luís Montenegro, claro! O “principal fator de instabilidade” no país, segundo o líder socialista, por não ter esclarecido de forma adequada as dúvidas sobre a sua empresa familiar. Ou seja, o futuro da nação, o equilíbrio do país e o próprio regime democrático estão, segundo Nuno Santos, pendentes de uma clarificação empresarial. Algo verdadeiramente surreal.
E o PS, como guardião da verdade absoluta, decide então avançar com o grandioso requerimento na Assembleia da República. Um requerimento que não é um simples pedido de esclarecimentos, mas um verdadeiro ato de revelação transcendental: uma comissão de inquérito! Afinal, nada mais eficaz, no pensamento socialista, para assegurar a “transparência” do que uma reunião atrás da outra onde a única coisa que cresce é a lama política.
“É a última figura que temos ao dispor para sabermos a verdade”, diz Pedro Nuno Santos, com a expressão de quem acaba de descobrir a cura para todos os males do país. Mas, claro, esse ato heroico “não é tomado com gosto”. Proteger o regime, como todos sabem, é sempre um fardo pesado, muito mais difícil do que deixar o país cair num mar de incertezas. Afinal, quem é que não quer um regime tão estável e sólido que precise de comissões de inquérito para se sustentar?
Mas não se esqueçam: isso não é realmente o que o PS quer. Não! O partido preferiria, claro, que nada disto fosse necessário, mas a sua consciência de defensores do Estado de Direito é mais forte do que qualquer tentação. “O nosso dever é fazer tudo o que está ao nosso alcance para proteger o regime”, afirma Nuno Santos, com a nobreza de um cavaleiro templário. Então, mas… que regime é esse? Um regime que, com uma mão, o PS tenta salvar, e com a outra, tenta derrubar? Um regime que, em vez de dar respostas, se vê obrigado a submeter-se a inquéritos intermináveis e a processos de investigação sem fim à vista, para que, no final, ninguém saiba realmente o que se passou? A “transparência” que tanto defendem parece ser mais nebulosa do que o próprio caso que alegam querer esclarecer.
E, por falar em moção de censura, Pedro Nuno Santos até deixou isso no ar. Claro, não é algo que o PS deseje fazer porque, como todos sabem, isso pode ser perigoso. Assim, em vez de um simples voto de desconfiança, prefere-se uma comissão de inquérito que, segundo as palavras de Nuno Santos, servirá para garantir que a verdade seja apurada. Porque, se os portugueses souberem o que realmente aconteceu, quem sabe o PS poderá finalmente proteger o “regime democrático”. Uma jogada política que, como é de esperar, deixa tudo por esclarecer.
A ironia aqui é que, enquanto o PS insiste em se vender como salvador do regime, o que realmente faz é alimentar uma crise política que já arrasta por meses. O apelo à “verdade” parece mais um disfarce para esfregar as mãos no lamaçal da política do que um compromisso real com a transparência. Afinal, quem precisa de respostas concretas quando se pode brincar com comissões, acusações e discursos inflamados? A estratégia do PS é clara: ou se vence nas urnas, ou se vence na artilharia pesada dos inquéritos parlamentares.
Pedro Nuno Santos acredita que as comissões de inquérito são a chave para salvar o país da crise, mas ninguém se questiona se, afinal, o que falta ao país não são mais inquéritos, mas líderes capazes de dar respostas rápidas e concretas. Não seria mais simples, e talvez mais eficaz, que Luís Montenegro se sentasse à mesa e esclarecesse de uma vez por todas as alegações? Mas claro, em política, a verdade nunca é simples. É mais fácil alimentar o espetáculo, transformar a crise numa novela contínua e manter o circo em funcionamento.
E, para rematar, Pedro Nuno Santos revela com pompa e circunstância: “Antes de anunciar esta decisão, conversei com o Presidente da República.” A imagem está montada: ele, o herói da pátria, a salvar o regime democrático com o seu ímpeto reformador, e o Presidente da República, que, claro, deve abençoar qualquer movimento político relevante. Um contraste significativo com Luís Montenegro, que, segundo Nuno Santos, não teve o “bom senso” de informar Marcelo Rebelo de Sousa sobre o seu comunicado ao país. Uma jogada política, sem dúvida, mas que, como tantas outras, parece mais preocupada com a aparência do que com a resolução dos problemas.
Por muito que o PS se esforce em vestir a capa de salvadores do regime, a verdade é que, neste circo político, todos são ilusionistas.